Há 33 anos, nascia o Consenso de Washington, nome firmado entre políticos, economistas e organismos internacionais no encontro realizado em 1989, cujo programa era a defesa da liberalização do comércio entre as nações, a diminuição das alíquotas de importação, os estímulos à exportação e o avanço da globalização econômica. Os Estados Unidos assumiram a liderança na defesa e divulgação da pauta surgida no evento e começaram a adotar ações para cobrar da comunidade econômica mundial sua implementação sob o argumento que as políticas liberalizantes aprovadas teriam o efeito de melhorar a economia mundial, reduzir a pobreza e aumentar o padrão médio de bem-estar social.
Naquele ano, o Brasil acabava de eleger Fernando Collor de Mello para a Presidência da República, que ganhou a eleição com um programa político de privatização, desregulamentação, liberalização do mercado, fim do protecionismo e abertura da economia brasileira ao exterior. Collor acabou cumprindo parcialmente sua pregação rumo ao liberalismo econômico, em parte porque os governantes brasileiros se especializaram em adotar um programa para ganhar as eleições e executar outro após eleitos. Collor assumiu em 1990 e o Brasil passou a ser pressionado para reduzir as barreiras às importações, abrir a economia nacional à concorrência externa, facilitar o ingresso do capital estrangeiro e submeter as empresas nacionais à competição externa. A pressão vinda de fora para a liberalização foi bastante forte, sobretudo em relação a produtos industrializados oriundos das nações desenvolvidas.
A questão do agronegócio assume alto protagonismo no cenário mundial por seu insubstituível papel no objetivo de reduzir a fome no mundo (um dos principais objetivos divulgados pela ONU), e isso somente será possível se houver aumento da circulação dos produtos agroindustriais entre as nações.
O Consenso de Washington conquistou projeção e teve forte aplicação em vários países e em governos de correntes políticas opostas. O próprio Barack Obama, que se elegeu em 2008, no meio de uma crise financeira mundial que teve seu núcleo principal nos Estados Unidos, tão logo assumiu disse que seu governo faria a maior ofensiva do país no comércio internacional do agronegócio, com a meta de dobrar as exportações do setor em cinco anos, chegando a US$ 200 bilhões. Os meios para tal seriam subsídios e outras formas de protecionismo para os produtores de seu país, medidas claramente contrárias ao que propunha o Consenso de Washington. O argumento do governo norte-americano era de que o agronegócio no país não estava bem, a produtividade era preocupante e as condições de competitividade no mercado internacional precisavam melhorar. Com isso, Obama dava sua contribuição para inviabilizar a ideia da Associação de Livre Comércio das Américas (Alca).
O terceiro governo Lula assumirá em 2023 com duas situações opostas na economia internacional. De um lado, continuam presentes as políticas protecionistas e subsídios para o agronegócio no Japão, na Europa e nos Estados Unidos. O Brasil se tornou mais eficiente que a maioria dos países no setor primário agropecuário, e o governo brasileiro deverá manter pressões para que as nações protecionistas reduzam a proteção e os subsídios, como meio de estabelecer concorrência em condições menos desiguais. De outro lado, o Brasil enfrentará pressões feitas pelos países desenvolvidos para que sejam reduzidas as tarifas de importação e as barreiras não tarifárias que o Brasil mantém sobre produtos industrializados que compra no exterior. Joe Biden e Lula podem parecer ter ideias e programas parecidos, que chamam de “progressistas” (no sentido de “esquerdistas”), mas somente o tempo dirá se isso favorecerá o Brasil ou não.
O Consenso de Washington condena subsídios e protecionismos, inclusive sob alegação de que tais práticas são negativas para todos no longo prazo; mas a liberalização somente faz sentido quando todos caminham na mesma direção. O liberalismo no comércio exterior funciona desde que todos os países desenvolvidos pratiquem as mesmas regras. Se alguns as praticam e outros não, a concorrência se torna desigual e a liberalização se inviabiliza. A situação atual no campo do comércio internacional de produtos oriundos do agronegócio se distanciou do Consenso de Washington e segue as controvérsias que já estavam presentes no governo Obama, quando os norte-americanos tinham um discurso para o público interno e outro para as nações estrangeiras.
A questão do agronegócio assume alto protagonismo no cenário mundial por seu insubstituível papel no objetivo de reduzir a fome no mundo (um dos principais objetivos divulgados pela ONU), e isso somente será possível se houver aumento da circulação dos produtos agroindustriais entre as nações. O livre comércio entre as nações, porém, padece de sérios entraves e um deles é o difícil nó envolvendo as negociações para reduzir os subsídios e o protecionismo. Entre os pontos que fazem parte da pauta de discussão estão a taxação de importação (como fazem os Estados Unidos e Brasil), os subsídios a produtores internos (como fazem o Japão, os Estados Unidos e a Europa) e a redução das barreiras não tarifárias (proibição de importação por questões sanitárias e outras).
Os investimentos na zona rural e nos setores industrial, comercial, de armazenagem, transportes e toda a logística para expansão do produto nacional do agronegócio dependerão das políticas e medidas específicas que o governo venha a adotar nessa área. Se o governo Lula cometer o erro de se perder em debates longos e demorar demais para definir o que vai fazer nessa grande área, o produto nacional do setor será inibido, o que seria ruim para o Brasil e para o mundo.
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