Foi preciso mudar para deixar tudo exatamente como estava. Essa é a impressão que ficou da reforma ministerial concluída pelo presidente Lula na semana passada. Várias cadeiras e canetas trocaram de donos, mas não há sinal de que as mudanças tenham vindo para dar mais dinamismo à ação governamental, muito menos que tenham significado avanços quanto à definição das prioridades nacionais e nem quanto ao modo de atuar sobre elas.

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Caso emblemático dessa situação encontra-se no Ministério do Trabalho e Emprego, que deixou de ser ocupado por um representante da classe trabalhadora para ser entregue a um dirigente partidário, decisão política justificada pelo projeto presidencial de distribuir agrados (leia-se cargos e verbas) para obter maioria no Congresso em nome de uma governabilidade que não honra o sentido mais nobre da palavra. Uma governabilidade que, no caso, não leva em conta um programa de governo, mas sim uma composição de contornos fisiológicos em redor de temas pontuais e geralmente descolados do interesse público.

Desse ponto de vista canhestro, pode-se entender governabilidade como apenas um mero conjunto de condições políticas (não técnicas e muito menos programáticas) capaz de garantir, por meio de uma feliz e bem comportada maioria parlamentar, que se evite, por exemplo, a aprovação de comissões parlamentares de inquérito politicamente incômodas.

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Mas voltemos ao caso do Ministério do Trabalho. Lá está Carlos Lupi, sucessor de Leonel Brizola na presidência do PDT – partido que esteve rompido com Lula durante praticamente todo o seu primeiro mandato por questões de fundo ideológico. Mas, ligeiro, logo após a eleição Lupi articulou a sigla para promover a reaproximação com o governo, nunca escondendo a evidente intenção de, em troca, conseguir para si mesmo um bom lugar no gabinete. Primeiramente, pretendia a poderosa pasta da Previdência, que lhe foi negada por Lula sob a justificativa de o PDT ser contrário à reforma do setor.

Foi então para o Trabalho. Na cerimônia de posse brindou a opinião pública com um discurso de clara rejeição a qualquer mudança na Consolidação do Trabalho (CLT) – um arcabouço jurídico cujos primórdios se encontram na era getulista, à época fortemente inspirado no facismo de Mussolini. Disse o ministro que não aceita, como "historicamente" sempre fez o seu partido, qualquer redução dos direitos dos trabalhadores. "Por que a discussão tem de ser sempre para retirar direitos dos trabalhadores", perguntou Lupi.

Há duas questões que emergem inevitavelmente desse pronunciamento. Uma, que ministro que se arvora a estabelecer uma definição que não pertine exclusivamente a ele. Outra, que manifesta uma opinião que já há muito não se coaduna com os novos tempos. Dá-se, então, em tão poucas definições de seu discurso, duas evidências da inadequação do novo titular em relação àquilo de que o Brasil – o que inclui obviamente os trabalhadores – precisa para libertar-se da rabeira do mundo em desenvolvimento.

De fato, a política trabalhista não se deve desgarrar do projeto nacional de desenvolvimento econômico e social. É parte desse projeto e, como tal, deve ser coerente com todas as demais políticas que levem ao alcance de tal objetivo. Portanto, não cabe ao ministro defini-la, mas à sociedade e ao governo como um todo. O ministério é órgão executor das políticas que o governo – e nele se inclui o Legislativo – define para a área respectiva.

Sabe-se, por outro lado, que a atual legislação trabalhista, ao contrário de proteger o trabalhador, é um dos mais importantes fatores que o mantêm à margem de qualquer proteção. O peso dos tributos e encargos que recaem sobre os salários simplesmente dobra o valor da folha de pessoal das empresas e, conseqüentemente, inibe seus investimentos e reduz suas possibilidades de contratação de mão-de-obra ou de implementar melhorias salariais.

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Não é por outra razão que metade da força de trabalho do país está hoje na informalidade, sem carteira assinada, sem garantias previdenciárias e submetida a rendas incertas e indignas. Essa é a realidade que o novo ministro parece não enxergar – como parece não ver também que mais importantes do que direitos virtuais é o emprego real e formal para a maioria, só possível se, além de outras reformas, pensar-se também na reforma da legislação trabalhista.