Entre as maiores calamidades humanitárias do Brasil, há três que ocupam as primeiras posições: o baixo produto por habitante, a pobreza (nela incluída a miséria) e a desigualdade de renda. Invariavelmente, é em nome do combate a esses males que governantes, políticos, amantes da estatização e ideólogos de esquerda pedem mais Estado, mais impostos, mais leis e mais interferência do governo na vida das pessoas, empresas e instituições em geral. As premissas de quase todas as propostas de leis, políticas e programas são sempre essas, ou seja, combater os males, fazer o bem e melhorar a vida da população. O problema é que normalmente os políticos e governantes buscam apreço e apoio para suas teses brandindo os objetivos desejados, sem entrarem no mérito e no valor funcional das medidas que propõem. E quem paga a conta é a população.
Um exemplo dessa realidade é o crescimento do setor estatal, a expansão da burocracia governamental, o aumento do número de funcionários públicos, o aumento das intervenções sobre pessoas naturais e pessoas jurídicas, a imposição de mais e mais leis e regras de convívio social. É óbvio que, para sustentar a máquina pública e todas suas ações, a sociedade é onerada com cada vez mais impostos.
O discurso dos políticos sempre parece bom; as medidas, não raro, vão na direção oposta.
Atualmente, está em pleno andamento a discussão sobre a reforma tributária, várias propostas vêm sendo debatidas e há pelo menos três propostas de emenda constitucional em primeiro plano no Congresso Nacional – a PEC 45/2019, a PEC 110/2019 e a PEC 46/2022 –, e nenhuma delas significa redução da carga tributária como porcentual do Produto Interno Bruto (PIB). Pelo contrário: pelas projeções iniciais, a arrecadação tributária efetivamente a ingressar nos cofres públicos após a reforma deverá aumentar como fração do PIB brasileiro.
A respeito do crescimento do setor estatal e da máquina pública em todos os níveis, há um dado que revela o quanto isso pode acontecer como medidas anunciadas para melhorar a vida da população, cujo efeito se prova o inverso. Esse dado é a existência de 5.570 municípios, dos quais 3.770 têm menos de 20 mil habitantes, 2.451 têm menos de 10 mil habitantes, e 1.250 têm menos de 5 mil habitantes. Basta imaginar cada município com sua estrutura de prefeitura, Câmara de Vereadores e toda a burocracia circundante para concluir o quanto essa máquina custa para a população, lembrando que a criação descontrolada de municípios foi feita em nome da solução dos problemas no local mais próximo da população. O discurso sempre parece bom; as medidas, não raro, vão na direção oposta.
Ao drama da ineficiência se juntam dois outros males graves: o enorme grau de corrupção e desvio de dinheiro público, e o elevado custo salarial e administrativo da máquina governamental,
Outro exemplo interessante de política feita em nome da ajuda aos pobres, mas que foi desastrosa em termos de resultado, ocorreu quando o presidente José Sarney lançou o Programa Nacional do Leite para Crianças Carentes (PNLCC), em agosto de 1986. Na época, nenhum político teve a coragem de criticar o programa ou pedir explicação sobre sua eficiência – afinal, quem poderia ser contra o governo fornecer leite para crianças carentes? O programa foi implantado e se tornou uma espécie de símbolo social com o qual o governo e o presidente Sarney se apresentavam à sociedade.
Por ironia, a condenação mais veemente do programa do leite ficou por conta de uma declaração dada por Anibal Teixeira, autor da sugestão para criar a Secretaria Especial de Ação Comunitária (Seac), criada por Sarney com a missão de gerenciar os programas comunitários do governo e da qual o próprio deputado Teixeira veio a ser seu titular. De acordo com ele, para cada litro de leite que o governo federal distribuía, a burocracia operacional e administrativa consumia quatro litros.
Duas das causas da miséria e da desigualdade de renda na América Latina são governos ineficientes em termos gerenciais e corruptos em termos morais.
Na época, aquele ministro do governo dava a dimensão da ineficiência que havia tomado conta da administração pública no Brasil. E esse era apenas um dos defeitos congênitos do governo, isto é, a enorme ineficiência gerencial e o elevado custo das ações governamentais – coisa que não é exclusividade do Brasil, sendo a essência da própria noção de governo no mundo todo, com alguma variação de um país para outro.
Se as mazelas do setor estatal se resumissem à ineficiência e ao elevado custo financeiro das ações feitas com dinheiro da sociedade, o problema seria sério, porém substancialmente menor do que é na realidade atual. Ocorre que ao drama da ineficiência se juntam dois outros males graves: o enorme grau de corrupção e desvio de dinheiro público, e o elevado custo salarial e administrativo da máquina governamental, cujos integrantes recebem remuneração média superior às funções equivalentes no setor privado.
Em quase todos os países atrasados, a soma de ineficiência mais corrupção no âmbito do setor estatal responde por grande parte da pobreza e da miséria que atacam as camadas mais vulneráveis da população. O próprio Banco Mundial revela em seus estudos que duas das causas da miséria e da desigualdade de renda na América Latina são governos ineficientes em termos gerenciais e corruptos em termos morais, e que expressiva parcela da arrecadação tributária se perde nos escaninhos financeiros somente por esses dois flagelos. A bem da verdade, a corrupção no setor público não sobrevive sozinha, mas conta com a adesão de agentes privados com os quais o governo mantém negócios, contratos e fornecimento de materiais, serviços e obras.
Uma das principais necessidades na conscientização política da população é o conhecimento sobre o inchaço da máquina estatal, a ineficiência governamental e a corrupção com dinheiro público, e sobre seus efeitos na geração de pobreza, miséria e desigualdade de renda. E aí volta o velho problema do baixo nível educacional em todos seus níveis. A tarefa de melhoria educacional é árdua e longa, mas é preciso começar.