A decisão do presidente Barack Obama, dos Estados Unidos, de estabelecer uma nova estratégia nuclear para o país cria a perspectiva de um cenário global mais equilibrado e seguro, no presente e no futuro. Representa ao mesmo tempo o rompimento da espinha dorsal da política de busca permanente da supremacia nuclear. Implementada desde o fim da Segunda Guerra Mundial, com maior ou menor coloração belicista, dependendo do furor de cada presidente, especialmente dos republicados, a velha política da Guerra Fria sucumbiu diante disso. A nova pretende unir esforços para uma governança global com a multilateralidade de um espectro das Nações Unidas.
Este realinhamento pretende limitar de forma substancial as condições sobre as quais os EUA poderiam empregar armas nucleares, mesmo que em sua própria defesa. Dessa política faz parte também o abandono de qualquer programa que busque o desenvolvimento de novas armas nucleares e a redução dos estoques de armamentos. Pela primeira vez, os EUA estão renunciando ao uso de armas atômicas contra países que não possuem forças nucleares e/ou signatários do Tratado de Não Proliferação Nuclear. O que rompe com a ameaça latente das eras Ronald Reagan e George W. Bush de retaliação nuclear no caso de ataque biológico ou químico.
Essa dissuasão, no entanto, não significou um enfraquecimento da política exterior norte-americana. Obama procurou deixar claro que haverá exceções na estratégia para o caso de ameaças de países "desajustados, como Irã e Coreia do Norte", que têm violado ou rejeitado tratados para evitar a proliferação nuclear. Mais enfático sobre esse delicado tema, o secretário de Defesa, Robert Gates, declarou que "todas as opções estão na mesa de como vamos lidar com vocês", referindo aos dois governos.
O presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, fez pouco caso da nova política nuclear dos EUA e do próprio Obama, em pronunciamento feito pela tevê estatal. Ele qualificou Obama de inexperiente e de "marionete". E advertiu ainda que os Estados Unidos podem receber uma resposta "contundente". "Políticos materialistas americanos, quando perdem para lógica, imediatamente colocam o dedo no gatilho, como cowboys", disse Ahmadinejad em tom jocoso. Aceitando ou não, o recado está dado para o Irã, à Coreia do Norte e a todos os países que facilitam ações do terrorismo nuclear.
Por ser contra a aplicação de sanções contra Teerã em razão de seu polêmico programa nuclear, o Brasil vai ficar numa posição mais difícil nesse contexto. A proximidade com o Irã pode colocar o país, que domina o ciclo de enriquecimento de urânio, sob suspeita, no cenário internacional.
Outra pedra nesse caminho é a China. A falta de transparência nos programas nucleares de Pequim sempre foram motivos de preocupação sobre as intenções chinesas. Em busca da superação deste impasse, a Casa Branca informou que Obama e o presidente da China, Hu Jintao, vão se reunir nos bastidores da cúpula nuclear com 47 países, em Washington, que acontece nas próximas terça-feira e quarta-feira.
O primeiro grande passo dessa nova política foi dado na quinta-feira, em Praga, República Tcheca. Barack Obama e o presidente russo Dmitri Medvedev assinaram o mais ambicioso tratado de redução de armas nucleares em duas décadas. Obama e Medvedev sentaram-se lado a lado para firmar o documento, visto também como importante passo para o relançamento da muitas vezes abalada relação bilateral. Ambos teceram elogios ao acordo. O líder norte-americano disse que o tratado é um passo em uma jornada mais longa, que estabelecerá as condições para cortes maiores. Já o russo afirmou que toda a comunidade ganha com a medida.
Segundo o acordo New Start, EUA e Rússia se comprometeram a reduzir seus respectivos arsenais para 1.550 ogivas e 800 vetores nos próximos sete anos um corte de cerca de 30% no total que as duas potências deveriam dispor atualmente, segundo o que foi acordado em 2002. Também foram impostos limites aos mísseis balísticos intercontinentais, necessários para lançar as ogivas em caso de ataque.
A nova política dos Estados Unidos abre, com certeza, o horizonte para um mundo com uma nova mentalidade em relação às armas nucleares.