Bloco dos Brics manifestou recentemente abertura à adesão de novos membros.| Foto: Kirill Makes Pics/Pixabay
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O bloco conhecido hoje como Brics surgiu mais como uma jogada de marketing de um grande banco global que como uma entidade a unir nações com interesses comuns. O acrônimo designava Brasil, Rússia, Índia e China – o “s”, quando usado antes de 2010, servia apenas como um plural; depois, passou a indicar a presença da África do Sul. Tratava-se, no início, de agrupar nações emergentes com potencial para serem muito relevantes na economia mundial em algumas décadas, como sugestão para investimentos. Os mandatários desses países, no entanto, gostaram da ideia e passaram a se reunir até chegar ao ponto de uma formalização, com sede própria e reuniões de cúpula – a próxima está marcada para o fim deste mês, em Johannesburgo. É quando os cinco membros decidirão se querem continuar a ser apenas Brics ou se acrescentarão mais algum punhado de letras ao nome do bloco.

Interessados em aderir aos Brics não faltam: algumas dezenas de países querem entrar no grupo, incluindo Argentina, Arábia Saudita, Argélia, Belarus, Cuba, Emirados Árabes Unidos, Egito, Irã, México e Venezuela. Alguns deles até fariam jus a uma adesão pelo critério inicial do economista Jim O’Neill, o “pai” do acrônimo, pois são nações grandes, com economias emergentes; no entanto, o que a maioria desses países tem em comum é o fato de não serem plenamente democráticos – alguns deles são escancaradamente autoritários, como a Venezuela, a Belarus ou a Arábia Saudita. E, em praticamente todos os casos, há algum nível de antiamericanismo, explícito ou implícito, por meio do alinhamento automático com algum dos membros do bloco, especialmente a Rússia ou a China – não por coincidência, os dois maiores beneficiários de uma expansão.

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Hoje, os Brics são mais uma entidade guiada pelo fortalecimento de laços econômicos que um grupo com atuação geopolítica definida. Mas uma expansão transformaria o bloco em um clube de autocracias comandado por Pequim

Para Moscou, mais membros nos Brics seriam uma forma de demonstrar prestígio diante da comunidade internacional – ou ao menos aquela parte da comunidade internacional comprometida com a democracia, os direitos humanos e a paz global – neste momento em que a Rússia é alvo de isolamento e sanções motivadas por sua agressão à Ucrânia. Mas o grande vencedor de uma expansão dos Brics seria mesmo a China, que já vem desenvolvendo uma campanha agressiva de cooptação de aliados, especialmente no Sudeste Asiático, na África e na América Central, despejando dinheiro em investimentos para criar uma órbita de influência que rivalize com a dos Estados Unidos.

Hoje, os Brics são mais uma entidade guiada pelo fortalecimento de laços econômicos que um grupo com atuação geopolítica definida – a Índia, por exemplo, tem tido uma postura diversa dos colegas de bloco em relação à Ucrânia: o premiê Narendra Modi foi um dos primeiros a se encontrar com Volodymyr Zelensky durante a cúpula do G7 no Japão, meses atrás, enquanto Lula evitava o ucraniano; e os indianos criticaram a recente decisão russa de suspender o acordo para exportação de grãos pelo Mar Negro. Mas uma expansão dos Brics transformaria o bloco em um clube de autocracias comandado por Pequim e no qual Brasília teria menos relevância – o que explica a resistência do Itamaraty.

Isso em nada interessa ao Brasil, mas mesmo assim Lula se mostra favorável à expansão, ao menos no caso dos camaradas ideológicos latino-americanos como Argentina e Venezuela. Este processo, no entanto, tem tudo para fazer dos Brics uma espécie de “anti-OCDE”: enquanto esta última entidade – que o Brasil de Lula esnoba – privilegia a promoção da liberdade econômica, da democracia plena, do combate à corrupção e de boas práticas de gestão, “puxando para cima” seus membros e os que desejam se juntar a eles, os Brics reunirão a antítese disso tudo, desmoralizando o grupo e reduzindo sua influência global como interlocutor digno de ser levado a sério. O Brasil já tem seu prestígio abalado pela adesão a Vladimir Putin, escolha que também está respingando no protagonismo brasileiro na área ambiental; aceitar ser coadjuvante em um grande clube de satélites da China só ajudará a reduzir o tamanho do Brasil na esfera internacional.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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