Um relatório divulgado na terça-feira pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) trouxe uma má notícia para o Brasil: o país é a única entre as grandes economias do mundo a registrar desaceleração no primeiro trimestre de 2021, na contramão da tendência observada em vários outros países e regiões. O indicador usado pela OCDE, chamado Composite Leading Indicators (CLIs, ou “índice composto de indicadores antecedentes”), registrou queda de 0,32% no Brasil em março; em fevereiro, já tinha havido queda de 0,18%, e apenas em janeiro tinha ocorrido um ligeiro avanço, de 0,02% – as porcentagens representam comparação com o mês anterior.
No mesmo período de três meses, países europeus como França e Reino Unido saíram de um CLI negativo para um positivo. Em outros, como Itália e Alemanha, o CLI já estava positivo e vem aumentando mês após mês. Uma aceleração mais modesta é verificada em países como Canadá, Rússia e Estados Unidos. China e Índia tiveram pequenas oscilações, mas seus CLIs do primeiro trimestre ficaram entre os mais robustos entre as principais economias mundiais, entre 0,29% e 0,40%.
Quando finalmente o coronavírus for vencido, com que força a economia vai se recuperar?
A OCDE, em seu relatório, indicou chaves de leitura para os CLIs, lembrando que há uma série de fatores relacionados à pandemia e que “geram flutuações mais altas do que o normal”, caso do ritmo da vacinação e das restrições aos negócios ainda em vigor em muitos países. O índice tem de ser analisado como “uma indicação da força do sinal e não como uma medida do grau de crescimento da atividade econômica”, segundo a entidade que reúne países considerados desenvolvidos.
Não surpreende que o indicador usado pela OCDE mostre o Brasil em desaceleração. Ao contrário do que se verifica em outros países, a pandemia de Covid-19 está mais forte agora que durante a primeira onda, em meados de 2020, com aceleração nos números de novos casos e mortes, o que leva gestores estaduais e municipais a impor restrições que atingem em cheio negócios já cambaleantes. E o ritmo de vacinação está muito longe de ser satisfatório. Por mais que o Brasil seja um dos países que mais aplicaram vacinas em números absolutos, apenas muito recentemente superamos a barreira de 10% da população a ter recebido pelo menos uma dose da vacina – Israel superou os 60%; o Reino Unido se aproxima de 50%; Chile e Estados Unidos estão próximos de 40%, segundo o site Our World in Data. Boas notícias, como o possível adiantamento de uma remessa da Pfizer, se misturam com atrasos nos cronogramas de outros fornecedores, como a Fiocruz e o Instituto Butantan, dependentes de insumos importados.
Isso significa que o Brasil vai demorar mais para sair da pandemia. E, quando finalmente o coronavírus for vencido, com que força a economia vai se recuperar? Infelizmente, a volta à normalidade sanitária deve encontrar um país em frangalhos do ponto de vista fiscal. Mesmo com a dívida pública em níveis alarmantes como porcentagem do PIB, reformas com importante efeito fiscal, como a administrativa, estão paradas, e o Orçamento da União foi montado de forma a consagrar a tendência gastadora. Outras reformas que poderiam dar algum respiro ao empreendedor, como a tributária, também demoram a caminhar. O mercado financeiro, ciente de que os impasses políticos tendem a prejudicar a retomada, já revisa para baixo as projeções de crescimento do PIB em 2021 enquanto eleva suas projeções para a inflação e a taxa de juros.
A “retomada em V” de que o ministro Paulo Guedes tanto falava, portanto, corre sérios riscos. Se o país seguir patinando no combate à pandemia – principalmente se não acelerar o ritmo de vacinação – e se não forem destravadas as ferramentas que permitirão ao Brasil reconquistar a confiança internacional, atrair investimentos, gerar emprego e renda, e crescer de forma consistente quando terminar o flagelo da Covid-19, estaremos desperdiçando uma oportunidade que outros países, mesmo aqueles que regrediram mais que o Brasil em 2020, já estão aproveitando.
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