O Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná vive uma nova crise: no meio de junho, vence o prazo dado pela Justiça do Trabalho para que o HC demita 916 funcionários que haviam sido contratados por meio da Fundação da Universidade Federal do Paraná (Funpar) e os substitua por servidores concursados. O maior hospital público do estado, responsável por metade dos atendimentos feitos pelo SUS no Paraná, já sofre com um déficit de funcionários que levou o HC a ter de fechar alguns de seus leitos no segundo semestre do ano passado. Agora, o reitor Zaki Akel dialoga com a Justiça e o Ministério Público do Trabalho (MPT) para evitar o cumprimento de uma medida que inviabilizaria totalmente o funcionamento do hospital, para prejuízo de toda a comunidade paranaense e dos pacientes de outros estados que recorrem ao HC.
O HC só conseguiu evitar as demissões até agora graças à boa vontade de todas as partes envolvidas. As contratações pela Funpar foram suspensas em 1996 ou seja, todos os 916 servidores são funcionários antigos do hospital e, dez anos depois, o HC assinou um Termo de Ajustamento de Conduta com o MPT, comprometendo-se a regularizar a situação até 31 de dezembro de 2010. O prazo passou e as demissões não ocorreram nem os concursos. Os dois últimos, em 2011 e 2013, ofereceram só 31 vagas, apenas para repor cargos livres por aposentadorias e exoneração. Se o HC e o MPT estavam até então se entendendo quanto à necessidade de adiar as demissões, a decisão judicial introduz um ruído no diálogo que vinha ocorrendo até o momento.
Não se trata, obviamente, de defender o desrespeito à lei. O Termo de Ajustamento de Conduta existe para ser cumprido. No entanto, o que falta, na situação atual, é a razoabilidade. Faria sentido intimar o HC a realizar as demissões e os concursos o quanto antes se a reposição de funcionários estivesse única e exclusivamente sob a responsabilidade do hospital, ou da UFPR. Mas não é o que ocorre, especialmente nos últimos tempos e é essa a situação que a recente decisão da Justiça do Trabalho parece ignorar. Se antes já era necessário ter o carimbo do Ministério da Educação, em Brasília, para realizar concursos, agora o governo federal vem apertando o cerco sobre os hospitais universitários para que entreguem sua autonomia, por meio da adesão à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh).
Em uma decisão corajosa, o Conselho Universitário da UFPR rejeitou, em agosto de 2012, a adesão à Ebserh alegando que a autonomia universitária, no caso do HC, seria mortalmente ferida. Um exemplo é a nomeação do alto escalão do hospital: pelas regras da Ebserh, só o superintendente seria escolhido pelo reitor. Os gerentes precisariam da aprovação da diretoria-executiva da Ebserh, e poderiam inclusive vir de fora do corpo da universidade apenas um dos gerentes teria de ser do quadro da instituição. Em entrevista à Gazeta do Povo, o presidente da Ebserh alegou que o simples fato de uma universidade optar por não aderir à empresa indica o respeito à autonomia. Mas a prática é bem diferente do discurso, pois o governo federal já deixou claro que novas contratações só serão feitas por intermédio da Ebserh. De pouco serve exaltar a autonomia quando, nos bastidores, a União torce o braço das universidades.
Quando comentamos o fechamento de leitos do HC no ano passado, lembramos que são os administradores de cada hospital que conhecem melhor a realidade de suas instituições, e não um burocrata em Brasília; por isso centralizar lá todas as decisões sobre contratações de servidores seria um contrassenso. O reitor Zaki Akel está dialogando com o governo federal em busca de um contrato no qual a fúria centralizadora da Ebserh seja mitigada, respeitando verdadeiramente a autonomia universitária; ao mesmo tempo, o HC busca uma alternativa com a Justiça do Trabalho e o MPT para impedir que subitamente o hospital perca um terço de seus funcionários. Que todos os envolvidos não se esqueçam de que as vítimas da intransigência são os paranaenses que precisam do atendimento que o HC referência nacional e internacional em diversas áreas, como a de transplantes sempre soube oferecer com qualidade.
Dê sua opinião
Você concorda com o editorial? Deixe seu comentário e participe do debate.
Bolsonaro e mais 36 indiciados por suposto golpe de Estado: quais são os próximos passos do caso
Bolsonaro e apoiadores reagem a relatório da PF que indiciou 37. Assista ao Entrelinhas
Deputados da base governista pressionam Lira a arquivar anistia após indiciamento de Bolsonaro
Otan diz que uso de míssil experimental russo não vai dissuadir apoio à Ucrânia