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editorial

Justiça lenta e impunidade

Os índices de prescrição mostram que não é exatamente por inexistência de boas leis que criminosos não pagam as penas que lhes são previstas

Que a Justiça brasileira é lenta todo mundo sabe. O que nem sempre se diz é que, em razão dessa proverbial morosidade, corruptos e ímprobos de toda ordem escapam da punição porque são beneficiados pela prescrição – instituto previsto no direito processual que, na prática, extingue os processos não julgados por prazo superior à presumível pena que seria imposta aos réus. Assim, se a pena máxima a que o réu poderia ser condenado for menor que o período já decorrido na Justiça para o deslinde da causa, perde o Estado o direito de punir ou executar a pena em razão do decurso de prazo. Ou seja: praticar o crime acaba sendo compensador para o criminoso.

Trata-se de uma situação de alta gravidade e que precisa ser corrigida. E isso passa não apenas pela via da modernização dos códigos de processo quanto também pelo aprimoramento tecnológico e profissional dos juízes e seus assessores em matérias que envolvem complexas investigações e interpretações, como nos casos de corrupção, improbidade administrativa e lavagem de dinheiro.

Exemplar, neste sentido, foi o caso do mensalão. Ao envolver tão grande número de réus, instituições públicas e privadas e tantas artimanhas intentadas em conluio por seus autores, bem se viu a dificuldade que enfrentaram os órgãos de investigação e de julgamento para que, somente agora, oito anos após as primeiras denúncias, se esteja chegando ao fim do processo. E é bom lembrar que quatro dos 35 réus, companheiros de José Dirceu, Genoino, Delúbio e companhia, beneficiaram-se da prescrição de algumas das penas que lhes cabiam.

O braço curto da Justiça, que deixa escapar muitos que mereceriam ser punidos, ficou bem à vista no relatório divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – que a Gazeta do Povo noticiou na edição de ontem – ao revelar que, de um total de 25.799 processos em tramitação até 2011 nos tribunais brasileiros, 2.918 prescreveram. Isto é, mais de 10% dos supostos criminosos neles acusados simplesmente livraram-se de quaisquer punições exclusivamente em razão do excesso de prazo – em grande parte das vezes fruto também de procrastinações que advogados hábeis e bem pagos sabem manejar.

Daí a sensação de impunidade que revolta a sociedade, que percebe a desenvoltura com que se mantêm ativos políticos e empresários notoriamente envolvidos com o Código Penal, com a Lei de Improbidade Administrativa, com a Lei da Ficha Limpa e com tantos outros instrumentos legais que, em tese, foram criados para frear os altos índices de malfeitorias que assolam o país. Logo, não é exatamente por inexistência de boas leis que criminosos – notórios ou não – não pagam as penas que lhes são previstas.

A constatação de uma revoltante contradição – a superlotação das cadeias e penitenciárias de condenados por crimes que, do ponto de vista dos malefícios sociais, são menores que os praticados por poderosos – pode levar à impressão de que os juízes são mais condescendentes com os crimes de colarinho-branco. Mas essa é uma acusação precipitada; como vimos, os crimes de corrupção frequentemente envolvem redes complexas e difíceis de destrinchar. Por isso mesmo, que se reconheça a necessidade de aperfeiçoamento dos tramites processuais, incluindo a limitação dos infindos recursos atualmente possíveis, assim como se dê aos órgãos julgadores o aparelhamento técnico e humano capaz de torná-los mais ágeis em suas decisões, pois, como disse Ruy Barbosa, "Justiça tardia nada mais é que injustiça institucionalizada".

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