O governo anunciou recentemente, entre outras, quatro medidas econômicas: a) anulou a decisão, que vigoraria a partir de dezembro, de exigir o pagamento mínimo de 20% das faturas de cartão de crédito (foi mantido o porcentual de 15%); b) elevou os limites de faturamento para enquadramento como microempreendedor individual; c) elevou os limites para enquadramento das microempresas no Supersimples (modo simplificado de pagamento de tributos); d) aumentou o limite de endividamento de sete estados, num total de R$ 21,3 bilhões.
Essas medidas partiram de uma premissa básica: facilitar o aumento da demanda como meio de evitar que a economia sofra forte desaceleração e que haja redução de produção, emprego e renda. Além das quatro medidas citadas, o governo resolveu relaxar a política monetária, reduzindo o volume de dinheiro que os bancos devem manter como reserva para empréstimos de curto prazo. O objetivo dessa medida é incentivar a concessão de financiamentos de prazo mais longo, até 60 meses, a fim de facilitar a tomada de crédito por compradores de bens duráveis, inclusive veículos.
As medidas anunciadas pelo governo podem ter méritos em si. Porém, elas revelam um aspecto preocupante da política econômica: fica a impressão de que o atual governo não tem um modelo integral, sistematizado e harmonizado em suas partes. Ou seja, o governo revela disposição para tomar medidas tópicas a cada problema real ou a cada ameaça provocada pelo complicado cenário macroeconômico mundial. Usando linguagem popular, poder-se-ia dizer que a política econômica atual é uma colcha de retalhos, na qual cabe qualquer remendo destinado a consertar algum furo específico.
O problema é que medidas econômicas têm efeitos de curto prazo, que podem ser benéficos, e efeitos de longo prazo, que podem ser muito ruins. É o caso de medidas que estimulem o endividamento das famílias e de estados. A economia nacional tem três entidades econômicas: as pessoas, as empresas e o governo. Todas elas podem se endividar de maneira saudável, desde que sejam respeitadas suas condições orçamentárias e a capacidade de pagamento dos passivos.
Nas crises anteriores, quando a demanda por bens e serviços diminuiu, o governo usou a estratégia de facilitar o endividamento das pessoas, o que acabou funcionando para elevar as compras e impedir que a economia reduzisse a atividade. Todavia, neste fim de 2011, o nível de endividamento pessoal já é bastante alto e medidas que facilitem a elevação dos passivos das pessoas físicas podem ser um estopim para a criação de dificuldades em futuro não muito distante. Tendo em conta que a taxa de juros para o consumidor no Brasil é sempre muito alta, o que é bom para a economia como um todo pode ser um desastre para as finanças pessoais.
O Banco Central e a Serasa Experian vêm demonstrando que o porcentual da renda líquida das pessoas destinado ao pagamento de prestações de financiamentos já está maior do que nos Estados Unidos. Enquanto a economia está acelerada e a taxa de desemprego está baixa (hoje é menor que 6% da população economicamente ativa), os problemas não são graves. Mas, a qualquer redução no nível de atividade, o desemprego aumenta e os desequilíbrios de caixa das pessoas vão aparecer. A primeira consequência é a elevação da inadimplência nas carteiras bancárias de crédito ao consumidor, cujo efeito é sempre mandar a taxa de juros para o alto.
Além dos estragos no mercado financeiro, a elevação da inadimplência derivada de subida na taxa de desemprego atua fortemente na redução da demanda. Daí para frente, a demanda pode cair mais rápido do que subiu, pois as pessoas não têm alternativa a não ser drástica redução do consumo. O fato é que consumo movido a crédito não se sustenta em níveis elevados no longo prazo. Caso a economia mundial se recupere rapidamente, a estratégia do governo pode até ser boa. Caso contrário, as consequências podem ser pesadas, pois a perda de renda dos que têm passivo bancário cria várias distorções na vida das famílias e na conjuntura macroeconômica.
Quanto ao endividamento dos estados, o problema está na necessidade de que a arrecadação tributária continue crescendo (não há garantia de que isso ocorrerá) e na elevação das despesas com pagamento de juros. No Brasil, é recorrente a gritaria de governantes e políticos contra a elevada carga de despesas financeiras que o governo paga. Só que os críticos não dizem para a população que as despesas com juros não surgiram do nada: elas resultam da decisão deliberada dos governantes em fazer dívidas para bancar seus gastos. Não será surpresa se alguns dos que aprovaram a elevação da dívida dos estados agora saírem às ruas no futuro propondo calote na dívida pública.
Merecem aprovação as elevações dos limites de faturamento para fins de enquadramento como microempreendedor individual e para adesão ao Supersimples. Simplificações no sistema tributário são sempre bem-vindas, pois, sem elas, parte das pessoas prefere ficar na economia informal a ter de enfrentar o complexo sistema de leis e de impostos.
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