Com a opção pelos feriados, o Brasil corre o risco de passar uma mensagem equivocada de que valoriza pouco o trabalho e a produção
A Lei Geral da Copa, sancionada em junho do ano passado pela presidente Dilma, deixou aberta a possibilidade de a União declarar feriados nacionais nos dias em que houver jogos da seleção brasileira durante a Copa do Mundo de 2014. Também tornou possível que estados e municípios estabeleçam feriados nos dias de partidas nas cidades-sede. Em Curitiba, a Comissão Especial para Assuntos Relacionados à Copa do Mundo de 2014 e Olimpíadas de 2016 da Câmara de Vereadores (Ceaco) criou até uma enquete eletrônica para consultar a população sobre a proposta. Dos 6.439 internautas que responderam à consulta, 87% concordaram com a medida.
O argumento principal para justificar as folgas é garantir a mobilidade urbana nas cidades-sede. Conforme mostrou a reportagem da Gazeta do Povo no último domingo, segundo o Comitê Gestor da Copa, o número de veículos nas ruas da capital diminui em média 37% nos dias de feriado, o que tornaria mais fácil minimizar os problemas crônicos do trânsito curitibano durante o evento.
Interessante notar que várias obras reunidas sob sugestivo nome de "PAC da Copa" deveriam preparar não só Curitiba, mas todas as demais cidades-sede para receber o Mundial, melhorando inclusive as condições de mobilidade, o que tornaria desnecessário adotar medidas para diminuir o fluxo de veículos nos dias de jogos. Esse, aliás, seria o tal "legado da Copa", discurso sempre presente nas justificativas para que o país investisse tanto para receber o evento. O problema é que das 18 obras previstas para a capital paranaense todas estão atrasadas, segundo dados de um relatório técnico divulgado no mês passado pelo Tribunal de Contas do Paraná (TC-PR). E se o ritmo atual dos trabalhos continuar, parte das obras só será concluída depois do Mundial.
Do ponto de vista econômico, os feriados, como já discutimos neste mesmo espaço, sempre têm um alto custo. Estimativa da Associação Comercial do Paraná (ACP) revela um prejuízo médio para o comércio local de R$ 160 milhões em cada dia de feriado na capital. Como seriam pelo menos quatro dias úteis de folga o número pode aumentar porque o governo federal poderá decretar feriados nacionais nos dias de jogos da seleção brasileira , as perdas seriam de no mínimo R$ 640 milhões. Além disso, muitos empresários investiram na capacitação de empregados e na compra de equipamentos e insumos contando com um movimento intenso. Se as folgas forem decretadas, boa parte desse investimento será perdida.
Sabe-se que a Copa é um evento popular e que atrai a simpatia de milhares de brasileiros que certamente têm todo direito de usufruir momentos de alegria e desconcentração que o Mundial pode proporcionar, mas não parece razoável paralisar toda a cidade devido a um evento que não ocupará mais de duas horas a cada dia de jogo e que será acompanhado por no máximo 41 mil torcedores nos estádios.
Com a opção pelos feriados, o Brasil corre o risco de reforçar a ideia que se faz no exterior, de um país pouco afeito ao trabalho e à produção. Mesmo que o país seja reconhecido por seu caráter alegre, imagem que pode e deve ser cultivada, certamente não queremos que essa alegria seja associada ao descompromisso com o trabalho. Para citar apenas exemplos recentes, lembremos que nem a Alemanha, em 2006, nem a África do Sul, em 2010, decretaram feriados como se cogita fazer por aqui. Em vez disso, os dois países, um mais próspero e outro em desenvolvimento, aproveitaram a oportunidade singular para mostrar aos visitantes estrangeiros que valorizam o esporte sem depreciar todas as demais atividades de suas sociedades. A lição vale para o Brasil. Podemos desconstruir estereótipos provando que somos uma nação capaz de sediar um evento do porte da Copa do Mundo sem paralisar nossas cidades.
Em vez da adoção de paliativos, sociedade e poder público poderiam aproveitar a ocasião para encontrar alternativas que garantam a mobilidade dos turistas e da população. Que os turistas deixam o Brasil com a certeza de que estiveram num país alegre, mas também comprometido com o trabalho.