O quase candidato petista à Presidência da República, Fernando Haddad, resolveu se desviar um pouco – apenas um pouco – da ortodoxia de seu partido quando se trata de regimes ditatoriais como os da Venezuela ou da Nicarágua. Durante entrevista organizada por um bloco de carnaval paulistano, Haddad disse que nenhum deles pode ser caracterizado como uma democracia, mas poupou os ditadores Nicolás Maduro e Daniel Ortega, invocando um “conflito aberto” em que “a sociedade não está conseguindo, por meios institucionais, chegar a um denominador comum”.
Ora, se “a sociedade”, nesses dois países, não consegue gozar das liberdades democráticas e precisa ir às ruas protestar contra seus mandatários, é justamente porque eles já ultrapassaram todos os limites possíveis e imagináveis, submetendo os poderes Legislativo e Judiciário, amordaçando a imprensa, destruindo a iniciativa privada e, por fim, colocando as forças de segurança, oficiais e paramilitares, contra os próprios cidadãos. E fizeram tudo isso com o entusiasmado apoio do partido de Haddad, cuja presidente, Gleisi Hoffmann, já fez defesas enfáticas dos regimes de terror implantados por Hugo Chávez, Maduro e Ortega.
Os verdadeiros presos políticos estão nas cadeias mantidas pelas ditaduras de esquerda
Outra característica desses regimes é o encarceramento de oposicionistas sem o devido processo legal. Enquanto o petismo chama Lula e outros “guerreiros do povo brasileiro” de “presos políticos”, os verdadeiros presos políticos estão nas cadeias mantidas pelas ditaduras de esquerda – o próprio Lula, em 2010, chegou a fazer pouco caso de alguns deles, cubanos em greve de fome. Tudo indica que o deputado federal venezuelano Juan Requesens é a mais nova vítima da arbitrariedade bolivariana. Preso no dia 7 por 14 agentes do Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin), Requesens foi privado do contato com a família e o advogado, até que apareceram dois vídeos. Num deles, o deputado aparecia em condições absolutamente degradantes. No outro, ele “confessava” sua participação em um suspeitíssimo “atentado” contra Maduro, ocorrido em 4 de agosto.
De acordo com o vídeo, Requesens diz ter sido procurado por Julio Borges, ex-presidente da Assembleia Nacional atualmente exilado na Colômbia, para ajudar uma terceira pessoa, Juan Monasterio, a sair da Venezuela, rumo ao país vizinho. Monasterio, militar reformado, não chegou a fugir: foi preso pouco após o suposto ataque, e também teria “confessado” sua participação no ato. Em um terceiro vídeo, Requesens apontou mais uma pessoa como responsável pelo “atentado”. Apenas cinco dias depois de ter sido levado, o deputado pôde conversar com a família, por telefone. Quando, enfim, conseguiu falar com o advogado, Requesens disse não se lembrar de nada relativo aos vídeos em que teria confessado participação na suposta conspiração contra Maduro, de acordo com uma deputada oposicionista. Processado por tentativa de homicídio, traição e vários outros crimes, Requesens será mantido em prisão preventiva em uma instalação do Sebin.
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As próprias circunstâncias do que aconteceu no dia 4 levantam inúmeras suspeitas sobre se realmente houve alguma tentativa contra a vida do ditador. Só seus aliados parecem crer nessa possibilidade; para quase toda a comunidade internacional, há muito mais controvérsia em torno das explosões, que teriam ferido sete militares enquanto Maduro discursava. Não se descarta que elas tenham sido acidentais ou mesmo parte de uma estratégia usada pelos próprios chavistas para endurecer ainda mais o regime. Não se pode esquecer que, após um suposto golpe de Estado em 2016 sobre o qual ainda pairam suspeitas, o turco Recep Tayyip Erdogan promoveu um enorme expurgo. Militares, professores e juízes “golpistas” foram demitidos ou presos logo após o fim dos embates, fazendo pensar que a relação de adversários já estaria pronta de antemão, até porque a rapidez da repressão mostrou que não havia tempo hábil para apurar a participação de todos eles no suposto golpe. Na Venezuela, os indiciados já passam de 30, incluindo um general da Guarda Nacional Bolivariana.
Um “atentado” mal explicado, usado para intensificar a perseguição a opositores, mostra que o bolivarianismo venezuelano está disposto a ir até onde for possível para se agarrar ao poder, enquanto continua a sacrificar seu próprio povo no altar do “socialismo do século 21”.
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