Depois de nomear o próprio advogado para uma cadeira de ministro do Supremo Tribunal Federal, o presidente Lula consolidou seu aproveitamento zero em termos de indicações respeitáveis para os postos mais importantes do Judiciário brasileiro. Nesta segunda-feira, Lula formalizou a indicação de seu ministro da Justiça, Flávio Dino, para a vaga deixada por Rosa Weber – a não ser em caso de falecimento ou antecipação de aposentadoria, será a segunda e última escolha deste mandato, já que o próximo ministro a deixar a corte, Luiz Fux, só completa 75 anos em 2028. A opção por Cristiano Zanin era absurda por violar frontalmente o princípio da impessoalidade e representar a prevalência dos critérios pessoais, pois tratava-se de uma “recompensa” a quem havia trabalhado para tirar Lula da prisão e fazer dele um ficha-limpa; já o insulto à sociedade representado pela indicação de Dino é de outra natureza: Zanin era e ainda é uma incógnita a respeito de uma série de temas relevantes para a sociedade brasileira, mas todos sabemos muito bem o que Dino pensa e como age.
O Brasil inteiro sabe, por exemplo, do pendor liberticida de Dino. No momento em que uma das maiores urgências nacionais é o restabelecimento da liberdade de expressão em seu sentido autêntico, é certo que, se instalado no Supremo, Dino não contribuiria um milímetro para essa restauração. Pelo contrário: em várias ocasiões ele já se manifestou favorável a restrições ao discurso livre, especialmente nas mídias sociais. Durante a tramitação – por ora interrompida – do PL das fake news no Congresso, o Ministério da Justiça foi um dos agentes da truculência, colaborando com o próprio STF na intimidação das big techs, que tinham todo o direito de se manifestar a respeito de um projeto que as afetaria diretamente. Sua postura em relação aos manifestantes do 8 de janeiro, agora em julgamento no Supremo, também não indica que ele seria um elemento capaz de se contrapor aos desmandos do relator Alexandre de Moraes.
No momento em que uma das maiores urgências nacionais é o restabelecimento da liberdade de expressão em seu sentido autêntico, é certo que, se instalado no Supremo, Dino não contribuiria um milímetro para essa restauração
Além disso, Dino já demonstrou seu desprezo pelo Congresso Nacional, por exemplo, ao faltar a sucessivas convocações da Comissão de Segurança Pública e, especialmente, ao desdenhar da CPI do 8 de Janeiro com a história, muito mal explicada, do sumiço das imagens de centenas de câmeras do Palácio da Justiça, um dos ministérios mais próximos à Praça dos Três Poderes. Mesmo diante de escândalos que, de inicío, não lhe diziam respeito diretamente, como o da “dama do tráfico”, recebida por dois de seus secretários, Dino acabou comprando a briga: não apenas manteve no cargo os responsáveis por receber a esposa e braço-direito de um dos maiores traficantes da região amazônica, como ainda se juntou à campanha de difamação do jornal O Estado de S.Paulo e dos profissionais que apuraram e publicaram uma história que foi resultado de investigação rigorosa.
Diante de tudo isso, impõe-se a pergunta: o Senado, responsável por dar seu aval às indicações presidenciais para o Supremo, terá a coragem de fazer o que é certo? E por “certo” não falamos de simplesmente criar dificuldades para vender facilidades, como parece ser a prática de Davi Alcolumbre, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) que, no passado, já impôs uma demora injustificável para a sabatina de André Mendonça, indicado pelo então presidente Jair Bolsonaro. Falamos, isso sim, de uma inédita rejeição em plenário. Haveria 41 senadores dispostos a impedir que o Supremo passasse a contar com Flávio Dino entre seus integrantes?
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O retrospecto, infelizmente, não é nada bom. Após uma indignação inicial com a nomeação de Zanin, senadores da oposição chegaram a fazer elogios ao advogado de Lula nas mídias sociais. No fim, quase três quartos da casa – 58 senadores – endossaram a escolha do petista, contra apenas 18 que tiveram a coragem de se opor. O Senado tem, agora, uma nova chance para não ser cúmplice da degradação institucional que o petismo sempre realiza quando está no poder; que não a desperdice como já desperdiçou em outras ocasiões.