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Editorial 1

O fenômeno Nick Clegg

Assim como ocorreu nos Estados Uni­­dos com o fenômeno Barack Obama, a Grã-Bretanha vive um momento excepcional diante de um novo fator político que se chama Nick Clegg, candidato do Partido Liberal Democrata às eleições gerais do dia 6 de maio. Esse líder político de centro, 43 anos, ao vencer o primeiro debate televisionado da história do país, passou, em uma semana, da condição de azarão, da disputa, a ameaçar nas pesquisas, tornando-se o principal alvo das críticas de seus rivais na campanha eleitoral. Nessas circunstâncias, Clegg representa hoje uma verdadeira ameaça à hegemonia bipartidária trabalhista-conservadora, que sempre predominou no país e pode virar a política britânica de ponta-cabeça, se vencer as eleições.

A fulminante ascensão nas pesquisas do líder do partido liberal-democrata foi desconcertante para a política britânica. Há duas semanas do pleito, o jornal The Sunday Times, um dos mais respeitados diários britânicos, chegou a comparar a popularidade de Clegg à do premiê Winston Churchill. A rigor, a corrida eleitoral no país nunca havia visto algo semelhante. O analista político John Curtice, da Universidade Strathclyde, de Glasgow, disse o seguinte ao jornal The International Herald Tribune: "Nunca tivemos esses resultados em numa campanha eleitoral".

O sistema eleitoral da Grã-Bretanha é muito diferente do Brasil. À primeira vista, pode parecer difícil ser compreendido. Existem, no país, cerca de 45 milhões de pessoas com 18 anos ou mais que podem votar. As eleições são distritais. Em cada região o candidato a membro do Parlamento (deputado) mais votado é eleito. Mesmo com isso, a proporção do número de deputados de ca­­da partido no Legislativo não é necessariamente igual à proporção do número de votos recebidos pelo partido. Detalhe: um partido que tenha, por exemplo, uma média de 30% dos votos em âmbito nacional pode não conseguir eleger nenhum deputado se não tiver a maioria em nenhum distrito. O maior nú­­mero de deputados no Parlamento com 650 cadeiras é o que dá o direito de formar o novo governo, sendo o líder do partido o futuro primeiro-ministro.

Esta expectativa da população com Nick Clegg revela uma máxima da política de que sempre os mesmos, embora se revezando no poder, como é o caso dos trabalhistas e conservadores, cansam. Ainda mais quando o cenário político britânico mantém na crista da onda um recente escândalo de gastos parlamentares, a exemplo do Brasil, um ingrediente especial desta campanha eleitoral.

Clegg explorou bem no debate esta vertente das benesses parlamentares, colhendo resultados imediatos: pareceu despertar os eleitores para uma terceira via. Ou seja, conquistar aqueles que não estão dispostos a votar outra vez no Partido Trabalhista do primeiro-ministro, Gordon Brown, de centro-esquerda; e da mesma forma não estão convencidos da opção conservadora, representada por David Cameron, de centro-direita. Há para os liberais-democratas, contudo, um desafio a enfrentar: desfazer uma equação não resolvida na política britânica, ao longo de séculos – a história dos terceiros partidos está repleta de desilusões.

Embora não seja possível dizer, neste momento, que Clegg tenha reais chances de vencer, a sua entrada em cena mostra que o país – fragilizado pela crise financeira internacional, estagnado economicamente e com elevados índices de desemprego e de outros custos sociais – quer algo mais de seus ho­­mens públicos. Com certeza, a partir de ago­­ra, a Grã-Bretanha, com a sacudida deste fa­­tor, que parece expressar a vontade de uma grande maioria, vai pensar mais profundamente na necessidade de se renovar.

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