Com aquela arrogância típica de quem tem certeza absoluta de que o brasileiro irá às urnas em outubro sofrendo de uma amnésia coletiva que o fará esquecer de como o petismo quebrou o Brasil, o ex-presidente, ex-presidiário e ex-condenado Lula voltou a atacar o teto de gastos em entrevista ao portal UOL. “Não preciso de teto de gastos. Quando você faz uma lei de teto de gastos é porque você é irresponsável, porque você não confia em você, porque você não confia no seu taco, porque você não tem segurança do que vai fazer”, disse Lula, reafirmando as críticas que já vinha fazendo ao mecanismo que limita o crescimento dos gastos públicos e foi instituído em 2016, durante o governo de Michel Temer.
De correto mesmo, apenas a menção à irresponsabilidade. Se houve uma razão para Temer e sua equipe econômica elaborarem a PEC que estabeleceu o teto de gastos, foi a irresponsabilidade colocada em prática no fim do segundo mandato Lula e durante todo o governo de Dilma Rousseff, em que a gastança sem fim se tornou a norma. A empolgação com o “PIBão” de 2010, a descoberta do pré-sal, o PAC e as obras necessárias para os iminentes megaeventos esportivos como a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 convenceram o governo de que o dinheiro jorraria abundantemente nos cofres públicos por tempo indeterminado, e não só poderia como deveria ser gasto. Assim, o petismo foi responsável pela explosão no gasto público, em uma combinação de agrados ao funcionalismo e convicção no poder do Estado como protagonista da atividade econômica. Não havia como dar certo, e efetivamente não deu – a “nova matriz econômica” esbanjadora causou a pior recessão da história do país em 2015 e 2016. O teto de gastos foi a resposta a esse descalabro; era preciso evitar que futuros governos populistas tivessem a possibilidade de repetir o que o petismo havia feito com o país.
Se há alguém neste país que precisa ser contido por um mecanismo como o teto de gastos, esse alguém é Lula
Isso nos leva ao segundo ponto na fala de Lula. Ora, o que não faltou ao petismo enquanto falia o Brasil foi autoconfiança. Lula e Dilma fizeram o que fizeram com toda a segurança. Nem falamos aqui da confiança de que não seriam descobertos todos os esquemas de corrupção que o petismo arquitetou enquanto no poder, mas da certeza de que sua política econômica era mesmo a mais correta, que era preciso gastar o que fosse necessário. Valia até maquiar os livros com a “contabilidade criativa” para que inconvenientes como a lei não atrapalhassem um plano que faria o Brasil decolar como o Cristo Redentor na famosa capa de 2009 da revista britânica The Economist – quatro anos depois, a mesma revista publicava nova capa com o “foguete do Cristo” descontrolado, perguntando se o Brasil havia estragado tudo; Dilma e seu ministro da Fazenda, Guido Mantega, no entanto, seguiam confiando plenamente no caminho traçado. Como a história recente mostra, pode-se muito bem rumar para o abismo com a mais absoluta segurança.
Na mesma entrevista, Lula já deu uma pista do que gostaria de fazer caso seja eleito, mas não tenha base parlamentar suficientemente numerosa para tirar da Constituição o teto de gastos: contorná-lo ainda mais acintosamente que o atual governo. O petista afirma que dinheiro destinado a educação, saúde e ciência e tecnologia é “investimento”, não “gasto”, e por isso deveria ficar fora do teto. Um truque de linguagem rasteiro – já que, independentemente de como se considere a rubrica, os recursos saem dos cofres públicos da mesma forma – que, esticado ao limite, permitiria retirar do teto boa parte do Orçamento da União, bastando justificar que se trata de “investimento”. E só os muito ingênuos acreditariam que o espaço que viesse a ser liberado dentro do teto não seria rapidamente ocupado por sabe-se lá que novas despesas.
Ou seja, se há alguém neste país que precisa ser contido por um mecanismo como o teto de gastos, esse alguém é Lula. O discurso da gastança sem fim pode até ter seu apelo, especialmente em um país cheio de mazelas socioeconômicas como a pobreza e o desemprego, mas no médio prazo ele é caminho certo para a crise econômica, como a passagem petista pelo Planalto já demonstrou. A melhor forma de ajudar os pobres é colocar a economia em ordem, desinchar o Estado, desengessar o orçamento, eliminar aberrações como emendas de relator e fundões bilionários, e dar saúde fiscal ao país, aumentando a confiança do investidor interessado em gerar emprego e renda. Lula e o PT já deixaram claro que este não é o seu plano.
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