Nesta terça-feira, a Finlândia se tornou membro de pleno direito da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), a aliança militar ocidental cuja expansão foi invocada pelo autocrata russo, Vladimir Putin, como razão para invadir a Ucrânia, em fevereiro do ano passado. A adesão dos finlandeses é importante por muitos motivos, e o mais óbvio deles é o acréscimo de 1,3 mil quilômetros de fronteira entre a Otan e a Rússia, mais que dobrando a extensão atual, pois Noruega, Polônia e os países bálticos correspondiam a 1,2 mil km – a Suécia, que também negocia a entrada na aliança, não faz fronteira com a Rússia.
Especialmente emblemático é o fato de a Finlândia abandonar uma postura de neutralidade que já vinha de muitas décadas e que tinha apoio maciço da população. A invasão da Ucrânia, no entanto, mudou este panorama. A decisão de pedir a entrada na Otan não reflete divergência entre o governo e o povo: hoje, três em cada quatro finlandeses são favoráveis à adesão à aliança militar. E tamanha mudança de mentalidade em tão pouco tempo só ocorreu porque a Rússia se mostrou um vizinho nada confiável. A Finlândia pode não ter os mesmos laços históricos e étnicos que levam Putin a considerar a Ucrânia uma espécie de “província rebelde” da “grande Rússia”, sobre a qual ele teria algum tipo de direito, e por esse ângulo os finlandeses teoricamente deveriam ter menos motivos para preocupação. No entanto, o expansionismo imperialista russo inegavelmente força os demais vizinhos à reação mais natural possível: buscar apoio para evitar ter o mesmo destino dos ucranianos. Com a Otan, este apoio está garantido; por mais que Moscou agora prometa retaliações, ela dificilmente virá na forma de um ataque, pois isso levaria toda a máquina militar ocidental a entrar ativamente em um conflito para defender a Finlândia.
O aceno brasileiro à autocracia russa e às ditaduras aliadas em nada habilita o Brasil a se colocar como negociador de uma possível paz – pelo contrário, apenas reduz o soft power brasileiro
Enquanto a Finlândia abandona sua neutralidade para se distanciar do agressor russo, a diplomacia brasileira parece rumar para o caminho diametralmente oposto. O ex-chanceler Celso Amorim já foi enviado por Lula em missão “secreta” à Rússia (como já havia feito com a Venezuela), e petistas de alto coturno também estiveram recentemente em Moscou para um evento do Rússia Unida, partido de Putin, que tinha como mote as críticas a um suposto “neocolonialismo” norte-americano e europeu. O secretário-geral do PT, o ex-deputado Henrique Fontana, negou envolvimento do governo, afirmando que se tratava apenas de iniciativa do próprio PT. “Estávamos representando o partido, não o governo. Naquilo que nos cabe, colocamos a disposição do presidente Lula de contribuir com a criação de um clube de países que facilitem um ambiente de diálogo para um acordo de paz [com a Ucrânia]. Todos se mostraram bastante abertos a isso”, disse ele à Folha de S.Paulo.
O fato é que o governo Lula tem evitado chamar a agressão russa pelo que ela é, e inclusive já se omitiu em fóruns internacionais como a Cúpula pela Democracia. Mesmo quando votou pela aprovação de uma resolução da ONU que pedia a retirada das tropas russas da Ucrânia, o Brasil se absteve na hora de analisar duas emendas propostas pela Belarus que amenizariam a linguagem usada no texto, tentando o impossível: agradar os dois lados em um conflito no qual os papéis de agressor e vítima estão claramente delineados. Este aceno brasileiro à autocracia russa e às ditaduras aliadas (como a chinesa e a iraniana) em nada habilita o Brasil a se colocar como negociador de uma possível paz – pelo contrário, apenas reduz o soft power brasileiro ao mostrar que o país não tem um alinhamento incondicional com a democracia, o respeito à soberania das nações e à autodeterminação dos povos.
Lula, que antes de ser eleito presidente já culpou a Ucrânia pela guerra e afirmou ser capaz de resolver o conflito em uma mesa de bar, “tomando cerveja, se não na primeira, na segunda, se não na terceira, se não desse na terceira ia até acabar as garrafas para um acordo de paz”, se julga digno de um Nobel da Paz, mas está mais perto de terminar de jogar no lixo o legado do Barão do Rio Branco e de Oswaldo Aranha que de fazer do Brasil um país respeitado globalmente no âmbito das relações internacionais. Se na primeira passagem do petismo pelo poder a “diplomacia ativa e altiva” já havia colocado o Brasil ao lado do que há de pior em termos de ditaduras mundo afora, neste momento o país perde uma chance clara de se colocar ao lado das democracias ocidentais contra o agressivo imperialismo russo, apostando em uma dubiedade que mina qualquer pretensão de autoridade moral que o Brasil possa ter.
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