José Dirceu está de volta à prisão. Depois de ter sido condenado pelo Supremo Tribunal Federal como um dos mentores do mensalão, o ex-ministro-chefe da Casa Civil e homem forte do governo Lula foi um dos alvos da Pixuleco – o nome escolhido para a 17.ª fase da Operação Lava Jato é referência ao apelido carinhoso que o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto usava para se referir à propina, segundo depoimento do empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC. Além de Dirceu, ainda foram presas mais sete pessoas, incluindo um irmão e um assessor do ex-ministro. As prisões em si e os argumentos para que elas fossem realizadas ajudam a impedir um desvio perigoso que vinha sendo construído na narrativa do petrolão.
O modelo do mensalão, dizem os procuradores, foi replicado no petrolão
Com representantes das maiores empreiteiras do país na cadeia, e especialmente após as prisões dos presidentes de Andrade Gutierrez e Odebrecht, em junho, durante a 14.ª fase da Lava Jato, defensores do governo trataram de fortalecer a versão de que a roubalheira na Petrobras só ocorreu porque grandes empreiteiras se uniram em um cartel para pressionar a estatal a entregar suas grandes obras àquele grupo selecionado de empresas. Nesta narrativa, a Petrobras, seus diretores e os demais políticos envolvidos são vítimas de empreiteiros inescrupulosos. Já era uma história inverossímil, dada a desigualdade gritante na relação entre Estado (e uma estatal que estava, até pouco tempo atrás, entre as maiores empresas do mundo) e iniciativa privada em um país como o Brasil, marcado pelas altas doses de intervencionismo governamental. A força-tarefa da Lava Jato, ao expor os motivos que embasariam a prisão de José Dirceu, dá razão a quem não comprava essa narrativa.
“Chegamos a um dos líderes principais, que instituiu o esquema”, afirmou o procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima. Pela argumentação do MP, como homem próximo de Lula, Dirceu tinha influência em diversas nomeações dentro da Petrobras. Duas das pessoas que Dirceu teria colocado em posição importante na estatal eram justamente os ex-diretores Renato Duque e Paulo Roberto Costa, peças centrais do escândalo de cobrança de propina para a assinatura de contratos entre a Petrobras e as empreiteiras. O modelo do mensalão, dizem os procuradores, foi replicado no petrolão.
O que temos, portanto, é um esquema sem vítimas, ao contrário do que gostaria fazer crer o “núcleo político” do petrolão, para tomar emprestada uma expressão consagrada no julgamento do mensalão – quer dizer, vítimas houve: a própria Petrobras, sua credibilidade, seus funcionários, seus acionistas (especialmente os minoritários), em suma, toda a sociedade. Mas aqueles que estiverem realmente envolvidos no esquema para pilhar a empresa, dentro e fora dela, esses se beneficiaram da roubalheira, em maior ou menor grau, seja em proveito próprio ou em proveito dos projetos de poder a que pertenciam. Não queremos, com isso, dizer que não houve cartel – as investigações vêm mostrando justamente o contrário; mas o cartel jamais pode ser usado como a única explicação para o escândalo.
Além de restabelecer o eixo na narrativa do petrolão, não se pode deixar de ressaltar, aqui, a repercussão da prisão entre lideranças do PT. O líder do partido na Câmara, Sibá Machado, afirmou que a Polícia Federal cometeu “abuso de poder”; Gleide Andrade, vice-presidente da legenda, falou em “grande injustiça” e recorreu ao vitimismo segundo o qual só petistas vão presos: “quero ver prisão de gente do PSDB, do DEM”, pediu. Uma ala do PT, chamada Movimento Resistência e Luta, prometeu uma vigília diante do STF na noite de segunda-feira. As acusações de arbitrariedade não se sustentam. As investigações encontraram quase R$ 40 milhões recebidos pela empresa de consultoria de Dirceu sem que houvesse real prestação de serviços. Dirceu estaria recebendo dinheiro de propina até mesmo enquanto respondia no Supremo pelo mensalão e depois de condenado, quando cumpria prisão domiciliar. Mesmo assim, líderes petistas ressuscitam a estratégia de desacreditar as instituições, em uma atitude que já causou muito dano ao Brasil.