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Editorial

Maluf e a persistência do “rouba, mas faz”

 | Leonardo Prado/Câmara dos Deputados
(Foto: Leonardo Prado/Câmara dos Deputados)

A Mesa Diretora da Câmara dos Deputados decidiu, nesta quarta-feira, atender a uma determinação do Supremo Tribunal Federal e  cassar o mandato do deputado Paulo Maluf (PP-SP), que já se encontrava preso desde dezembro de 2017, tendo passado para a prisão domiciliar em março deste ano. A cassação em si ainda pode dar início a uma controvérsia jurídica, já que a defesa de Maluf e o próprio corregedor da Câmara, Evandro Gussi (PV-SP), consideram que a perda do mandato deveria ter ocorrido por decisão do plenário, e acusam o STF de interferência no Poder Legislativo, a exemplo do que já havia acontecido no caso dos senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Aécio Neves (PSDB-MG).

Mas não é nosso objetivo, neste momento, tratar das questões que envolvem a aplicação do artigo 55, incisos III e VI, da Constituição, e sim refletir sobre o significado do ocaso de Paulo Maluf, deputado por vários mandatos, prefeito de São Paulo por duas vezes e governador do estado entre 1979 e 1982. Afinal, Maluf encarnou como poucos a mística do “rouba, mas faz”, criada nos anos 50 pelos defensores do também prefeito e governador paulista Adhemar de Barros. Trata-se daquele político cujos atos de corrupção, ainda que conhecidos de todos, podem ser tolerados porque, no fim das contas, ele entrega algo de concreto para a população.

Os “bons tempos de Lula” não passavam de ilusão criada para legitimar as outras práticas do partido

Maluf cai, mas a herança do “rouba, mas faz” persiste – agora encarnada em um certo ex-presidente da República que, apesar de cumprir pena por corrupção e lavagem de dinheiro, lidera pesquisas de opinião que apuram as intenções de voto para a Presidência da República. É verdade que os cenários apresentados pelas pesquisas são irreais, pois Lula é um ficha-suja e, se a lei valer para todos, não estará nas urnas em outubro. Mas não há como ignorar que ele ainda tenha a preferência de um terço dos entrevistados. 

Os sucessivos escândalos que ocuparam as manchetes dos jornais como nunca antes neste país, desde que estourou a denúncia do mensalão, abriram os olhos de muitos brasileiros para os males da corrupção. O cidadão finalmente percebeu que toda a nação perde quando o dinheiro do contribuinte não volta para a população, sumindo no ralo das negociatas, mas este trabalho de conscientização ainda não está completo, como mostram os dados das pesquisas. Afinal, a maioria dos 30% a 40% de pessoas que declaram intenção de voto em Lula não é de militantes que enxergam os crimes cometidos em nome do partido como motivo para alçar um condenado à categoria de “guerreiro do povo brasileiro”, mas de pessoas comuns, para as quais o fato de alguém ser um corrupto não o torna indigno do voto.

Se já é inconcebível que a mentalidade do “rouba, mas faz” resista entre parte não desprezível dos brasileiros, mais absurdo ainda é que um partido tenha feito deste jargão sua razão de viver. O PT assaltou o Estado brasileiro com uma voracidade sem precedentes não apenas para que seus chefões tivessem uma vida boa, mas principalmente para que o projeto de poder do partido fosse bem-sucedido. Enquanto roubava, o PT “fazia”, aproveitando-se de um trabalho de estabilização realizado por seus predecessores e de circunstâncias externas favoráveis para promover um “espetáculo do crescimento” que ficou na memória de quem julga que “nos tempos do Lula o país estava bem”. Mas exatamente naquela época era criada a política econômica – essa, sim, autenticamente petista – que nos levaria à pior crise da história do país, mostrando que os “bons tempos” não passavam de ilusão criada para legitimar as outras práticas do partido.

Em uma democracia, as divergências ideológicas são normais e não só admitidas, mas estimuladas: o país só ganha com o debate honesto entre diferentes convicções sobre a função do Estado, sobre as melhores políticas a seguir para conseguir o desenvolvimento econômico, combater a criminalidade, respeitar direitos das minorias, para ficar apenas em alguns exemplos de temas caros ao país. Onde todos precisam se unir, independentemente de posição ideológica, é na rejeição à corrupção. A tolerância com ilícitos graves – ou, pior ainda, a sua defesa – é uma anormalidade que o brasileiro não pode aceitar, venha da direita, da esquerda ou do centro.

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