Tempos atrás para desgosto de muitos o economista Gustavo Ioschpe afirmou que a escola pública é o maior sistema de fracasso do país. Usou da seguinte analogia: nenhum ramo de atividade seria viável se metade de seu investimento se perdesse. Mas esse raciocínio não é aplicado à escola: metade dos que ingressam não terminam o ensino médio, e tudo bem. O país naturalizou o disparate da evasão juvenil, ignorando que, à medida que os jovens abandonam o ensino médio, mais vulneráveis estão à informalidade e ao subemprego. Se esse argumento não provoca nem uma furtiva lágrima em quem deveria, lembre-se de que o sumiço desses alunos dos bancos escolares nos priva dos préstimos futuros de profissionais qualificados. Os ausentes poderiam ser médicos, por exemplo. Bem precisamos.
É provável que a crença algo absurda de que somos uma nação jovem, que em se plantando dá, ainda nos mantenha tão iludidos quanto anestesiados. Chegará o dia, quem sabe, em que um grande movimento nacional um arrastão cívico, quem sabe vai pedir aos adultos que façam das tripas coração para manter os jovens na escola. Seria uma boa razão para viver.
Não faltará matéria-prima para argumentar. Os dados do último Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) confirmaram o que já se afirmava à boca pequena nos circuitos educacionais. Os ditos três anos finais antes da faculdade são o gargalo. À medida que passa da infância para a adolescência, mais a escola se torna desinteressante para os alunos. A escola "ganha" os muito jovens, "perde" os jovens. Os desempenhos escolares seguem tendência semelhante. Curitiba é um caso: nos primeiros anos do ensino fundamental, é a segunda do ranking, com 5,9 (atrás de Florianópolis, com 6,1). Nos últimos anos dessa etapa, a nota cai para 4,7.
As explicações não são nenhum mistério e brotam em cascata. Passam pelo currículo fragmentado e sem aplicação clara; pela paixão da escola pelas práticas pedagógicas do século 19. Retóricas e prolixas, aulas soam para os alunos como um discurso sem freios, um tempo perdido, por mais agressiva que essa verdade inconveniente possa soar a quem ensina. Avançou-se: admite-se hoje com certa folga a reforma do currículo, mas o debate anda em gatinhas.
Não fica por aí. Embora os índices do ensino fundamental se mantenham no limite do aceitável, é nessa fase que certas insuficiências educacionais são gestadas, tornando-se um problema grave nos anos que se seguem. As disciplinas de áreas de exatas, em particular, "cobram" mais adiante os conteúdos que não foram bem trabalhados. Sentindo-se sem o fio da meada, muitos desistem, somando-se ao exército de brasileiros de baixa escolaridade, não raro vitimados pelo alfabetismo funcional.
Do ponto de vista técnico, os resultados do Ideb 2014 indicam que é preciso somar forças nos últimos anos do ensino fundamental. Em 16 estados, a nota caiu incluindo o Paraná, mesmo sendo o oitavo do ranking nacional. É no "médio" que a sedução do ensino começa a perder fôlego. Do mesmo modo, já são horas de abraçar a reforma dessa etapa, contendo sua estagnação, de modo a completar a formação dos jovens. É conter o fantasma da evasão ou não veremos país nenhum. Passa pela nota? Passa o ensino médio nas escolas públicas estacionou em 3,4, quando deve chegar a 4,9. Mas passa sobremaneira por um pensar educacional mais apurado, capaz de vencer a inércia instalada nessa fase do sistema. Envolver a sociedade organizada nessa conversa é uma boa pedida.
Em tempo, o sistema privado de ensino também diminuiu dígitos nas suas notas em uma década, a avaliação do ensino médio baixou de 5,6 para 5,4. Uma das explicações é a de que, com o aumento da renda média dos brasileiros, mais pais tenham trocado a escola pública pela particular, abaixando o escore. Mas o argumento é um tanto ingênuo. Aumentou o número de escolas ou de vagas em escolas que não cumprem o que prometem. Surgem como alternativa de investimento ao ensino público, mas outra coisa não fazem senão enfraquecê-lo entre as classes médias. De 2010 a 2013 a rede privada teria recebido 1,1 milhão de novos alunos, aumentando em mais de 17% a participação dessa rede na educação brasileira. Que todo e qualquer recado seja endereçado para esse grupo também.
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