O IOF sobre ingresso de capital externo no Brasil foi elevado para 4%. Apesar desse tributo, a taxa de câmbio vem resistindo a todas as tentativas do governo para impedir seu "derretimento", e mesmo com uma pequena recuperação ontem , chegou a bater a marca dos R$ 1,66, que é o nível mais baixo dos últimos dez anos. A essa taxa, o preço do dólar fica apenas 66% maior do que era em julho de 1994, quando o Plano Real foi implantado e o câmbio foi fixado em R$ 1. A inflação em reais desses últimos 16 anos passa dos 200%, portanto, um produto vendido no mercado brasileiro por R$100 no início do Plano Real, atualmente é vendido por R$ 300. Esse mesmo produto, vendido no mercado externo por 100 dólares há 16 anos, caso seu preço lá fora continue em 100 dólares, dá ao exportador brasileiro apenas R$ 166 na troca dos dólares por reais. É uma perda imensa, capaz de inibir as exportações, levar à falência empresas que dependam do mercado externo e, simultaneamente, provocar uma enxurrada de importações.
Ainda que tenha havido alguma inflação internacional e os preços em dólares das exportações brasileiras tenham subido, de forma a amenizar a baixa taxa de câmbio, a situação dos exportadores não é boa. O dólar não precisaria estar na faixa dos R$ 3, de maneira a refletir toda a inflação interna, mas deveria estar, pelo menos, na faixa do R$ 2,30 para que os exportadores fossem remunerados em valores compatíveis com os custos de produção.
Trata-se de um tema complexo, que foge à compreensão da maioria da população, mas que é vital para definir o futuro do país e as possibilidades de crescimento. Um dos efeitos mais temidos da baixa de câmbio é o que se convencionou denominar de "desindustrialização". A ocorrência de prejuízos sistemáticos com as exportações pode levar muitas empresas a opção de fechar suas portas, encerrar a produção e desempregar pessoas. Mais grave ainda é que mesmo empresas não exportadoras podem fechar, pois a baixa taxa de câmbio joga os preços dos produtos importados para baixo e torna mais barato importar do que comprar no mercado interno. Muitas empresas podem ter de parar sua produção por não conseguirem competir com os preços das importações. Empresários, economistas e especialistas vêm alertando para a possibilidade de ocorrer a desindustrialização em diversos setores, tema sobre o qual o governo vem demonstrando alguma preocupação, a ponto de o presidente Lula dizer que pode vir a estabelecer restrições às importações.
A pergunta intrigante é: por que a taxa de câmbio insiste em ficar nos baixos patamares atuais? A moeda externa é comprada e vendida no mercado de divisas, que é regido pela lei da oferta e da procura, da mesma forma como ocorre com os demais mercados. Há excesso de oferta da moeda estrangeira, em níveis capazes de jogar a taxa de câmbio para baixo. Uma razão para isso é que o Brasil acumulou elevados saldos na balança comercial durante anos, sobretudo pela elevação dos preços das commodities exportadas. Outra razão é que o ingresso de dólares no Brasil para aplicação no mercado financeiro, inclusive para compra de títulos públicos, vem se mantendo em volume elevado, pois a taxa de juros obtida no Brasil é maior do que a taxa de juros obtida em aplicações financeiras no mercado internacional.
Entretanto, como base desse problema, e fora da compreensão de quem não é versado em assuntos econômicos, está a maior causa de tudo: o déficit nominal do setor público. Quando o governo gasta mais do que arrecada, alguém deve poupar renda e emprestar ao setor público, comprando seus títulos. Se não fosse assim, o governo teria de emitir dinheiro, mero papel pintado, para pagar seus déficits, levando a sociedade a pagar a conta em forma de inflação, que nada mais é do que um imposto sem lei. Como a dívida pública passa de 1 trilhão e 500 bilhões de reais, quem empresta essa montanha de dinheiro para o governo são os brasileiros (e não os banqueiros, que são apenas intermediários entre o público e o governo) e os poupadores internacionais que mandam seus dólares para cá. A taxa de juros no Brasil é alta exatamente por causa do déficit público e, enquanto não houver equilíbrio fiscal, a queda da taxa de juros torna-se improvável.
Além de tudo, a mistura de déficit público elevado, taxa de juros alta e taxa de câmbio baixa impede o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e freia o desenvolvimento social do país. A farra no gasto público neste fim de governo será o grande problema econômico do próximo presidente, que, se não for resolvido, impedirá o país de crescer a taxas expressivas nos próximos anos. O PIB poderá até crescer, porém a taxas inferiores ao que se poderia esperar caso o governo não tivesse estourado os gastos públicos. Por outro lado, se o novo governo relaxar, abandonar a austeridade e for irresponsável na política fiscal, o preço será a volta do velho monstro: a inflação. Aí seria jogar por terra os 16 anos de estabilidade monetária obtida com o Plano Real. José Serra ou Dilma Rousseff, seja quem for, haverá trabalho duro pela frente.
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