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Editorial

O Brasil e o convite para a OCDE

O que Bolsonaro ganha com o convite da OCDE para o Brasil entrar no "clube de países ricos"
O presidente Jair Bolsonaro e Mathias Cormann, secretário-geral da OCDE, em encontro ocorrido em 2021. (Foto: Alan Santos/Presidência da República)

O Brasil deu um passo importante, ainda que inicial, para cumprir um objetivo que persegue desde 2017: a adesão à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade que reúne países considerados desenvolvidos. A organização aprovou um convite para que o Brasil e mais cinco nações – Argentina, Bulgária, Croácia, Peru e Romênia – possam iniciar as negociações para a efetiva adesão ao grupo, cujos integrantes precisam ser, de acordo com a descrição da própria entidade, “sociedades democráticas comprometidas com o império da lei e a proteção dos direitos humanos” e “economias abertas, transparentes e de livre mercado”.

Juntar-se a um clube que corresponde a quase dois terços do PIB mundial e que “puxa para cima” seus membros em termos de fomento ao comércio exterior, boas práticas econômicas e políticas públicas, para citar algumas das vantagens de pertencer à OCDE, é meta que o Brasil fez muito bem em adotar, mas que ainda exigirá muito do país se o objetivo é realmente concluir as negociações em três a cinco anos, como afirmam representantes do governo brasileiro. O convite é uma manifestação de que o Brasil tem condições de conquistar a adesão, não um atestado de que está muito perto de consegui-la – a Argentina, por exemplo, é uma economia em frangalhos, fechada e protecionista sob o tacão da esquerda, e também recebeu o mesmo convite. Cabe, agora, a cada país convidado realizar as reformas necessárias para atingir o padrão das economias desenvolvidas e merecer a admissão.

Agora que houve uma formalização do convite, não podemos mais continuar fazendo ouvidos moucos às recomendações da OCDE, sob pena de ver trancadas as portas da entidade ao menos no curto e médio prazo

O chanceler Carlos França afirmou que o Brasil já aderiu a 103 dos 250 instrumentos normativos da OCDE – mas o que ainda há por fazer é de muito vulto. Não se trata apenas de mudanças pontuais, como a prometida redução do IOF em operações de câmbio, zerando o imposto até 2029; para atingir os padrões mínimos desejados pela entidade, o Brasil precisará avançar muito em termos de liberdade econômica, realizar as reformas que vem relutando em fazer – especialmente a tributária – e reverter completamente o curso em um tema crucial: o combate à corrupção.

A OCDE vem olhando com preocupação para o Brasil ao menos desde 2019, quando o Supremo Tribunal Federal derrubou a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância. Logo após o julgamento, o chefe de um grupo de trabalho anticorrupção da OCDE, Drago Kos, esteve no Brasil; a entidade pediu explicações sobre a decisão e manifestou preocupação em relação à aprovação da Lei de Abuso de Autoridade e à desfiguração do pacote anticrime sugerido pelo então ministro Sergio Moro, entre outros temas. O puxão de orelhas de nada adiantou, pois o Brasil regrediu tremendamente desde aquele fim de 2019. A impunidade caminhou a passos largos graças a decisões absurdas do STF, culminando com a anulação dos processos de Lula e a suspeição de Moro; à perseguição movida contra membros da Operação Lava Jato; e a novas leis aprovadas no Congresso Nacional, que facilitam a vida dos corruptos e dificultam sua punição. Não à toa o Brasil acaba de perder mais duas posições no ranking de corrupção da ONG Transparência Internacional.

Também no campo econômico há muito a fazer, e a OCDE chegou até mesmo a facilitar a vida dos brasileiros, entregando pronto um roteiro do que precisa ser conquistado, na forma de um relatório com 17 recomendações publicado no fim de 2020. Ajuste fiscal, respeito ao teto de gastos, reformas tributária e administrativa, autonomia do Banco Central, fortalecimento dos programas de benefícios sociais, desvinculação e desindexação, abertura comercial, combate mais firme à devastação do meio ambiente, desburocratização da atividade empresarial: tudo isso consta do relatório, mas nestes 13 meses passados desde sua publicação pouco foi alcançado. Não estamos “gastando melhor em vez de gastar mais”, como queria o então secretário-geral da OCDE, Angel Gurría, e todas as discussões sobre o Orçamento de 2022 são o exemplo perfeito de como o conselho não foi levado a sério.

O convite da OCDE é uma chance, mas também um aviso. Até agora, quando o Brasil e a entidade apenas flertavam, o país vinha insistindo em ignorar a grande maioria das boas recomendações recebidas; agora que houve uma formalização do convite, não podemos mais continuar fazendo ouvidos moucos, sob pena de ver trancadas as portas da entidade ao menos no curto e médio prazo. Os brasileiros nos três poderes que estão empenhados na construção de um ambiente de liberdade econômica, segurança jurídica e combate firme à corrupção precisam assumir o protagonismo e levar o Brasil a um novo estágio de desenvolvimento.

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