Os dados do IPCA divulgados na sexta-feira pelo IBGE mostram que a inflação oficial acelerou em abril. O índice de 0,38% observado no mês passado, contra 0,16% em março, ficou ligeiramente acima das estimativas do mercado financeiro. No entanto, como a inflação de abril do ano passado foi ainda maior, de 0,61%, o acumulado dos últimos 12 meses continua a tendência de queda iniciada em outubro de 2023, e agora está em 3,69% – a meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional é de 3%, com 1,5 ponto de tolerância para mais ou para menos.
Assim como já ocorreu em outros meses, reajustes sazonais deixaram sua marca no índice. Se em fevereiro as mensalidades escolares haviam puxado o IPCA daquele mês para cima, em abril foi a vez dos medicamentos, já que em 31 de março passou a vigorar o reajuste autorizado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos, da Anvisa. Dos nove grandes grupos de produtos e serviços pesquisados pelo IBGE, Saúde e Cuidados Pessoais liderou a alta, com 1,16%, e o subgrupo de Produtos Farmacêuticos subiu ainda mais, 2,84%, respondendo por 0,10 ponto porcentual do IPCA de abril. Grupos específicos de medicamentos ficaram ainda mais caros, a exemplo dos antibióticos e anti-infecciosos (3,49%).
Os efeitos de uma tragédia como a do Rio Grande do Sul sobre a inflação serão temporários, mas o estrago que um governo gastador pode causar no valor da moeda é muito mais duradouro
No entanto, esse reajuste autorizado e que ocorre todo ano não foi o único a pesar sobre o IPCA. A gasolina voltou a ser o item individual com maior efeito – 0,8 ponto porcentual, graças a um aumento de 1,5% –, mas esse impacto foi contrabalançado por uma queda de 12,09% nas passagens aéreas, item que sempre registra oscilações bastante significativas e que no passado já foi o principal vilão da inflação em alguns meses. Uma fonte especial de preocupação está na aceleração do grupo Alimentação e Bebidas, que subiu 0,7% em abril, contra 0,53% em março. O IPCA de abril não leva em conta os possíveis efeitos da catástrofe das enchentes no Rio Grande do Sul, estado importante para a produção agropecuária brasileira e que, por exemplo, responde por 70% de toda a produção de arroz do país. Representantes do setor agrícola gaúcho afirmam que o arroz já colhido é suficiente para o consumo nacional, mas ainda assim há registros de perdas significativas nas lavouras que ainda não tinham sido colhidas.
A leitura da maioria dos analistas traz uma espécie de otimismo cauteloso. Se por um lado há a possibilidade de uma inflação maior em maio devido às consequências das enchentes, por outro as chamadas médias dos núcleos de inflação, que desconsideram grandes variações sazonais de preços, incluindo choques de oferta causados por eventos extremos, também estão regredindo, estando agora na casa dos 3,5% – um índice menor que o IPCA acumulado, mas ainda assim acima da meta, como lembrou o Copom no comunicado de quarta-feira em que anunciou uma redução menor da taxa Selic em comparação com as quedas anteriores.
E os últimos dados do IPCA não podem ser usados como argumento para criticar a mais recente decisão dos diretores do Banco Central. Além do fato de a inflação cheia e os seus núcleos seguirem acima da meta, apesar das sucessivas reduções no acumulado de 12 meses, outros fatores entram em jogo. A manutenção dos juros norte-americanos (altos para os padrões daquele país) pressiona o câmbio, com risco de encarecimento de produtos e insumos importados; e, principalmente, o desleixo fiscal do governo ameaça o processo desinflacionário graças à insistência na elevação da despesa pública. Os efeitos de uma tragédia como a do Rio Grande do Sul sobre a inflação serão temporários, mas o estrago que um governo gastador pode causar no valor da moeda é muito mais duradouro.
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