Em sua carta ao Senado, a presidente afastada Dilma Rousseff não desistiu de tentar impor ao país a tese fracassada de que está sendo vítima de um golpe. Reconhecendo sua incapacidade de reverter o processo de impeachment que lhe tomará o mandato, Dilma usou a última carta que tinha à mão: a proposta de se fazer um plebiscito. Uma ideia desesperada que, no fundo, desmascara seu desrespeito pelas instituições brasileiras.
O processo de impeachment foi conduzido dentro das regras constitucionais, com acompanhamento do Supremo Tribunal Federal e com todos os prazos e votações respeitados pelo Congresso. Cabe aos senadores julgar a presidente, contra quem há provas indiscutíveis de crime de responsabilidade. Foi ela quem em última instância autorizou a adoção de vários expedientes para maquiar as contas públicas, entre eles o uso das chamadas “pedaladas fiscais”. O descumprimento da lei está provado e não houve por enquanto qualquer evidência na defesa de Dilma que a isentasse de culpa.
Ao sugerir que o julgamento seja feito pela população, em um plebiscito, Dilma ataca o STF e o Congresso, que não seriam dignos, a seu ver, para conduzir seu impeachment. Ela reforça essa visão ao argumentar que sua inocência é conhecida por todos e ao dizer que seu governo foi alvo de um movimento obsessivo de desgaste. Em vez de se defender, a presidente afastada preferiu apontar os culpados pelo fracasso de seu governo, pela falta das reformas prometidas à população e pela maquinação de um golpe de estado que só existe em sua cabeça.
O mais melancólico em sua carta é que, neste momento, Dilma não tem uma obra a defender, nem argumentos para evitar sua cassação
O governo Dilma fracassou por seus próprios méritos. Optou por uma política econômica torta, que tinha na maior intervenção do Estado sua linha condutora. Na prática, concedeu benefícios setoriais duvidosos, fez planos mirabolantes de investimentos (como o que levou a Petrobras a se tornar a petroleira mais endividada do mundo) e fez a injeção forçada de crédito na economia. Tudo isso custou caro aos cofres da União, que não suportaram essa política. Para evitar que a implosão das contas públicas fosse notada, o governo Dilma recorreu à maquiagem orçamentária. O crime de responsabilidade do qual a presidente afastada é acusada tem a mesma origem que a recessão mais profunda da história.
Não bastasse sua inabilidade econômica, o governo Dilma optou pelo caminho do isolamento político, inclusive dentro de seu partido. Ao mesmo tempo, fez pactos que não poderia cumprir sozinha, como a intenção de fazer a reforma política apresentada após os protestos de 2013 e o ajuste fiscal iniciado em 2015. Se o Congresso não aprovou algum de seus projetos, foi por uma combinação de falta de disposição do governo para o diálogo, com a contrariedade de um PT que ainda esperava alcançar o controle total sobre a vida política e econômica do país. Não houve conspiração nem sabotagem, como ela diz.
O máximo que Dilma tem a afirmar em sua defesa é que não pode ser condenada pelo “conjunto da obra”. Ela tem razão. Sua condenação será pelo crime de responsabilidade do qual é acusada. O mais melancólico em sua carta é que, neste momento, Dilma não tem uma obra a defender, nem argumentos para evitar sua cassação.
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