Vitorioso no episódio que terminou com a absolvição do senador Renan Calheiros pelo Senado, o governo agora tem pressa em obter outra conquista no Congresso: a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). A oposição garante que vai se mobilizar para obstruir a aprovação, em retaliação ao esforço do governo para evitar a cassação de Calheiros. Mas, como se pôde comprovar em episódios recentes, há enorme distância entre o que os congressistas dizem e as decisões que tomam no Parlamento. Prova disso é que a proposta de manutenção da CPMF até dezembro de 2011 conseguiu, na madrugada de ontem, uma primeira vitória: o aval da Comissão Especial da Câmara dos Deputados. Na votação plenária, tanto na Câmara quanto no Senado, os resultados não devem ser diferentes: além dos governistas, oposicionistas que almejam conquistar o poder nas eleições de 2010 também advogam em prol do "imposto do cheque".
O fato subjacente é que o Brasil precisa fazer correções para superar os obstáculos à frente: o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) foi discreto e a turbulência financeira iniciada nos Estados Unidos se espalha, levando a economia global à desaceleração.
A correção de rumo mais óbvia e mais esperada pela sociedade seria o enxugamento da máquina pública. Em vez disso, o governo anunciou a contratação de mais de 50 mil servidores, agindo em direção oposta ao que faria qualquer administrador de bom senso diante da escassez de recursos. Não é por outra razão que os brasileiros precisam, em média, trabalhar quase 5 meses por ano para recolher tributos à União, aos estados e aos municípios. Com uma carga tributária tão pesada, seria razoável que o cidadão pudesse esperar, como contrapartida, serviços de qualidade nas áreas de saúde, educação, segurança e previdência. Em vez disso, a classe média precisa trabalhar outros 4 meses do ano para pagar serviços privados nesses setores, segundo estudo divulgado esta semana pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário. Para comparação, o montante anual a ser arrecadado apenas com a CPMF R$ 38 bilhões é da mesma ordem que o total de verbas públicas do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), significando que o governo federal dá com uma das mãos o que tira com a outra.
A propósito, embora continue em expansão, nossa economia perde impulso a cada trimestre, abalando o resultado aparentemente vistoso de 5,4% de elevação do PIB em relação ao mesmo período de 2006. Tanto que, salvo a contribuição da indústria, a maior parcela derivou do consumo das famílias e da arrecadação de tributos, enquanto a agropecuária ficou estagnada desde o começo do ano. O aspecto mais crítico foi a elevação da receita de tributos, que subiu 8,6%.
O quadro geral aponta para a urgência do enxugamento dos gastos públicos e para a realização de uma reforma tributária ampla. Reduzir a discussão tributária à permanência ou não da CPMF é um erro pelo qual pagarão não aqueles que o cometem, mas os contribuintes.