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Editorial

Combustíveis, intervencionismo e uma troca de ministro

O ex-ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, afirmou que sua saída da pasta foi consensual e de caráter pessoal. (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil.)

A cada aumento, rola uma cabeça. Assim tem sido no passado recente quando o assunto são os reajustes de combustíveis promovidos pela Petrobras em respeito à sua política de preços. A bola da vez foi uma elevação de quase 9% no preço do diesel praticado nas refinarias. Como seria mais complicado remover mais um presidente da Petrobras poucos dias depois de ele ter sido entronizado no cargo, sobrou para o ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, cuja exoneração foi publicada no Diário Oficial desta quarta-feira. Ainda que, na versão oficial, a saída tenha ocorrido de forma consensual, a pedido do próprio Albuquerque, é difícil não associá-la às críticas feitas por Jair Bolsonaro ao ministro e a José Mauro Coelho, presidente da Petrobras, em sua live de quinta-feira, 5 de maio. Na ocasião, o presidente da República afirmou que a dupla não podia “quebrar o Brasil”.

Na transmissão ao vivo feita pelas mídias sociais, Bolsonaro foi ainda mais incisivo ao chamar de “estupro” e “absurdo” o lucro da Petrobras, que foi de R$ 44,5 bilhões no primeiro trimestre deste ano, e de R$ 106,6 bilhões em 2021, um recorde para a companhia. Se de fato “o presidente já entendeu muito bem a questão de preço de mercado”, como afirmou Coelho em entrevista recente ao jornal O Estado de S.Paulo, é preciso se perguntar qual a razão das falas de Bolsonaro e das trocas no comando da estatal petrolífera, pois elas contradizem a ideia de que o presidente da República teria compreendido a necessidade da manutenção da atual política de preços.

Ao pretender que sejam os outros a interferir, demitindo quem se recusa a fazê-lo, Bolsonaro realiza, sim, uma intervenção, ainda que indireta

Há uma insatisfação generalizada do brasileiro com os preços dos combustíveis, e o apoio a uma redução na marra do valor cobrado nas bombas dos postos é grande. Uma pesquisa recente do PoderData mostra que uma intervenção na Petrobras teria o apoio de dois terços dos brasileiros. O populismo de esquerda se aproveita disso para prometer exatamente a canetada salvadora no discurso dos pré-candidatos ao Planalto. Lula já falou em “abrasileirar” o preço dos combustíveis e do gás; Ciro Gomes já chamou a política de Preço de Paridade Internacional (PPI) de “safada” e prometeu derrubá-la no primeiro dia de mandato, se for eleito. São discursos tão sedutores quanto irresponsáveis.

O passado recentíssimo mostra o estrago que uma política intervencionista causou à Petrobras. A estatal represou preços no fim do primeiro mandato de Dilma Rousseff, para que aumentos dos combustíveis não elevassem ainda mais uma inflação que já vinha escapando do controle e atrapalhassem sua campanha de reeleição. Como resultado, a Petrobras quase foi à lona, tornando-se a empresa petrolífera mais endividada do mundo. E, quando a estatal já não conseguiu mais segurar os preços, os combustíveis dispararam. Quem, em sã consciência, acreditaria que repetir a receita agora daria um resultado diferente daquele de 2014 e 2015? Para piorar, uma intervenção neste momento não apenas prejudicaria a própria Petrobras, mas também causaria risco de desabastecimento ao quebrar os concorrentes privados, responsáveis por parte do fornecimento nacional de combustíveis. Mesmo assim, Lula e Ciro querem repetir o roteiro – e, a julgar pelas declarações de Bolsonaro, também o presidente mostra estar sucumbindo à tentação populista.

“Eu não posso intervir”, afirmou Bolsonaro na live de 5 de maio, e felizmente o presidente reconhece essa realidade, ao contrário de Dilma em 2014 e de seus adversários eleitorais em 2022. Mas, logo na sequência, ele pede a Albuquerque e a Coelho que, na prática, sejam eles os interventores, deixando de praticar a atual política de preços, e acusando-os de querer “quebrar o Brasil” fazendo a Petrobras “faturar às custas do povo brasileiro” caso mantenham a PPI. Quando o pedido não é atendido, alguém perde o cargo, como já havia ocorrido com Roberto Castello Branco e Joaquim Silva e Luna. Ora, pretender que sejam os outros a interferir, demitindo quem se recusa a fazê-lo, já é, sim, uma intervenção, ainda que indireta – menos mal que, até o momento, todas as substituições tenham resultado no proverbial “seis por meia dúzia”, pois todos os nomes que passaram pela cadeira até agora são defensores da manutenção da atual política de preços, rejeitando intervenções governamentais.

Mas o discurso segundo o qual os combustíveis custam caro porque pessoas como Coelho, Albuquerque, Castello Branco e Silva e Luna querem “quebrar o Brasil” está completamente longe da verdade. As razões dos grandes lucros da Petrobras, do alto preço da gasolina e do diesel, e da manutenção da PPI estão claras, ainda que sejam complexas e nem sempre de fácil explicação para a população. Em vez de buscar eximir-se de culpa colocando-a em uma suposta insensatez de sua equipe, Bolsonaro faria muito melhor se trabalhasse para esclarecer o brasileiro sobre como os preços dos combustíveis são definidos, lembrasse o eleitor das consequências catastróficas de uma política intervencionista, aplicasse os bilionários dividendos que receberá da Petrobras (e que só são possíveis com uma gestão profissional que traga lucro à companhia) em políticas que mitiguem o efeito do combustível caro, especialmente para os mais pobres, e trabalhasse ativamente para permitir mais competição no setor de petróleo e gás.

Pedir uma política de preços desvinculada da realidade do mercado e cortar cabeças quando não é atendido é apenas receita certa para queimar bons quadros em nome de uma ideia equivocada, condenando-os por fazer bem seu trabalho. Que não seja este o destino de Adolfo Sachsida, escolhido para substituir Bento Albuquerque à frente da pasta de Minas e Energia, já que também ele, por sua formação liberal, rejeita intervenções na Petrobras.

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