Dezenas de milhares de manifestantes estiveram na Avenida Paulista, em São Paulo, na tarde de sábado, para defender a liberdade de expressão, as garantias democráticas e pedir o impeachment de Alexandre de Moraes, o ministro do STF que tem feito pouco dessas mesmas garantias e liberdades. Outras cidades também registraram atos populares com o mesmo objetivo e a participação daqueles que não tiveram como ir à capital paulista, onde o principal ato também contou com a participação de vários políticos e personalidades.
Ainda que a participação popular tenha sido ligeiramente menor que a de outro grande ato, o de fevereiro deste ano, como admitiu o pastor Silas Malafaia, um dos organizadores da manifestação, ela se destaca pelo ineditismo da pauta. Jamais tantas pessoas haviam se reunido em torno da cassação não de um presidente da República, mas de um ministro do Supremo Tribunal Federal, o que levou o diretor do Ranking dos Políticos, o cientista político Juan Carlos Gonçalves, a dizer que “Moraes saiu chamuscado com tudo que aconteceu ontem [sábado]”. Mas a participação popular, sozinha, não será suficiente para que o objetivo seja alcançado. A bola agora está com outros jogadores, que precisarão finalmente decidir o que fazer com ela.
Os brasileiros que foram à Avenida Paulista não querem nenhum tipo de privilégio. Eles querem democracia, liberdade de expressão e o império da lei
A principal arena, sem dúvida, é o Congresso Nacional. Um impeachment de ministro do STF exige, primeiro, que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), aceite colocar em tramitação um dos vários pedidos já protocolados (um novo pedido foi apresentado nesta segunda-feira); depois, é necessário que 41 senadores aprovem a abertura do processo, e que 54 parlamentares votem pela cassação. No entanto, até agora apenas 25 senadores são abertamente favoráveis ao impeachment. O clima político para uma cassação não surgirá se não houver quantidade suficiente para pressionar Pacheco. Hoje, os indecisos e aqueles que até votariam pelo impeachment, mas não abrem sua posição por medo de retaliações (como disseram alguns dos questionados pela Gazeta do Povo), acabam ajudando Moraes a permanecer onde está e a fazer o que faz.
O impeachment, no entanto, não é a única forma de tentar devolver o país aos trilhos da normalidade. Na Câmara, há iniciativas como a CPI do Abuso de Autoridade, que já preenche os requisitos constitucionais para sua abertura, mas segue na gaveta de Arthur Lira, e projetos de lei que tratam de uma anistia aos manifestantes do 8 de janeiro. Na qualidade de relator dos processos sobre a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes, Moraes tem agido sem o menor respeito pelo direito à ampla defesa e ao devido processo legal, condenando (com a ajuda de seus colegas) centenas de brasileiros sem nenhuma evidência concreta de crimes que eles possam ter cometido e destruindo arbitrariamente inúmeras vidas e famílias.
Por fim, restam a sociedade civil organizada e os formadores de opinião, que dormiram o sono da razão por cinco longos anos. Foi necessário que Moraes desse uma ordem extrema como a do bloqueio do X, com multa a todos os que usassem algum tipo de VPN para continuar lendo o que é publicado na plataforma de Elon Musk, para que algumas entidades acordassem e começassem a fazer as críticas devidas, como a Ordem dos Advogados do Brasil. No entanto, a esmagadora maioria de entidades representativas do setor produtivo e de segmentos profissionais importantes segue calada, enquanto parte relevante da imprensa até mesmo continua tomando partido de Moraes, extasiada em ver seus adversários ideológicos sendo perseguidos.
Os brasileiros que foram à Avenida Paulista e às manifestações em outras cidades no dia 7 não querem nenhum tipo de privilégio. Não querem nem mesmo, como se tem dito erroneamente por aí a respeito de Elon Musk, o direito de quebrar as leis do país, já que não há lei nenhuma prevendo o tipo de medidas que o dono do X resolveu não colocar em prática – pelo contrário, pois as ordens de Moraes são flagrantemente inconstitucionais. O que os brasileiros querem é a democracia, a liberdade de expressão e o império da lei; querem que os juízes da suprema corte atuem de acordo com o que dizem a Carta Magna, e não como “editores de um país inteiro”, nem “poder moderador”, nem “poder político”. O povo foi à rua; é hora de a sociedade civil organizada e de os formadores de opinião se juntarem de vez a ele.
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