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editorial

O delírio totalitário de Rui Falcão

Ao dizer que a imprensa e o MP abrem espaço para práticas que se assemelham ao nazismo, o presidente do PT ignora que é justamente o seu projeto para a mídia que se assemelha ao programa hitlerista

O deputado estadual paulista Rui Falcão, presidente estadual do PT, já tem um extenso repertório de declarações de cunho totalitário em seu currículo, várias delas inclusive comentadas neste espaço. Mas, anteontem, ele superou-se ao comparar a imprensa e o Ministério Público aos regimes fascistas da primeira metade do século passado. "São esses [imprensa e setores do MP] a quem nominei que tentam interditar a política no Brasil e fazem com que ao mesmo tempo desqualifiquem a política. Quando desqualificamos a política, a gente abre campo para as aventuras golpistas, para experiências que no passado levaram ao nazismo e ao fascismo, que devemos definitivamente afastar do nosso país", afirmou em reunião da bancada petista na Câmara dos Deputados, em Brasília.

Para justificar a afirmação de que o PT precisa combater imprensa e MP, Falcão usou uma declaração de Judith Brito, hoje diretora da Associação Nacional de Jornais (ANJ). "Sejamos francos: quem é a oposição no Brasil? Há oposição dos partidos políticos, mas há oposição mais forte, mas que não mostra a cara, quando poderia fazê-lo. É o que chamo de oposição extrapartidária, que se materializa numa declaração que a imprensa veiculou de Judith Brito, que disse com todas as letras: ‘como a oposição não cumpre seu papel, nós temos de fazer’. E vem fazendo", disse o presidente do PT, distorcendo as palavras ditas em 2010 pela então presidente da ANJ. A declaração completa de Judith era a seguinte: "A liberdade de imprensa é um bem maior que não deve ser limitado. A esse direito geral, o contraponto é sempre a questão da responsabilidade dos meios de comunicação. E, obviamente, esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente fragilizada. E esse papel de oposição, de investigação, sem dúvida nenhuma incomoda sobremaneira o governo".

É fato que a oposição partidária no Brasil está enfraquecida, não só pelo rolo compressor petista, mas também por escolhas próprias feitas ao longo destes dez anos. Mas está claro que o "papel da oposição" a que Judith Brito se refere é o de fiscalização, não o de política partidária. Mesmo assim, compreende-se a indignação de Falcão com a imprensa e o MP; afinal, sem eles, a legenda que criou o mensalão, o escândalo dos aloprados, o Rosegate e vários outros escândalos menores teria sinal verde para seguir colocando o Estado a serviço do partido.

A data que Rui Falcão escolheu para comparar a imprensa e o MP ao nazismo é emblemática. Exatos 80 anos antes, em 30 de janeiro de 1933, Adolf Hitler se tornava chanceler da Alemanha, levando o Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães ao poder – e nem seria preciso lembrar que dali surgiu um dos piores totalitarismos da história. Não se sabe se o presidente do PT estava consciente da coincidência, que aliás não para por aí. Afinal, o ódio de Rui Falcão e de boa parte dos petistas de alto coturno pela imprensa livre encontra paralelo justamente no programa do Partido Nazista, proclamado por Hitler já em 1920. O 23.º dos 25 pontos do programa menciona explicitamente o controle da imprensa, com frases como "Exigimos que se lute pela lei contra a mentira política deliberada e a sua divulgação através da imprensa" e "Os jornais que colidirem com o interesse geral devem ser interditados". Obviamente, por "interesse geral" se entendiam os interesses do próprio partido, e "mentira política deliberada" era o eufemismo para designar qualquer informação prejudicial ao partido. Daí se conclui que Falcão, ao imputar sobre a imprensa brasileira e o MP a acusação de "abrir campo" para "experiências que no passado levaram ao nazismo", está apenas adotando a velha estratégia do "acuse-os do que você é".

Em diversas ocasiões, comentando não apenas afirmações de Rui Falcão, mas também os sucessivos escândalos em que o PT está envolvido, esta Gazeta do Povo lembrou que há muitos petistas comprometidos com a ética e a moralidade no trato com a coisa pública, e ressaltou a importância de essas pessoas se manifestarem. O presidente do PT dá, agora, outro pretexto para que os petistas que valorizam uma imprensa e um Ministério Público livres e independentes se façam ouvir e deixem claro que discordam do chefe da legenda. É justamente a omissão dos bons militantes que permite que o partido seja dominado pelas maçãs podres, aquelas que acabam contaminando todo o cesto.

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