É extraordinária – para usar uma palavra muito usada pelo lulopetismo – a capacidade do presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, em insistir em defender o fraudulento sistema eleitoral venezuelano, cada vez mais afundado em irregularidades e perseguições a integrantes da oposição. Além de fingir que não há nada de errado no país vizinho – que está sob o jugo autoritário de Nicolás Maduro desde 2013 –, Lula referenda uma eleição que pode ser qualquer coisa, menos legítima ou limpa, com direito a discurso pregando a “volta à normalidade”.
Durante um café da manhã com jornalistas escolhidos pelo Palácio do Planalto, Lula comentou sobre as eleições da Venezuela e chamou de “extraordinário” o fato de que “a oposição [venezuelana] toda se reuniu; a oposição está lançando um candidato único. Vai ter eleições”. Ora, não foi uma decisão da oposição lançar a candidatura de Edmundo González Urrutia, um diplomata totalmente desconhecido pela população da Venezuela.
Para Lula não há nenhum problema em Maduro usar a estrutura do Estado, incluindo o Sistema Judiciário, para barrar todos os nomes da oposição que teriam alguma chance de derrotá-lo.
O principal nome da oposição, Maria Corina Machado, foi arbitrariamente impedido de se inscrever pela Justiça Eleitoral venezuelana, aparelhada ao governo de Maduro, por ter sido declarada “inabilitada” (inelegível) por 15 anos. O mesmo aconteceu com a segunda opção, Corina Yoris, igualmente impedida de se candidatar. Urrutia foi o único nome que sobrou, inscrito às pressas como candidato provisório, e só recentemente confirmado pela Plataforma Unitária Democrática (PUD), maior aliança opositora a Maduro.
Como aconteceu com Maria Corina Machado, dezenas de políticos de oposição também foram condenados arbitrariamente e declarados inelegíveis – uma estratégia recorrente do regime de Maduro para impedir que a oposição tenha candidatos fortes nas eleições. O caso mais recente foi registrado na semana passada, quando cinco nomes da oposição ligados a Henrique Capriles (ele mesmo considerado inelegível por 15 anos), sendo dois prefeitos e três ex-deputados, foram inabilitados a se candidatar a qualquer cargo eletivo no país. Todos os cinco eram considerados potenciais candidatos às eleições municipais e estaduais em 2025.
E há ainda as prisões e “desaparecimentos forçados”, conforme denunciou o Grupo de Trabalho da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Desaparecimentos Forçados ou Involuntários na terça-feira (30). De acordo com um relatório do grupo de trabalho, dezenas de opositores do chavismo foram presos, sem que existam informações precisas sobre seu paradeiro e condições, nem garantia de assistência jurídica.
Mas para Lula não há nenhum problema em Maduro usar a estrutura do Estado venezuelano, incluindo o Sistema Judiciário do país, para barrar todos os nomes da oposição que teriam alguma chance de derrotá-lo: faz tudo parte da “democracia relativa”, que ele vê como perfeitamente desejável para a Venezuela. E em seus delírios em favor da ditadura de Maduro, o presidente petista ainda se ofereceu para acompanhar as eleições no país vizinho e ainda cobrou da oposição – essa mesma a quem não foi permitido sequer inscrever os candidatos que queria – a “volta à normalidade”.
“E se o Brasil for convidado [como observador], o Brasil participará do acompanhamento dessas eleições na perspectiva de que, quando terminarem essas eleições, as pessoas voltem à normalidade. Quem ganhou toma posse e governa; quem perdeu se prepara para outras eleições, como eu me preparei depois de três derrotas aqui no Brasil”, disse Lula, dando a entender que será o primeiro a parabenizar o ditador Nicolás Maduro após as eleições do dia 28 de julho – data cuidadosamente escolhida pelo regime por ser a mesma do aniversário de Hugo Chávez – e que não vai aceitar qualquer contestação a um resultado favorável ao ditador.
Seria interessante saber exatamente o que é essa “normalidade” pós-eleitoral no vocabulário lulopetista. Para a população venezuelana que não vê esperança de mudança de regime, que precisa escolher entre ficar no próprio país em meio à fome, miséria e perseguição política ou fugir para longe, essa “normalidade” pode significar apenas afundar ainda mais na desesperança e apatia, na certeza de que tudo continuará igual pelos próximos anos. Para os que ousaram se colocar como opositores ao arbítrio, a normalidade poderá ser sofrer mais e mais sanções e perseguições do regime de Nicolás Maduro. E para o próprio governo do ditador, a normalidade – ao menos é assim que tem sido – será perseguir opositores, punir críticos, afundar o país na pobreza e embrenhar-se ainda mais – se é que isso é possível – entre o Judiciário e as demais instituições venezuelanas para garantir vida longa ao regime.
Não é essa, nem de longe, a normalidade que merecem os venezuelanos. A população do país caribenho precisa reencontrar a normalidade que já teve num passado não tão distante, quando era apontada como uma das nações mais democráticas – e não estamos falando de democracias relativas – do mundo. Infelizmente, tudo indica que isso ainda irá demorar.
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