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Pelo segundo mês seguido, a inflação oficial medida pelo IBGE teve aceleração na comparação com o mês anterior. Superando levemente as projeções do mercado, o IPCA de maio ficou em 0,46%, contra 0,38% em abril e 0,16% em março. O número do mês passado também fez com que o acumulado dos últimos 12 meses voltasse a subir pela primeira vez desde meados do ano passado. Em setembro de 2023, o acumulado chegara a 5,19%, e a partir de outubro emendou sete meses de queda, até chegar aos 3,69% em abril deste ano; agora, foi para 3,93%, mais próximo do limite máximo de tolerância que da meta de 3%.
O sinal de alerta fica mais forte ao se perceber que, caso a inflação se mantenha nesse mesmo nível pelos próximos meses, até esse limite máximo de tolerância correrá risco de ser rompido, já que o IPCA ficou abaixo de 0,3% ao mês entre junho e novembro do ano passado. Com a substituição, no acumulado, dessas inflações mais baixas por outras mais altas, a inflação anualizada seguirá crescendo. O mercado financeiro, no entanto, segue estimando que o IPCA de 2024 terminará abaixo de 4% – no mais recente Boletim Focus, a mediana das expectativas é de 3,90%, com 0,14 ponto porcentual de elevação na comparação com as estimativas de quatro semanas atrás.
O caos fiscal de Lula é inflacionário, e a falta de iniciativa para superá-lo só eleva a possibilidade de turbulências à frente
Algumas altas que costumam mexer mais com a inflação já eram esperadas – é o caso do leite longa vida, que tradicionalmente sobe de preço em meados do ano devido à entressafra. Além disso, dava-se como muito provável o efeito inflacionário das enchentes no Rio Grande do Sul, e que efetivamente se concretizou. Sem surpresa alguma, de todas as regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE, a de Porto Alegre foi a que registrou maior alta no IPCA, de 0,87% – o índice da capital gaúcha tem peso de 8,61% na composição total do índice. A batata-inglesa, produto que subiu 20,61% apenas em maio, teve sua produção afetada pelas chuvas, e o IBGE avalia que outros tipos de dano causado pelas enchentes, como a interrupção de cadeias de produção, podem ter efeito no IPCA dos próximos meses.
No entanto, sazonalidades previstas e efeitos de eventos climáticos imprevistos não são desculpa para que especialmente o governo observe esse pequeno repique do IPCA com indiferença. Se por um lado o mercado financeiro segue prevendo que a inflação de 2024 ficará abaixo de 4%, por outro lado os mesmos agentes também estimam que o Copom não seguirá cortando a taxa Selic no mesmo ritmo de antes – e os dois números, inflação e taxa de juros, são indissociáveis. Se, no raciocínio dos entrevistados pelo BC, a inflação só não escapará do controle porque o Copom manterá a política monetária contracionista, é preciso buscar as causas mais profundas desta dinâmica.
E essas causas incluem o deserto total de ideias para colocar as contas públicas em ordem. Avesso a corte de despesas, Lula e sua equipe econômica só planejam elevar a arrecadação; a recente MP que mudava o uso dos créditos de PIS-Cofins, inclusive, tinha grande potencial inflacionário, que só não se concretizará porque, em uma decisão rara, o Congresso Nacional devolveu a MP ao governo, suspendendo sua vigência – e Lula, marotamente, tentou se distanciar dela, como se não fosse a sua assinatura na MP. Quanto ao Rio Grande do Sul, a única “grande medida” governamental foi uma importação desnecessária de arroz que, em seu primeiro leilão, já despertou suspeitas mais que justificadas, a ponto de o governo ter resolvido desfazer todo o processo. O caos fiscal de Lula é inflacionário, e a falta de iniciativa para superá-lo só eleva a possibilidade de turbulências à frente.