Pelo menos por enquanto, o Paraná está livre da ameaça de conviver com autoridades públicas de menor escalão que, diferentemente dos cidadãos comuns, passariam a gozar da prerrogativa de só poderem ser julgadas por instâncias superiores da Justiça. É que, na última quarta-feira, o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu liminar derrubando a lei recentemente promulgada pela Assembléia Legislativa de Minas Gerais que estendia o direito ao foro privilegiado a deputados estaduais, secretários de estado, dirigentes de autarquias e prefeitos municipais. Com isso, felizmente, a idéia sem pai mas de mesmo teor que vinha sendo gestada na Assembléia paranaense volta para o arquivo à espera de um improvável julgamento de mérito favorável à lei mineira.
Na prática, a pretensão dos deputados paranaenses era a de, seguindo orientações emanadas do Palácio das Araucárias e sob a oportuna inspiração da iniciativa mineira, inibir a ação do Ministério Público Estadual instituição que, apesar dos eventuais excessos que comete e das suas muitas omissões, vem sem dúvida desempenhando importante papel moralizador da administração pública. Tornou-se incômoda a freqüência com que seus promotores vêm obrigando nossas autoridades a responder nas instâncias inferiores da Justiça por atos supostamente eivados de irregularidades. Diante disso, é preciso cercear a liberdade de ação do MP, pensam muitos dos parlamentares que, nos bastidores, vinham articulando a aprovação de medida similar à mineira.
O direito a foro privilegiado, limitado atualmente às altas autoridades dos Três Poderes por legislação federal, desde 1997, é uma medida que guarda sensatez. Ela evita a exploração política e demagógica de denúncias formuladas por promotores que, muitas das vezes, não escondem suas preferências partidárias ou ideológicas. Tornou-se emblemática, neste sentido, a atuação destrambelhada de dois promotores que atuavam no Distrito Federal Luiz Francisco e Guilherme Schelb , recentemente suspensos de suas funções em razão dos excessos que cometeram, manchando biografias que posteriormente se provou serem honradas.
Este fato, porém, não pode servir de justificativa para a ofensiva que se engendra nas catacumbas contra as prerrogativas do Ministério Público. Os excessos devem ser tolhidos e há instrumentos legais e regulamentares eficazes para tanto. Mas, por outro lado, é indubitável ser mais danosa às instituições a impunidade com que passariam a contar os agentes públicos desonestos, protegidos por dois decisivos fatores.
Um deles é que, estando livres da iniciativa individual dos promotores, as autoridades para as quais se quer estender o foro privilegiado só poderiam ser submetidas a processo por iniciativa do procurador-chefe de Justiça. O segundo é que as ações só poderiam ser julgadas por instância de segundo grau, isto é, pelo Tribunal de Justiça, e não mais pelos juízes singulares das comarcas de origem. Para quem sabe do acúmulo de processos que assoberbam o Judiciário, isto significa retardar indefinidamente o trânsito em julgado das causas. Na prática, quer-se garantir impunidade aos flagrados em desvios.
O procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, na argumentação que proferiu e que foi liminarmente acatada pelo STF, resume bem o perigo a que a sociedade estará exposta caso prevaleça a intenção de castrar as prerrogativas do Ministério Público. Diz ele: "O risco de convulsão institucional, por causa do vilipêndio aos princípios da autonomia e independência do MP, é patente." Espera-se que os deputados paranaenses já tenham entendido esta verdade.
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