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O senador Ivo Cassol (PP-RO) tem uma opinião que destoa do que pensa o povo brasileiro e do mais comezinho bom senso. Segundo ele, "os políticos ganham pouco". Essa explicação fez parte das justificativas públicas, registradas pela imprensa nacional, que usou para bloquear temporariamente a tramitação de um projeto de decreto legislativo proposto pela senadora paranaense licenciada Gleisi Hoffmann (PT) – atual ministra-chefe da Casa Civil – para abolir o pagamento dos 14.º e 15.º salários que o Senado Federal paga aos seus membros a cada fim de ano. Cassol pediu vistas do projeto quando se encontrava em processo de votação na Comissão de Assuntos Econômicos.

A manobra do senador de Rondônia, embora regimental, certamente corresponde ao desejo da maioria dos seus colegas de resistir à abolição do inconcebível e injustificável privilégio com que contam. Trata-se de um daqueles "penduricalhos" que servem para engordar os subsídios dos parlamentares e de altos representantes de outros poderes, incluindo o Judiciário, notoriamente contrários ao princípio da moralidade que deve reger as relações dos agentes públicos com as instituições republicanas a que servem.

No Judiciário, de fato, repetem-se benesses semelhantes e que não estão ao alcance do trabalhador comum brasileiro. Os magistrados gozam, por exemplo, de dois meses de férias por ano, recebendo a cada vez bonificação equivalente a 50% do valor do vencimento, ao passo que entre os assalariados da iniciativa privada tal bônus é de apenas um terço. Instituíram-se também bolsas e auxílios – como para compra de livros ou para abastecer os gabinetes de frutas frescas – que, no fundo, servem para mascarar adicionais aos tetos legais de remuneração do funcionalismo público.

Além de ser uma prática tradicional no Congresso, pois também os deputados federais dele se beneficiam, o pagamento de dois salários extras é comum ainda em muitas assembleias legislativas estaduais, cada qual emprestando à mesma benesse diferentes nomes. No Legislativo paulista, por exemplo, dá-se a denominação de "auxílio-paletó". Em vários casos, iniciativas judiciais já aboliram o benefício, mas em outros coube às próprias direções acabar com o privilégio.

Destaque-se, neste sentido, o caso do Paraná. Sem prévio aviso e às vésperas da liberação dos pagamentos, em dezembro passado, a Mesa Executiva da Assembleia baixou ato revogando os dispositivos internos que garantiam o 14.º e o 15.º salários aos deputados estaduais, sob a esdrúxula justificativa de que se tratava de verbas referentes ao fim de um período legislativo e início de outro – como se tais eventos pudessem encontrar qualquer justificativa lógica para merecer remuneração. Claro, assim como tantas outras medidas moralizadoras adotadas pela atual gestão do Legislativo estadual, também esta causou reações de revolta entre os parlamentares.

É lastimável constatar a – para usar uma palavra suave – desfaçatez com que a classe política e os agentes públicos em geral, de todos os níveis e nas várias esferas, defendem privilégios que agridem a opinião pública, humilham a massa trabalhadora e desrespeitam a vontade popular, da qual, teoricamente, seriam representantes. A generalizada existência de benesses do gênero e a resistência dos seus beneficiários para que sejam mantidas agregam-se aos muitos motivos de decepção e de descrença que o povo brasileiro devota às instituições.

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