A repressão da ditadura bolivariana à oposição chegou a novos níveis nesta semana, com a prisão de três generais da Força Aérea, acusados de "tramar um golpe de Estado", e a cassação da deputada Maria Corina Machado, cujo principal "crime" foi o de tentar fazer chegar à Organização dos Estados Americanos (OEA) um relato sobre a situação na Venezuela, onde o número de mortos desde o início dos protestos de rua, em fevereiro, já chegou a 36. As atitudes do presidente Nicolás Maduro, ajudado agora por seu escudeiro Diosdado Cabello, que comanda a Assembleia Nacional, deixam claro que o país segue empenhado em adotar um rumo cada vez mais autoritário, infelizmente com um empurrãozinho de diversos vizinhos latino-americanos, inclusive o Brasil.
A cassação de Maria Corina foi o resultado de uma situação que deveria envergonhar a diplomacia brasileira. A deputada venezuelana falaria em uma assembleia da OEA, mas as discussões sobre a Venezuela saíram da pauta e a reunião passou a ocorrer a portas fechadas graças à pressão de vários países; a iniciativa foi da Nicarágua, mas outras 21 nações a apoiaram, inclusive o Brasil. Foi do embaixador brasileiro na OEA a frase mais lamentável a respeito do caso: para Breno Dias da Costa, "o objetivo dessa reunião não é transformar-se num circo para uma plateia externa". Circo, na verdade, foi o que os bolivarianos armaram na OEA, enquanto venezuelanos seguiam sendo mortos e presos em seu país.
O Panamá, que foi um dos 11 países a votar a favor da sessão aberta, cedeu, então, seu espaço para que Maria Corina pudesse falar aos embaixadores. Foi essa a brecha que Diosdado Cabello usou para cassar a deputada. Ela teria violado dois artigos da Constituição venezuelana, o 149 (que proíbe funcionários públicos de "aceitar cargos, honrarias ou recompensas de governos estrangeiros" sem permissão do Legislativo) e o 191 (que proíbe deputados de "aceitar ou exercer cargos públicos sem perder seu mandato"). Está mais que óbvio que a presença de Maria Corina na OEA não desrespeitava nenhum desses artigos a própria Venezuela já tinha oferecido, no passado, espaço para que terceiros pudessem falar, caso de Patricia Rodas, ex-chanceler de Honduras, durante a crise causada pela deposição de Manuel Zelaya. A ação autoritária de Cabello revoltou outros parlamentares de oposição, que foram ao Tribunal Supremo de Justiça alegando que a cassação viola as leis do país. Considerando que o TSJ também já foi quase que totalmente cooptado pelo chavismo, é quase impossível que o pedido dos deputados em favor de Maria Corina prospere.
Em novembro de 2013, o chavismo já tinha usado expediente semelhante para conseguir a aprovação da Lei Habilitante, que permite ao presidente governar por decreto. Com Maduro precisando de 99 votos, mas contando apenas com o apoio de 98 deputados, a Assembleia Nacional cassou a imunidade de uma deputada de oposição, Maria Arangurén. Acusada de corrupção, ela teve de ceder o lugar a um suplente chavista, que garantiu a votação necessária. Mas a cassação sumária de Maria Corina levou o chavismo a um novo nível de autoritarismo.
Agora, Maria Corina corre o risco de ter o mesmo destino de outros colegas de oposição, como o líder partidário Leopoldo López e os prefeitos Daniel Ceballos e Enzo Scarano, todos presos. A arbitrariedade de Cabello e Maduro (que, dias antes de a cassação ocorrer, já havia até se referido a Maria Corina como "ex-deputada") mostra que o governo venezuelano não tem a menor disposição de dialogar. Mesmo assim, a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) começou na terça-feira uma visita de chanceleres à Venezuela, supostamente para promover uma reconciliação nacional. Dado o caráter totalmente parcial dessa entidade, alinhada ao chavismo, é bem provável que seja a missão dos ministros a se transformar em um circo macabro de validação dos métodos ditatoriais bolivarianos.
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