O Mais Médicos ganhou um substituto. Por meio de medida provisória, o presidente Jair Bolsonaro criou outra iniciativa, denominada Médicos pelo Brasil, que elimina alguns dos vícios mais daninhos do programa lançado por Dilma Rousseff enquanto contempla algumas demandas antigas da classe médica, como a criação da carreira de médico de Estado.
É inegável que há um sério problema de interiorização da classe médica, a ponto de mesmo bons salários oferecidos por algumas prefeituras não serem suficientes para atrair profissionais, já que eles levam em conta vários outros fatores, como a estrutura de trabalho. O Mais Médicos, criado por Dilma Rousseff em 2013 como uma reação convenientemente rápida aos protestos de rua daquele ano, parecia ser uma resposta bem-intencionada a essa demanda – mas apenas parecia, já que a realidade era muito mais sombria.
Desde o início do programa petista, as circunstâncias que envolviam a presença massiva de médicos cubanos permitia intuir que havia algo de errado. Para início de conversa, as condições estabelecidas para esses profissionais, diferentes daquelas aplicadas aos brasileiros e a estrangeiros vindos de outros países, já violavam a legislação trabalhista nacional. Enquanto todos os demais recebiam o valor integral de R$ 10 mil, os cubanos recebiam apenas uma pequena parcela deste valor, enquanto a maior parte era remetida diretamente ao governo cubano por meio de uma triangulação com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). O Planalto alegava que essa via torta de remuneração era lícita por se tratar de uma bolsa, e não de um vínculo empregatício formal. Incrivelmente, esse tipo de argumento foi aceito pelo Supremo Tribunal Federal, que em 2017 decidiu pela legalidade do esquema acertado com a Opas, estabelecendo, na prática, uma discriminação profissional que continuou mesmo na gestão de Michel Temer, sucessor de Dilma após o impeachment da petista.
O Mais Médicos não passava de uma forma de financiar a ditadura cubana
Mas foi a divulgação do conteúdo de telegramas da embaixada brasileira em Cuba, no fim de 2018, que escancarou a verdadeira natureza do Mais Médicos: ele não passava de uma forma de financiar a ditadura cubana, a verdadeira mentora do programa. O Brasil aceitou praticamente todas as exigências feitas por Havana, permitindo a vinda de outros estrangeiros apenas como maneira de disfarçar o que estava sendo acertado entre os dois países. Prova de que a saúde dos brasileiros de áreas pobres estava longe de ser a prioridade dos ditadores caribenhos foi o fato de Cuba chamar de volta 8,5 mil médicos assim que Bolsonaro, ainda na qualidade de presidente eleito, prometeu mudar o acerto, pagando integralmente os cubanos que trabalhavam no Brasil em vez de recorrer à triangulação que enchia os cofres do Partido Comunista. Só isso já era justificativa mais que suficiente para Bolsonaro dar por encerrado o Mais Médicos, sem precisar recorrer a alegações fantasiosas, como a de que os cubanos estariam no Brasil para estabelecer núcleos de guerrilha.
O novo programa terá 18 mil vagas, das quais 13 mil estarão disponíveis em locais onde a falta de profissionais é mais dramática. Além disso, 55% dos médicos irão para as regiões Norte e Nordeste. Os salários serão maiores que o do Mais Médicos, incluindo gratificações para os que trabalharem em locais como zonas rurais e áreas ribeirinhas, com a contratação, via CLT, dos médicos aprovados no curso de especialização que terão de fazer assim que ingressarem no Médicos pelo Brasil.
Quanto aos cubanos que permaneceram no Brasil – cerca de 1,8 mil médicos tiveram a coragem de desobedecer a ordem de Havana e não voltaram à ilha-prisão –, o governo resolveu a questão migratória ao permitir que eles peçam à Polícia Federal uma autorização de residência, o passo principal para que essas pessoas tenham uma vida livre no Brasil. Mas esses profissionais só poderão exercer a medicina se forem aprovados no Revalida, o exame exigido de qualquer médico diplomado no exterior. Neste sentido, também é bem-vinda a intenção do governo de fixar uma frequência semestral para o teste, que hoje não tem periodicidade definida – o último Revalida teve inscrições em 2017 e realizou sua segunda etapa no fim do ano passado.
As vantagens do Médicos pelo Brasil em relação ao Mais Médicos são evidentes; e há um interesse por parte dos profissionais – o edital de emergência publicado no fim de 2018 para compensar a saída dos cubanos preencheu teve todas as vagas preenchidas, ainda que ao longo deste ano 1,3 mil médicos tenham deixado o programa. Com as novas condições oferecidas pela nova iniciativa, a expectativa é de que a procura aumente e as desistências diminuam, finalmente garantindo aos mais vulneráveis a atenção médica digna que todo brasileiro merece.