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Editorial

Incertezas, riscos e imobilismo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ex-presidente Dilma Rousseff. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil.)

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O Brasil entrou 2023 com Luiz Inácio Lula da Silva assumindo a Presidência da República para seu terceiro mandato, ao qual se somam dois mandatos de Dilma Rousseff (com o segundo mandato de Dilma sendo concluído por seu vice, Michel Temer, após o processo de impeachment que depôs a presidente), portanto com o Partido dos Trabalhadores (PT) tendo vencido cinco eleições presidenciais. A campanha eleitoral de 2022 foi muito estranha e talvez a de menor nível político e intelectual após a redemocratização do país. Para começar, Lula praticamente não conseguia sair às ruas sem ser rejeitado pela população, numa contrafação de si mesmo nas eleições anteriores.

Qualquer análise política de bom nível suporia que um presidente eleito seria sempre aquele que tenha conseguido empolgar as massas e atrair multidões em comícios e eventos públicos o suficiente para ter mais votos que seus oponentes. Outro aspecto seria supor que um candidato vitorioso apresentaria o mérito de ter oferecido aos eleitores um plano de governo e ideias melhores que os candidatos derrotados. Ademais, o normal seria que, na posse de um novo presidente, a população, os empresários, os investidores e todos os agentes de mercado iniciassem seu ano conhecendo o plano de governo, as políticas públicas e as bases sob as quais tocarão suas vidas, negócios e investimentos.

O governo está como um motorista que assumiu o volante de um caminhão, mas não sabe para onde ir nem que carga está transportando, bem como demonstra não conhecer mais o veículo, que já não é o mesmo de 20 anos atrás

Porém, usando sua vocação para o inusitado e o tortuoso, o Brasil, um país gigante de 215 milhões de habitantes, inicia o terceiro mandato presidencial de Lula sem saber nada dos pontos acima expostos, e mais: sem poder planejar e agir partindo da premissa de que Lula será o que já foi – afinal, ele foi presidente duas vezes – e que o PT seguirá políticas e práticas pelo menos parecidas com seus mandatos anteriores na Presidência; nem essa certeza ficou clara. O resumo é: nunca o país entrou sob um novo governo com tanto desconhecimento e numa escuridão de certezas como neste ano. Quem se der ao trabalho de analisar os planos das gestões anteriores de Lula e Dilma obterá informações conflitantes com as últimas falas de Lula.

Para comparar, quando Dilma Rousseff venceu a eleição para seu segundo mandato e, após anunciar os nomes da equipe econômica, a nação foi apresentada a seu plano de seis pontos no campo da gestão macroeconômica. Ainda que ela tenha contrariado a si mesma durante a gestão até ser deposta, os agentes de mercado dispunham das informações sobre os rumos que o governo disse que iria tomar; logo, podiam fazer seus planos e elaborar suas estratégias conhecendo o plano do governo, conforme falas das autoridades daquele momento, como o ministro da Fazenda, Joaquim Levy; o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa; e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini.

O Brasil entrava 2015 com a informação de que o governo pretendia: 1. manter compromisso com transparência e fim das maquiagens na contabilidade pública; 2. perseguir a austeridade fiscal, o controle dos gastos e meta de superávit primário (receitas menos gastos antes de deduzir os juros da dívida) de 1,2% do PIB em 2015 e 2% nos anos seguintes; 3. atuar para manter a dívida pública sob controle e, quem sabe, reduzi-la para chegar a 50% do PIB, inclusive freando repasses do Tesouro Nacional para o BNDES; 4. manter a inflação sob controle e trabalhar para reduzi-la até chegar a 4,5%, que era a meta da época; 5. adotar preços reais para energia, combustíveis e transporte coletivo, os quais haviam sido represados artificialmente por Dilma sob o argumento de segurar a inflação, prática que se revelou desastrosa para o país e, principalmente, para duas das maiores empresas estatais, a Petrobras e a Eletrobras; 6. manter a política de câmbio flutuante.

O plano retomava o tripé econômico do governo Fernando Henrique Cardoso, que consistia em sistema de metas de inflação, austeridade fiscal e câmbio flutuante. Na época, havia sérias dúvidas quanto à possibilidade de a presidente Dilma deixar a equipe trabalhar conforme o plano anunciado. De fato, Dilma transgrediu tudo o que seus ministros haviam anunciado, com aprovação dela, e foi por um caminho desastroso, culminando com as gambiarras orçamentárias que deram as bases legais para seu impeachment.

Esse plano de seis pontos servia para aquela época e serve igualmente bem para os tempos atuais. Porém, o que está acontecendo neste início de 2023 é um plano de dois pontos: o primeiro é Lula falando de coisas e medidas desconexas, altamente preocupantes e que estão assustando os agentes econômicos; o segundo é que não há plano nenhum, o Lula atual demonstra não ser o mesmo Lula do primeiro e segundo mandatos, e a rigor ninguém sabe para onde o governo caminhará em termos de política econômica – nem em muitas outras áreas. O resultado é que as incertezas aumentaram em quantidade e extensão, o país não tem plano econômico, o governo está como um motorista que assumiu o volante de um caminhão, mas não sabe para onde ir nem que carga está transportando, bem como demonstra não conhecer mais o veículo, que já não é o mesmo de 20 anos atrás.

Infelizmente, mais incerteza é sinônimo de mais riscos, desconfiança, imobilismo, menos investimentos e menos crescimento econômico. Para um país que precisa com urgência crescer e enfrentar a miséria e a pobreza, o Brasil vive mais um lamentável desperdício de tempo.

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