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editorial

Massacre em Orlando

No maior ataque realizado com armas de fogo na história dos Estados Unidos, um atirador invadiu a casa noturna Pulse, tradicional reduto do público LGBT em Orlando, polo do turismo no país, e matou cerca de 50 pessoas, deixando outras dezenas de feridos. Segundo as autoridades, o atirador telefonou para o 911, o número de emergências nos EUA, e jurou fidelidade ao Estado Islâmico. O grupo, por meio de sua emissora oficial de rádio, reivindicou o atentado.

Compreender o ataque de Omar Mateen exige superar a retórica polarizada tanto da direita quanto da esquerda. O discurso xenófobo de Donald Trump, o provável candidato republicano à Casa Branca, não teria funcionado no caso de Mateen, que era cidadão norte-americano. Mas também nos parece exagerado culpar esse mesmo discurso pelo massacre, bem como demonstram certa insensatez aqueles que, ao comentar o episódio, levam o foco da discussão para a possibilidade de Trump se beneficiar eleitoralmente com as mortes, como se o maior problema do terrorismo não fosse as vidas que tira, mas o impulso que dá a este ou aquele político ou partido.

Já há muito tempo o Estado Islâmico executa homossexuais nas áreas ocupadas pelo grupo

Por outro lado, a plataforma desarmamentista, cara aos democratas e invocada toda vez que ocorrem mortes causadas por atiradores, teria pouco efeito sobre o que aconteceu em Orlando, pois Mateen trabalhava como segurança, o que lhe garantia acesso fácil ao armamento. A Gazeta do Povo, em ocasiões anteriores, já ressaltou a insensatez de permitir ao cidadão comum o acesso a armas pesadas, como ocorre nos Estados Unidos, mas é difícil imaginar se, neste caso, leis mais restritivas teriam impedido os ataques, já que alguém realmente disposto a causar um massacre como o de Orlando não se sente amarrado por legislação nenhuma e buscaria o equipamento de forma legal ou ilegal. “Você não pode legislar sobre um curto-circuito na cabeça de alguém”, disse em 2010 o primeiro-ministro britânico, David Cameron, após um episódio que deixou 12 mortos em seu país. Mesmo assim, seria salutar a aprovação de um projeto de lei que impede suspeitos de terrorismo identificados como tais pelo FBI de comprar armas. A proposta foi apresentada por um republicano, mas não avança por oposição de vários colegas de partido ligados ao lobby das armas.

O fato é que o ataque de Orlando pode ser ligado diretamente a uma vertente fundamentalista do islamismo que enxerga os homossexuais como indignos de viver. Já há muito tempo o Estado Islâmico os executa – principalmente atirando-os do alto de edifícios – nas áreas ocupadas pelo grupo. Em abril, o xeque britânico Farrokh Sekaleshfar esteve na Flórida para uma palestra sobre “como lidar com o fenômeno da homossexualidade” (não se sabe se Mateen esteve presente). Em ocasiões anteriores, Sekaleshfar já havia defendido abertamente a morte de homossexuais como um “ato de compaixão” para com eles – após o ataque em Orlando, o líder religioso criticou Mateen e tentou se defender com o ainda inacreditável esclarecimento de que suas observações só se aplicavam a locais onde vigora a lei islâmica e sob circunstâncias muito específicas.

Esta mentalidade apresenta um desafio aos defensores do multiculturalismo, para quem as diferenças de comportamento entre diversas culturas não podem ser moralmente avaliadas, sendo todas elas igualmente dignas de respeito. A diversidade cultural é bem-vinda e enriquece uma comunidade, mas não pode ser absolutizada a ponto de conceder cidadania inclusive a manifestações que pregam a violência e o extermínio de quem é visto como diferente, em oposição não apenas às legislações locais, mas também às mínimas noções de humanidade.

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