Greves do funcionalismo são sempre prejudiciais por sonegarem ao cidadão a prestação de serviços públicos que só o Estado pode oferecer. Mas a greve dos servidores técnico-administrativos do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR) causa transtornos ainda piores: pacientes internados na UTI da instituição passaram a sofrer risco de morte com o atendimento precário, cirurgias urgentes foram desmarcadas e as filas para agendamento de novas consultas, já costumeiramente longas, se estendiam porta afora.
A situação chegou a tal ponto que a direção do HC teve de apelar para o Ministério Público Federal, na busca de ordem judicial que impedisse a paralisação de setores críticos. Ocorre que se toda função pública é de natureza essencial, a operação de um hospital complexo requer equipes completas de servidores para cada área, sob pena de entrar em colapso.
Um levantamento parcial indica que mais de 50 funcionários de áreas críticas, como UTIs, centros cirúrgicos e serviços de emergência estão de braços cruzados no maior hospital público do Paraná. Os servidores protestam contra a decisão do governo federal que converte o hospital universitário em uma fundação estatal, classificando a medida como um artifício para que vagas destinadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) sejam privatizadas. Ainda que a preocupação seja nobre, outros setores da atividade universitária podem suportar paralisações; mas não os serviços essenciais. Nestes uma greve inesperada como a atual é sinal claro de descaso e desrespeito com os cidadãos mais desvalidos, que os grevistas dizem defender.
A propósito, mais de 18 anos após promulgada a Constituição de 1988 o governo sinaliza com a regulamentação do direito de greve do funcionalismo. A iniciativa responde à pressão da realidade e, principalmente, do Supremo Tribunal Federal que declarou ilegais quaisquer paralisações de servidores enquanto o Congresso não regular o dispositivo constitucional. O texto sob exame do Palácio do Planalto inclui corte de ponto para greves ilegais e contratação temporária de pessoal para socorrer atividades que ficam desguarnecidas na hipótese de paredes funcionais.
A exemplo do que já ocorre no setor privado, o projeto prevê a realização de assembléias prévias, com quórum regulado, para que uma categoria funcional convoque greves. Isso afastará a ditadura de minorias agressivas que costumam impor greves intempestivas; além de tornar as greves o recurso final em uma negociação. Embora as lideranças se rebelem, o corte do ponto é matéria inquestionável para o governo, com o próprio presidente Lula ressaltando, em sua última entrevista coletiva, que "greve com pagamento de salário é férias".
A regulamentação desse processo é fundamental, porque a sociedade está cansada de assistir a um grevismo ruinoso por parte de servidores que se sentem a salvo de quaisquer sanções. Entre os trabalhadores privados a situação é diferente, ante os riscos que correm quando optam por paralisações sobretudo o da demissão. Mas há esperança de que um presidente de origem sindical possa reunir os elementos de decisão necessários para disciplinar o grevismo descontrolado na área pública.