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Mesmo com Selic em 11,25%, um investidor terá recebido bem menos que isso quando resgatar seus títulos.| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo / arquivo

A taxa básica de juros, a Selic, foi fixada em 11,25% ao ano pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) em sua reunião mais recente, na semana passada. Quando há qualquer elevação nos juros (ou até mesmo reduções leves), políticos de esquerda vão à carga com o batido chavão de que o Brasil tem “uma das mais altas taxas de juros do mundo”. A previsão mais fácil de fazer é que, sempre que o Copom elevar a Selic, políticos de esquerda, especialmente os do PT, irão protestar, muitas vezes seguidos pelo próprio presidente Lula, sobretudo com o argumento de que a elevação da Selic prejudica o governo na administração da dívida pública, posto que parte dos títulos públicos é indexada pela Selic.

São críticas que não consideram aspectos essenciais na avaliação sobre a taxa de juros real que o governo paga nos títulos emitidos com remuneração pela Selic. A taxa de 11,25% atualmente vigente é alta dependendo da comparação que se faça. Por exemplo, comparada com a taxa básica dos Estados Unidos, do Japão ou da zona do euro, a Selic será uma taxa alta. Mas a comparação feita dessa forma é falha e incompleta, por uma razão simples: a Selic é apenas a taxa nominal incidente sobre dívidas feitas com juros indexados à Selic.

Quando são pagos os juros sobre uma dívida com base na Selic, o governo cobra Imposto de Renda com alíquota de 20% sobre os rendimentos, isto é, a taxa de juros líquida para o detentor do título da dívida é de 9%, pois 20% de imposto sobre rendimentos ganhos a uma taxa de 11,25% equivale a 2,25% sobre o principal da dívida. Em segundo lugar, essa taxa de juros líquida não representa o ganho real do investidor porque, desde a data do investimento até o dia do resgate do capital principal aplicado, ocorreu inflação que impôs perda de poder de compra do dinheiro. Assim, se a inflação terminar o ano em 4,6%, por exemplo (hoje, o IPCA acumulado em 12 meses está em 4,76%), o ganho real do investidor será igual a 9% (Selic após pago o Imposto de Renda) menos 4,6% de inflação, ou seja, 4,4%, taxa esta que significa o juro real.

Só faz sentido comparar as taxas básicas de juros em dois países por meio de cálculo que compare o imposto de renda sobre rendimentos financeiros e a taxa de inflação em ambos

De forma simplificada, só faz sentido comparar as taxas básicas de juros em dois países por meio de cálculo que compare o imposto de renda sobre rendimentos financeiros e a taxa de inflação em ambos. Um aspecto que merece ser lembrado é que, se o governo cobra imposto sobre todo o rendimento financeiro do título, o Tesouro Nacional está cobrando imposto sobre o ganho real e também sobre a inflação, posto que o imposto é cobrado sobre os rendimentos totais obtidos pelo investidor pela taxa bruta da Selic. Regra geral, o principal motivador de aumento da Selic é a inflação ascendente constatada e/ou a previsão de que o processo inflacionário está recebendo estímulos para subir.  

Se o Banco Central, por meio do órgão encarregado de fixar a taxa básica de juros (o Copom), eleva a taxa Selic em função da inflação efetivamente ocorrida mais a inflação projetada, é o caso de indagar quais razões levam o BC a prever que a inflação está sendo forçada para cima. A resposta está na administração da política fiscal pelo governo (arrecadação tributária e gastos públicos) e nos déficits públicos já ocorridos, mais as sinalizações sobre como o governo pretende gerenciar os déficits fiscais no futuro. Se o governo vem fazendo déficit e continua indicando que não tomará medidas firmes para reduzi-lo, a autoridade monetária encarregada de fixar a taxa de juros não tem outra medida a tomar além da elevação da Selic.

No caso do Brasil, esse problema adquiriu uma faceta impensável por qualquer governo que leve a sério a ameaça de inflação e os danos que ela provoca aos trabalhadores e aos investimentos produtivos: o governo, pela voz do próprio presidente da República, deixa claro que não reduzirá gastos públicos nem perseguirá o equilíbrio fiscal, mesmo após elevar a arrecadação tributária por meio de aumentos de impostos e contribuições. Lula tem deixado claro que não julga importante reduzir gastos públicos; qualquer medida apresentada neste sentido é tomada a contragosto, e raramente ataca o problema de frente. O governo deve seguir gastando mais do que arrecada ainda que as receitas cresçam em função das elevações de tributos.

Diante dos dados reais vindos dos períodos passados e de como o governo diz que vai ser o futuro, a única conclusão possível do BC é acreditar que o governo está pondo fogo na inflação e que ela somente não subirá se o BC tomar medidas realmente amenizadoras (ou seja, não meros paliativos) no campo da política monetária. A principal medida de que dispõe o BC em um quadro como esse é elevar a taxa básica de juros, a qual, nunca é demais repetir, não significa aumento de juros reais caso a Selic suba em porcentuais compatíveis com os aumentos porcentuais da inflação.

O quadro atual da gestão macroeconômica está condicionado pela recusa do governo em promover o equilíbrio das contas públicas. A convivência entre aumentos de tributos, déficits públicos elevados e inflação é possível somente em períodos curtos, mas inviável em períodos prolongados. Não tendo como explicar a má estrutura da política econômica de seu governo, o presidente resolveu atacar os livros de Economia dizendo que eles estão superados, discurso considerado infantil por qualquer estudioso dos princípios básicos do funcionamento da economia nacional. Se nem a sociedade nem o parlamento conseguirem dissuadir o governo das más ideias de política econômica, a população arcará com os danos em forma de menor crescimento econômico, mais inflação e redução do poder de compra dos trabalhadores.

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