Governar é escolher opções entre cursos de ação possíveis, disse um estadista americano de meados do século passado. Neste sentido, o presidente Lula reconheceu ser a tarefa do governante mais difícil do que a da oposição, porque nesse caso as opções se estreitam, afetadas pela realidade e limitações impostas por fatores como a resistência da burocracia, o controle das demais instituições e à natureza de nossa estrutura política. Por isso o empenho do presidente reeleito na busca de uma coalizão capaz de assegurar a governabilidade.
Mais, durante encontro com governadores, Lula sugeriu aos novos mandatários que previnam o erro de governar com amigos como ele próprio fez em 2003, ao acolher no Ministério e postos de destaque antigos companheiros de partido. Para evitar dificuldades na hora de "tirar alguém" de um cargo, a relação tem de ser de chefe de estado ensinou o presidente, no mais puro estilo de "realpolitk". Esse amadurecimento no poder explica as precauções que o chefe de governo vem adotando para formar uma coalizão assentada na competência e lealdade e assim consolidar sua base parlamentar.
Tais observações, ainda, estão em linha com a doutrina política, desde Maquiavel até os modernos como o professor Michelangelo Bovero, discípulo de Norberto Bobbio na Itália. Em seu livro "Contra o governo dos piores", Bovero concorda que enquanto o ideal utópico associa o governo democrático a um círculo, ou contemporaneamente a uma rede horizontalizada, em sua essência o exercício do poder mantém a figura geométrica de um triângulo: a base é ocupada pelos diversos atores iniciais, "mas é no vértice que são tomadas as decisões coletivas finais".
O ponto a censurar no diálogo travado entre Lula e os interlocutores estaduais está na recusa à oposição, agora que passaram as eleições: "Se alguém quiser fazer oposição a mim, faça na eleição de 2010". Líderes de partidos e personalidades do Congresso criticaram essa expressão, por seu simplismo: a oposição é parte inerente ao processo democrático, onde o que se requer não é o consenso de um pacto permanente, mas um acordo sobre aspectos de aceitação comum do jogo político". O problema brasileiro não reside na oposição; a dificuldade decorre da arquitetura incompleta de nosso regime republicano, por não separar as instâncias de Estado das de governo como fazem as demais democracias consolidadas exceto os Estados Unidos, onde razões históricas justificam essa convergência de funções num mesmo magistrado, o presidente da República.
Questão que, a propósito, poderá ser contemplada na reforma política anunciada para breve, com a adoção dos modelos francês e português de presidencialismo; nesses países o presidente tem a legitimidade derivada da eleição popular direta, mas partilha o cotidiano do poder com um primeiro-ministro responsável perante a assembléia, permitindo ao primeiro se dedicar à sustentação dos valores permanentes da nação.