À medida que o tempo passa, mais se sabe quem é, de fato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O exemplo mais recente data da última segunda-feira, quando, em palestra em São Paulo para uma plateia formada por partidos de esquerda, ele abertamente confessou ter “doado” para a Bolívia as instalações que a Petrobras mantinha naquele país para extração de gás. A camaradagem já havia sido combinada com o ainda então candidato à presidência boliviana, Evo Morales – que, eleito, meses depois de sua posse pôs suas tropas para confiscar o patrimônio brasileiro, em maio de 2006.
Foi bem simples, segundo relato do próprio Lula: “O Evo me perguntou: ‘como vocês ficarão se nós nacionalizarmos a Petrobras?’ Respondi: ‘o gás é de vocês’. E foi assim que nos comportamos, respeitando a soberania da Bolívia”. O presente que Lula deu à Bolívia valia nada menos do que US$ 1,5 bilhão. E agora se sabe também que a ocupação militar das refinarias não passou de uma patética encenação para dar pretexto à colossal e despropositada oferenda.
É tosco o raciocínio de Lula para justificar a doação. Ele não tinha o direito, senão pisando sobre a soberania do país que governava, de alienar um bem do Estado. É de se perguntar: a seguir seu entendimento, bastaria deslocar nossos navios de guerra para tomar dos estrangeiros as plataformas instaladas para explorar o “nosso” petróleo? Evidentemente, nenhuma das opções pode nem sequer ser aventada por um chefe de Estado. No mundo civilizado devem prevalecer regras contratuais de direitos e deveres que regulam as relações entre nações.
A Petrobras encontra-se, na prática, privatizada: foi transformada em propriedade do PT para fins partidários, eleitorais e ideológicos
O ex-presidente foi além em suas tardias confissões ao falar para o Foro de São Paulo, organização que reúne representantes de esquerda da América Latina. Ele deixou patente que, ao colaborar com o arroubo de Morales, sua pretensão era a de fortalecer os regimes bolivarianos que floresciam no continente – isto é, Lula foi movido por uma causa ideológica e, em nome dela, transferiu a outro país um patrimônio de que ele não podia dispor como se fosse sua propriedade particular.
Absolutamente nada autoriza um presidente da República a usar desta forma um patrimônio do Estado, dando sinal verde informal – como Lula atesta com suas próprias palavras – a um ato de expropriação por parte de um governo estrangeiro. Na verdade, ele confessou ter sido cúmplice de um atentado à soberania nacional, preferindo o interesse boliviano ao interesse brasileiro. A esquerda – nela incluída o próprio Lula – adora repetir que estatais são “do povo brasileiro”. Segundo a lógica das esquerdas, então, a conclusão é evidente: Lula entregou à Bolívia algo que era “do povo brasileiro”. Claro, sabemos que na realidade estatais pertencem ao Estado, e não ao povo. Mesmo assim, isso não autoriza o mandatário de plantão a dispor dos bens do Estado como bem lhe aprouver, especialmente quando isso significa um ataque à soberania brasileira.
Não causa surpresa, porém, o desdém que Lula dedicou à Petrobras no caso boliviano. A estatal foi contínua e permanentemente pilhada ao longo de seu governo e do mandato da presidente Dilma Rousseff, como bem demonstra a Operação Lava Jato. Fez-se dela, durante esse período, um caixa livre para abastecer partidos e enriquecer políticos, diretores e operadores que se fartaram de propinas. A empresa também foi sangrada como instrumento de política econômica; represava-se sua rentabilidade para conter a pressão inflacionária, impunham-se à estatal prejuízos reais ou tolhia-se sua capacidade de investimentos.
A Petrobras encontra-se, na prática, privatizada: foi transformada em propriedade do PT para fins partidários e eleitorais. E, agora, ficamos sabendo pela boca do próprio Lula que ela também foi usada para camaradagens ideológicas. Não por outras razões a empresa que já foi uma das maiores do mundo frequenta hoje posições muito mais modestas no ranking – liderança global, agora, só em endividamento.
Analisando apenas os valores, a “doação” de parte do seu patrimônio para o amigo Evo Morales poderia até ser considerada um “mal menor” diante de tudo quanto se fez para levar a Petrobras ao triste estágio em que hoje se encontra. Mas o significado do episódio vai muito além das cifras. Ele mostra como, desmoralizada e desvalorizada, a Petrobras se tornou o retrato pronto e acabado da ideologização irresponsável da administração petista.
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