Pela primeira vez, o ex-presidente Lula prestou depoimento na qualidade de réu em processos resultantes da Operação Lava Jato. Em Brasília, ele falou ao juiz Ricardo Soares Leite, da 10.ª Vara Federal, onde é acusado de obstruir a Justiça ao tentar comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, de acordo com a delação premiada do ex-senador Delcídio do Amaral. Essa trama levou à prisão em flagrante de Delcídio, em novembro de 2015, quando ele ainda exercia seu mandato. Apesar de sua condição de réu, Lula não perdeu duas de suas principais características: o vitimismo e a arrogância.
Lula disse, por exemplo, que estava esperando pela oportunidade de se defender perante um “juiz imparcial”. Nem é preciso raciocinar muito para saber que o ex-presidente estava lançando uma indireta contra Sergio Moro, que ouvirá Lula em Curitiba no dia 3 de maio, ocasião em que a esquerda pretende juntar 50 mil pessoas, como se isso fosse capaz de blindar o ex-presidente. Aliás, na semana passada Lula sofreu uma derrota quando sua queixa-crime contra Moro por abuso de autoridade foi rejeitada por unanimidade no Tribunal Regional Federal da 4.º Região – por causa da condução coercitiva de março de 2016 e da divulgação do conteúdo de suas interceptações telefônicas, Lula pedia que Moro fosse multado, perdesse o cargo, fosse preso por até seis meses e impedido de exercer função pública por até três anos.
Também não faltaram críticas aos procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato
Também não faltaram críticas aos procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato. Lula disse ter se cansado “de ver autoridades dizendo que ‘não têm provas, têm convicções’”, mostrando que não tem o menor escrúpulo de usar uma expressão inventada deliberadamente pela blogosfera esquerdista para desmoralizar a força-tarefa quando da apresentação da denúncia contra Lula, em setembro de 2016. A essa altura, usar a frase quando sua inexistência já está comprovada há muito tempo demonstra a intenção clara de confundir, pondo-se no papel de vítima colocada na parede por uma perseguição de cunho político – ou, para usar as palavras do próprio Lula, de um “massacre” que já duraria três anos.
Mas o tom vitimista deu lugar à autopromoção em outros momentos – típico, quando se trata de quem se julga inatacável, acima da lei, “a alma mais honesta deste país”, o melhor presidente brasileiro da história. “Vou matar eles [os opositores] de raiva, porque em todas as pesquisas vou aparecer na frente”, bravateou diante do juiz Leite, em mais uma insinuação de que planeja uma candidatura presidencial em 2018. Mais cômica (e, por que não dizer, megalomaníaca) foi a menção ao uso do nome de Lula por pessoas próximas ao ex-presidente: “Se o senhor soubesse quanta gente usa o meu nome em vão. De vez em quando, eu fico pensando para as pessoas lerem a Bíblia para não usar tanto o meu nome em vão”. Para quem já se comparou a Jesus Cristo, considerar que um texto sagrado proíba o uso “em vão” do seu nome é um salto até fácil de dar.
Nada disso, obviamente, indica a culpa de Lula nem neste, nem nos outros quatro processos a que responde em Brasília ou em Curitiba – isso será determinado pelo conjunto probatório que a acusação conseguir levantar, até porque delações premiadas não são suficientes para conseguir uma condenação. Mas o comportamento revela o caráter de alguém que iludiu, e continua iludindo, milhões de brasileiros com a lenda do “trabalhador que chegou à Presidência e fez o melhor governo da história” enquanto depredava as instituições democráticas – que para Lula deveriam servir a ele e ao PT, e não ao povo brasileiro – e, no fim de seu mandato, lançou as sementes da Nova Matriz Econômica que jogou o país na atual crise.