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O Brasil, que acaba de instalar simbolicamente o Parlamento do Mercosul, tem obrigações para com o povo da Bolívia, como dirigente temporário do bloco, de mediar negociações entre os grupos em confronto naquele país associado sul-americano, para evitar um choque cruento que traria mais instabilidade para o coração do continente. Agindo desse modo, a diplomacia brasileira poderá repetir o êxito de sua atuação no conflito do Sudão, onde a ONU vai apoiar a pacificação entre facções rivais na área de Darfur.

No caso daquele país africano, alguns líderes ocidentais queriam de antemão condenar o governo de Cartum como responsável pelo clima de guerra civil entre a minoria branca e a maioria negra de Darfur. Mas, ao se alinhar com o bloco de nações da África e outros países que recomendavam moderação, o Brasil conseguiu transformar a moção condenatória em uma resolução para enviar força de observadores internacionais ao teatro da crise – da qual fará parte um militar oriundo do Paraná.

Embora menos sangrenta, a Bolívia atravessa divisão semelhante, com os partidos ligados ao presidente Evo Morales tentando impor sua vontade na assembléia constituinte, para uma "refundação" radical do país nos moldes da Venezuela de Hugo Chávez. Ocorre que os governistas obtiveram apenas maioria simples naquele conclave constituinte, que foi convocado sob a regra de aprovação de matérias fundamentais por dois terços dos membros.

Agora, após a eleição, os situacionistas, representando grupos indígenas das regiões andinas alinhados com o presidente Morales, querem impor a regra de aprovação da Constituição por maioria simples, o que implicaria retirar autonomia das províncias situadas na fronteira com o Brasil, mais ricas e populosas por disporem de jazidas de petróleo e gás, agropecuária desenvolvida e assim por diante. Contra a mudança unilateral os departamentos do leste boliviano se insurgiram, levantando protestos agravados pela inexperiência dos novos líderes do governo de La Paz.

Ocorre que a cláusula democrática da Organização dos Estados Americanos e do Mercosul prescreve que "governos eleitos democraticamente devem governar de forma democrática", porque nas democracias o voto é indispensável, mas não é tudo. "Para garantir a um governo o rótulo de democrata – conceitua a colunista Míriam Leitão – é preciso independência dos poderes, liberdade de imprensa, oposição atenta e funcionamento regular das instituições". Mais, o pluralismo implica a possibilidade de alternância dos partidos no poder e, ainda, a tolerância ao "contrapoder" da oposição", na visão do jurista brasileiro Fábio Comparato.

Ausentes tais requisitos no caso boliviano, é hora de os líderes democráticos do continente atuarem para instar as partes em conflito a retomarem negociações capazes de evitar uma guerra civil ou a subjugação dos demais pelos grupos no poder – uma reconstrução lenta mas necessária da estabilidade no conturbado país vizinho.

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