A reforma ministerial de Lula está longe de sua conclusão – até agora, a única mudança foi a substituição no Ministério do Turismo –, mas as negociações entre o presidente e legendas do Centrão andam bastante adiantadas. Os principais partidos envolvidos – Republicanos, União Brasil e PP – devem ser contemplados com cargos de primeiro escalão, como ministérios e, a depender do resultado de um julgamento no Tribunal de Contas da União, também presidências e diretorias de agências reguladoras. Que haja esse tipo de negociação já se tornou algo praticamente certo; a dúvida que sempre paira em situações como essas é no benefício que o país pode tirar desse tipo de alianças.
O modelo partidário e eleitoral brasileiro resulta em uma enorme fragmentação no Legislativo, e qualquer governante, de direita, de esquerda ou de centro, já sabe que não conseguirá maioria parlamentar se não incluir em sua articulação os partidos do Centrão. Eles são o fiel da balança em muitas votações importantes, já que tradicionalmente blocos e legendas de ideologia mais sólida, tanto à direita quanto à esquerda, nunca foram capazes de eleger deputados e senadores em número suficiente para conseguir nem mesmo a maioria simples para aprovar projetos de lei, quanto mais os três quintos necessários para mudanças constitucionais. Atrair o centro político, portanto, se tornou praticamente uma necessidade, e a concessão de cargos faz parte desse tipo de negociação.
O país não precisa de um Centrão disposto a servir de linha auxiliar do petismo, como acaba de fazer ao sabotar a CPI do MST
No caso específico de Lula, há um ponto que merece consideração. Se o presidente agora se vê compelido a acenar com cargos aos partidos do Centrão, é porque falhou grotescamente em sua promessa de governar para todos os brasileiros, preferindo levar adiante o seu programa radical em vez de uma agenda de consenso que pudesse conquistar apoios fora da esquerda sem a necessidade de contrapartidas – a reforma tributária foi uma das raríssimas exceções a essa regra. Por esse ângulo, mais Centrão equivale a menos PT na Esplanada dos Ministérios e em outros cargos importantes, o que pode atenuar o caráter mais ideológico do atual governo – atenuar, mas não anular, já que há pastas das quais Lula e o PT não abrem mão, e que são fundamentais para a implantação do projeto da esquerda para o Brasil. Um exemplo de como o Centrão pode exercer uma influência positiva sobre o governo está na insistência do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em levar adiante a reforma administrativa, tema que é anátema para o petismo.
O problema surge quando esses partidos se dispõem a simplesmente prestar valiosos favores ao governo federal, o que aconteceu de forma bastante deletéria na sabotagem da CPI do MST. No momento exato em que a comissão estava conseguindo montar o quebra-cabeça dos laços espúrios entre o petismo e os sem-terra, Lira manobrou para impedir o depoimento de Rui Costa, ex-governador da Bahia e ministro-chefe da Casa Civil; na sequência, Republicanos, PP e União Brasil trocaram integrantes da CPI, substituídos por deputados simpáticos ao governo. A decisão abriu uma crise interna no Republicanos; apesar de integrar o Centrão, o partido tem uma plataforma um pouco mais definida – que, em certos assuntos, bate de frente com o petismo – e conta com integrantes que se elegeram com o voto dos conservadores, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e os senadores Hamilton Mourão (RS), ex-vice-presidente, e Damares Alves (DF), ex-ministra de Jair Bolsonaro.
Que o Centrão está prestes a compor o governo é praticamente certo; a dúvida paira sobre que Centrão veremos a partir de agora. O país não precisa de um Centrão disposto a servir de linha auxiliar do petismo em troca de alguns cargos, por mais importantes que sejam; mas pode ganhar com um Centrão que contenha o radicalismo lulista e ajude a aprovar projetos e reformas que a esquerda abomina, mas que são extremamente necessárias. Esta, no entanto, é uma escolha que só os integrantes do bloco podem fazer.