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O desmonte da Operação Lava Jato não é obra única e exclusivamente do Supremo Tribunal Federal; diversas outras instituições, de tribunais de primeira instância ao Conselho Nacional do Ministério Público e o Congresso Nacional, têm tomado decisões que livram denunciados, revertem condenações, perseguem juízes e procuradores e garantem que jamais haverá algo semelhante à maior operação de combate à corrupção da história do Brasil. Na quarta-feira, dia 1.º, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu sua contribuição a esse processo quando anulou as condenações de 13 réus da Lava Jato, incluindo o ex-ministro Antonio Palocci, o ex-tesoureiro petista João Vaccari Neto e o ex-diretor da Petrobras Renato Duque. Todos os processos deverão recomeçar do zero, agora na Justiça Eleitoral.
A decisão do ministro Jesuíno Rissato, no entanto, era previsível, pois ele teria de seguir uma outra decisão, esta, sim, vinda do Supremo Tribunal Federal, que em 2019 abriu não uma brecha, mas uma enorme cratera em benefício dos réus da Lava Jato ao decidir que os casos de corrupção que também envolvessem uso de dinheiro em campanhas eleitorais deveriam ser julgados não pela Justiça comum, mas pela Justiça Eleitoral. Palocci, Vaccari, Duque e outros réus tinham sido condenados por Sergio Moro em 2017 por participarem de um esquema para que a empreiteira Odebrecht conseguisse, por intermédio da empresa Sete Brasil, vencer uma licitação e assinar contrato com a Petrobras para a construção de seis sondas. O dinheiro desviado bancou campanhas eleitorais do PT.
Cada anulação de processos conduzidos em plena obediência à lei penal e aos códigos processuais, cada condenado pela Lava Jato que se torna “ex-condenado” desmoraliza o sistema judiciário brasileiro
Quando o Supremo decidiu que esses casos deveriam ser remetidos à Justiça Eleitoral, lembramos que tal interpretação, embora possível, era repleta de “falhas conceituais” como a subordinação do crime mais grave, o de corrupção, ao crime eleitoral de caixa dois. E previmos: “Podemos dar como certa, daqui em diante, uma onda de confissões de caixa dois como nunca se viu neste país. Não porque os acusados ou condenados tenham, repentinamente, adquirido alguma decência que os leve a admitir crimes, mas porque este será o caminho para tirar das mãos da Justiça Federal processos que ainda estejam em andamento, reiniciando tudo de novo em uma corte diferente” – o que não estava claro à época, mas ficou evidente com o passar do tempo, é que não apenas os processos em andamento seriam paralisados, mas também os julgamentos já concluídos seriam anulados.
Agora, os petistas e os demais réus serão julgados por uma corte que, como também afirmamos em 2019, é “pouco preparada para analisar crimes comuns, cuja composição muda com frequência e que inclui até mesmo integrantes que não são juízes, mas advogados eleitoralistas”. Como agravante, será improvável que a Justiça Eleitoral dê ao caso o destaque necessário em 2022, já que terá de lidar com toda a organização das eleições do próximo ano, que podem ser as mais judicializadas da história graças à disposição do Judiciário de ser “editor da sociedade” e definir o que é verdade e o que são fake news. O risco de lentidão e até de impunidade fica ainda maior.
Cada anulação de processos conduzidos em plena obediência à lei penal e aos códigos processuais, cada decisão de tribunais superiores que estabelece precedentes para se reescrever o passado, cada condenado pela Lava Jato que se torna “ex-condenado” desmoraliza o sistema judiciário brasileiro e destrói esperanças de um país onde a corrupção seja devidamente combatida e onde o crime não compense. Um conjunto probatório robustíssimo, obtido de forma totalmente legal por uma operação que conseguiu um sucesso inédito na história do país – pois nunca antes tantos peixes graúdos tinham sido finalmente pegos, julgados e condenados –, e as decisões judiciais baseadas nestas evidências são tornados inúteis pela vontade de ministros que invertem competências, inventam suspeições, revertem os próprios entendimentos. Queiram ou não os responsáveis por tais decisões, elas fazem do Brasil o paraíso da impunidade.