Presidente Lula miminiza 200 mil mortes ocorridas na guerra da Ucrânia.| Foto: Ricardo Stuckert / PR

Um dos muitos clichês do cinema, explorado até mesmo por Alfred Hitchcock, é o do criminoso que busca o Brasil como esconderijo, certo de que por estas paragens encontrará a impunidade que procura – e a vida imitou a arte quando, em 1970, o britânico Ronald Briggs se tornou um dos mais famosos foragidos a se esconder por aqui. No entanto, se nos enredos dos filmes e dos dramas da vida real é muito mais comum a presença de bandidos comuns (à exceção do ocasional nazista), se depender do presidente Lula o Brasil se tornará porto seguro para uma categoria muito mais nefasta de criminosos.

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O ditador e carniceiro Nicolás Maduro, acusado de narcoterrorismo nos Estados Unidos e investigado pelo Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade – embora em nenhum dos casos haja mandados de prisão contra ele –, chegou a desistir de uma viagem à Argentina em janeiro, mas sabe que pode vir tranquilamente ao Brasil. Foi o que fez em maio, com direito a tapete vermelho e honras militares, e teria repetido a dose em agosto, deixando de ir à Cúpula da Amazônia, em Belém, apenas por causa de um problema médico. Mas Lula quer dar abrigo a peixes ainda maiores.

Lula quer transformar o Brasil em paraíso para os camaradas ideológicos, que aqui serão aceitos, acolhidos, afagados, protegidos. Seja lá quais forem as atrocidades que tenham cometido, Lula se encarregará de transformar tudo em “narrativa” e “perseguição”

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Ao contrário de Maduro, o autocrata russo Vladimir Putin tem contra si uma ordem de prisão expedida pelo TPI, por crimes de guerra. Isso não impediu Lula de, em entrevista concedida na Índia, onde esteve para a reunião do G20, garantir que nada aconteceria ao russo caso ele viesse ao Brasil. “Ele será convidado, porque no ano que vem terá o Brics na Rússia, antes do G20 no Brasil. E eu vou. (...) No Brasil a gente gosta de música, de carnaval, de futebol, mas a gente gosta de paz e gosta de tratar as pessoas bem. Então, eu acho que o Putin pode vir tranquilamente para o Brasil. Eu posso dizer que, se eu for presidente do Brasil, não há por que ele ser preso”, afirmou – Putin, aliás, não foi à Índia, como também já havia evitado a cúpula dos Brics na África do Sul.

Diante da óbvia repercussão negativa da fala, Lula poderia simplesmente ter admitido o erro, mas quis dobrar a aposta. Após dizer que “isso [uma eventual prisão de Putin] quem decide é a Justiça, não é o governo nem o parlamento”, Lula emendou um “eu nem sabia da existência desse tribunal”. Se fosse verdade, já seria suficientemente desastroso, ao evidenciar a ignorância de Lula sobre uma das cortes mais importantes do planeta, e que está nominalmente mencionada no artigo 5.º da Constituição Federal. Mas, como costuma ocorrer quando se trata de Lula, era mentira. Lula mencionou o TPI em seu primeiro discurso como presidente eleito, ainda em 2002; no ano seguinte, indicou uma juíza para a corte (Sylvia Steiner, que puxou a orelha de Lula em artigo na Folha de S.Paulo); e, para que ninguém alegue que esses dois episódios já estão distantes no tempo, em abril deste ano Lula afirmou que “um dia [Jair] Bolsonaro será julgado em tribunal internacional pela atuação na pandemia” – embora não tenha citado o TPI pelo nome, certamente se referia a ele, já que este é o único “tribunal internacional” que poderia julgar o ex-presidente.

A promessa de proteção não foi o único afago feito por Lula a Putin durante a viagem à Índia. Em outra entrevista, o petista afirmou que “todo mundo está pegando consciência que essa guerra [na Ucrânia] está cansado a humanidade, já está cansando as pessoas, muito mais os refugiados ucranianos e russos e pessoas que a gente não vai conseguir trazer de volta”. Reduzir tudo a uma questão de “cansaço” é conveniente para Putin, porque lhe tira uma responsabilidade que é unicamente sua, e conveniente para Lula, que gostaria de ver as suas pautas sendo discutidas nos fóruns internacionais. As “pessoas que a gente não vai conseguir trazer de volta”, no caso, são os estimados 200 mil mortos, incluindo 10 mil civis ucranianos; os refugiados estão na casa dos milhões.

Lula está apenas repetindo em maior escala o que já fizera em outras épocas, como quando, no último dia de seu segundo mandato, negou a extradição do terrorista italiano Cesare Battisti: transformar o Brasil em paraíso para os camaradas ideológicos, que aqui serão aceitos, acolhidos, afagados, protegidos. Seja lá quais forem as atrocidades que tenham cometido, Lula se encarregará de transformar tudo em “narrativa” e “perseguição”. O que realmente “cansa a humanidade” é perceber que ditadores genocidas e criminosos de guerra, em vez de serem devidamente ostracizados pela comunidade internacional, ainda tenham quem queira defendê-los e protegê-los para que jamais possam pagar por seus atos.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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