A necessária revolução no transporte brasileiro depende de duas condições: a remoção de restrições exageradas e desnecessárias a quem pretende prestar o serviço, e a modernização da infraestrutura física. De pouco adianta haver várias empresas interessadas em transportar pessoas e cargas, a preços competitivos em um ambiente de verdadeira concorrência, se portos, aeroportos e estradas permanecerem obsoletos; da mesma forma, terminais de última geração e rodovias em perfeito estado de conservação serão pouco aproveitados se uma regulamentação exagerada impedir a entrada de novos players e dificultar o trabalho de quem já atua no mercado. Felizmente, o governo federal vem atuando em ambas as frentes, e promete mais avanços em 2022.
Um caso emblemático é o da navegação de cabotagem, com transporte de carga por via marítima entre portos brasileiros. Em dezembro, o Congresso Nacional aprovou a “BR do Mar”, projeto apresentado pelo governo em 2020 e que facilita a operação de empresas no setor ao eliminar exigências de frota própria, permitindo às companhias afretar embarcações estrangeiras, o que aumentará a oferta e levará a uma potencial redução nos preços do frete marítimo. O governo tem grandes expectativas para a “BR do Mar”, prevendo uma elevação de quase 70% no total transportado – de 1,2 milhão de TEUs (unidade equivalente a 20 pés) de contêineres transportados por ano para 2 milhões de TEUs – ainda neste ano. Se tal demanda se concretizar, será preciso que os portos brasileiros estejam à altura do novo cenário.
Deixar que seja o setor privado a administrar a infraestrutura de transportes nada mais é que aplicar o princípio da subsidiariedade e reconhecer o papel da iniciativa privada como o verdadeiro motor do desenvolvimento nacional
Em 2021, o governo federal realizou o leilão de concessão de 13 terminais localizados em nove portos diferentes; apenas um não teve interessado. Os leilões levantaram R$ 813,7 milhões em outorgas e devem resultar em R$ 1,8 bilhão de investimentos e quase 27 mil empregos. Para 2022, o plano é realizar a concessão de portos inteiros, o que é inédito na história do país. Na sequência divulgada pelo Ministério da Infraestrutura, o primeiro porto a ser leiloado será o de Vitória (ES); depois virão São Sebastião (SP), Itajaí (SC) e Santos (SP). O porto catarinense é o segundo do país em movimentação de contêineres, e o de Santos já é o maior da América Latina; o ministro Tarcísio Gomes de Freitas promete transformá-lo “no maior porto do Hemisfério Sul. O porto que movimentava 130 milhões de toneladas vai movimentar 250 milhões”.
Além dos avanços no setor de navegação, o ano trará concessões importantíssimas no setor aéreo: a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) aprovou os estudos da sétima rodada de leilões de aeroportos, que agora depende do aval do Tribunal de Contas da União. Os 16 aeroportos incluídos correspondem, somados, a um quarto do total de embarques e desembarques realizados no país; as “joias da coroa” serão Congonhas, em São Paulo, e o Santos Dumont, no Rio de Janeiro. E a manutenção do modelo de blocos garante que os futuros concessionários invistam também nos aeroportos menores que fazem parte do mesmo lote – quem levar Congonhas, por exemplo, fica obrigado a investir também nos aeroportos de Campo Grande (MS), Corumbá (MS), Ponta Porã (MS), Santarém (PA), Marabá (PA), Parauapebas (PA) e Altamira (PA), impulsionando a aviação regional.
No setor rodoviário, o governo pretende leiloar um total de 13 mil quilômetros, com destaque para a BR-381, em Minas Gerais; trechos da BR-116 e da BR-040; e as rodovias do Anel de Integração do Paraná. Por fim, no transporte ferroviário, duas concessões devem ser renovadas e uma terceira será leiloada, somando 9,8 mil quilômetros – isso sem contar todos os projetos que estão sendo apresentados ao Ministério da Infraestrutura dentro do novo Marco Legal das Ferrovias.
O transporte é um dos setores em que a iniciativa privada já se mostrou mais capaz que o poder público. Algumas poucas concessões mal-sucedidas, como as de Viracopos e de um trecho da BR-040, que acabaram devolvidas, não anulam a regra geral, que pode ser comprovada em obras como o Terminal 3 de Guarulhos ou a liderança dos trechos concedidos em todos os rankings de qualidade de rodovias medidos pela Confederação Nacional dos Transportes. Deixar que seja o setor privado a administrar a infraestrutura de transportes nada mais é que aplicar o princípio da subsidiariedade e reconhecer o papel da iniciativa privada como o verdadeiro motor do desenvolvimento nacional.