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Moody's deixou o Brasil a um degrau do selo de bom pagador.
Moody’s deixou o Brasil a um degrau do selo de bom pagador.| Foto: Marcelo Andrade/Arquivo/Gazeta do Povo

O mercado financeiro foi pego de surpresa na tarde de terça-feira, quando a Moody’s, uma das três principais agências de classificação de risco do mundo, elevou a nota brasileira de Ba2 para Ba1, mantendo a perspectiva positiva. Com isso, o Brasil fica a apenas um degrau de recuperar o “grau de investimento”, o selo de bom pagador que abre as portas de um país a muitas possibilidades em termos de atração de investimento estrangeiro. A perplexidade de economistas e outros analistas com a decisão não chegou a ser apaziguada pelos argumentos da Moody’s, cujo movimento não foi seguido pelas outras duas grandes agências: Fitch e Standard and Poor’s mantêm o Brasil dois degraus abaixo do grau de investimento, com perspectiva estável em sua nota – a Fitch, aliás, afirmou nesta sexta não ver motivos para mudar a nota brasileira, e a S&P fizera o mesmo na quinta-feira.

O movimento da Moody’s é difícil de compreender, segundo os analistas, porque os fundamentos invocados são bastante frágeis. É verdade que o Produto Interno Bruto vem crescendo acima das previsões, mas também é verdade que, a despeito da elevação recente da Formação Bruta de Capital Fixo (o investimento produtivo), ela ainda está muito abaixo do patamar necessário para sustentar um crescimento continuado; e, mais que o investimento, o que tem puxado mesmo o PIB é o consumo, do governo e das famílias, na repetição da estratégia que acabou levando o Brasil a perder o grau de investimento, no fim do governo de Dilma Rousseff. O que há, talvez, de mais verdadeiro na avaliação da Moody’s seja a referência às reformas que foram feitas enquanto o PT estava fora do poder, e às quais o partido se opôs (e continua se opondo) ferozmente: a reforma da Previdência, a reforma trabalhista e a autonomia do Banco Central.

O movimento da Moody’s é difícil de compreender, segundo os analistas, porque os fundamentos invocados são bastante frágeis

Teriam os analistas na agência caído no conto de fadas vendido por Lula e Fernando Haddad, que aproveitaram a Assembleia Geral da ONU para se reunir com as três agências? Esta é uma possibilidade. Afinal, quando a Moody’s fala em “credibilidade moderada” em referência ao arcabouço fiscal, aparentemente faz uma crítica, mas no fundo estamos quase diante de um elogio; não há como considerar minimamente crível, ou sólida, uma regra fiscal tão desmoralizada quanto a brasileira, tamanhos são os truques orçamentários feitos pelo governo para excluir despesas da conta oficial de modo a conseguir cumprir a medíocre meta de déficit zero.

E, quando a agência diz que “um crescimento robusto uma política fiscal com adesão consistente ao arcabouço fiscal permitirão que a carga da dívida se estabilize no médio prazo”, consegue juntar em uma única frase todas as ficções alardeadas pelo governo: nem o crescimento é robusto, nem o arcabouço é respeitado. O rombo segue crescendo e já supera os R$ 100 bilhões em 2024, apesar da arrecadação recorde. O Brasil, que já tem uma relação dívida/PIB bem alta para os padrões de um país latino-americano emergente, não estabilizará esse indicador tão cedo.

Há, ainda, uma outra possibilidade: a de que a elevação da nota brasileira seja, na verdade, uma “cenoura de burro”. Por esse raciocínio, os analistas da Moody’s até estariam cientes da situação fiscal deprimente do Brasil, mas deixar o país mais perto do sonhado grau de investimento seria um estímulo para que o governo finalmente passasse a agir com a responsabilidade fiscal necessária para atingir seu objetivo. Falando a jornalistas, o ministro Haddad manifestou essa ideia ao dizer que “se o governo como um todo compreender que vale a pena esse esforço (...) eu acredito realmente que nós temos a chance de completarmos mandato do presidente Lula reobtendo o grau de investimento”.

A hipótese, no entanto, soa mais inverossímil. Primeiro, porque elevar a nota de um país mesmo tendo ciência de não haver fundamentos para tal abalaria bastante a credibilidade da agência (embora aumentar a nota baseando-se em uma avaliação sincera, mas equivocada, seja igualmente daninho à reputação da Moody’s); segundo, porque nem mesmo Haddad está convencido da necessidade de cortes substanciais nas despesas, continuando a apostar na elevação da receita como chave para fechar as contas. Se aquele que parece ser o menos irresponsável entre os que ditam os rumos da política econômica age assim, quanto mais o seu chefe no Palácio do Planalto.

Erro sincero ou tentativa de puxar o Brasil para o rumo certo, pouco importa na verdade. A julgar pela trajetória atual do gasto público, é real o alerta de Márcio Holland, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda durante o governo Dilma, para quem Lula 3 segue o mesmo caminho de sua antecessora. E, assim, são enormes as chances de tornar-se realidade a previsão de Samuel Pessoa, pesquisador da FGV: “a Moody’s vai rebaixar o Brasil daqui a uns dois ou três anos”. Lula pode comemorar agora, mas, se achar que a decisão da Moody’s é um endosso ao que vem sendo feito, não haverá grau de investimento a festejar nem no curto, nem no médio prazo.

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