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editorial

Luiz Abi e o foro privilegiado

Parente distante do governador Beto Richa, Luiz Abi Antoun, que tinha livre trânsito na administração estadual apesar de não deter cargo público, foi identificado como autor e beneficiário de uma licitação supostamente fraudada para contratação de oficinas mecânicas encarregadas da manutenção da frota oficial, conforme apurou a Operação Voldemort, deflagrada no início do ano pelo Gaeco, órgão do Ministério Público Estadual. A licitação havia sido lançada pelo Departamento de Transporte (Deto) da Secretaria de Estado de Administração, comandada pela secretária Dinorah Nogara.

Uma das vencedoras da licitação foi uma oficina sediada em Londrina e que o Gaeco identificou como sendo de propriedade de Luiz Abi. No aprofundamento das investigações, os agentes realizaram busca e apreensão no Deto. Documentos e computadores foram levados para a obtenção de eventuais provas do direcionamento da licitação e que poderiam, eventualmente, implicar a secretária na fraude.

Foi o que bastou para que os defensores de Abi requeressem à Justiça a imediata suspensão da ação penal movida contra ele. Motivo simples e pertinente à legalidade processual: como secretários de Estado gozam de foro especial e, portanto, investigações que os alcancem só podem ser realizadas com autorização e trâmite no Tribunal de Justiça, também qualquer ação penal contra Luiz Abi deveria ser conduzida pela instância superior, já que no mesmo caso estaria envolvida a secretária de Administração.

As denúncias não apenas da Operação Voldemort, mas também da Operação Publicano deixaram o Paraná perplexo

O desembargador Renato Lopes de Paiva não aceitou essa argumentação e, em junho, negou o pedido de liminar, argumentando que Dinorah não havia sido denunciada. “Uma vez que nada existe no juízo do Tribunal de Justiça quanto à secretária (...), como se pode afirmar que este juízo deve ser estendido aos corréus? Sequer é possível falar que a secretária de Estado e o reclamante são corréus, já que ela não foi denunciada. Também não se pode afirmar que o delito foi praticado em coautoria, já que a secretária não foi investigada no primeiro grau. Não se pode estender uma competência que sequer foi fixada”, escreveu. No entanto, a questão foi levada ao Órgão Especial do TJ, que em decisão apertada – 9 a 7 – decidiu pela paralisação do processo. Prevaleceu a argumentação do desembargador D’Artagnan Serpa Sá, para quem “é inegável que existe investigação em curso em face de agente detentor de foro por prerrogativa de função”. Ao juiz da 3.ª Vara Criminal de Londrina, Juliano Nanuncio, restou suspender, em 11 de setembro, a ação penal do caso Voldemort.

Na prática, isto significa que Luiz Abi, ainda que nem servidor público seja, passa a gozar da mesma prerrogativa de foro da autoridade pública representada pela secretária Dinorah Nogara, embora todos os indícios apontem que o nome da secretária já tinha sido excluído como ré do processo – como apontou inicialmente o desembargador Paiva – e ela nem mais esteja sob investigação, pois a Procuradoria-Geral de Justiça já arquivou procedimento contra Dinorah em agosto.

A decisão do Órgão Especial, entretanto, não é final: o TJ ainda precisa analisar o mérito da questão, e aqui existe um risco: o da morosidade. Há o triste precedente do assessor Ezequias Moreira, promovido ao cargo de secretário especial do Cerimonial do Palácio Iguaçu justamente quando estava na iminência de ser julgado por um juiz criminal de primeira instância por ter, ao longo de muitos anos, recebido salários depositados pela Assembleia Legislativa em nome da sogra – o “caso da sogra fantasma”. O processo a que Ezequias responde dorme tranquilamente no Tribunal de Justiça.

As denúncias não apenas da Operação Voldemort, mas também da Operação Publicano deixaram o Paraná perplexo com o tamanho da crise moral que pairava sobre o estado. Que os desembargadores tenham a consciência de que prolongar indevidamente – ou seja, por um tempo maior que o necessário para analisar qual a instância correta em que Luiz Abi deve ser julgado – o impasse sobre a ação penal apenas ampliará essa sensação de perplexidade e em nada contribuirá para que o paranaense possa confiar em suas instituições.

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