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Editorial

O futuro da diplomacia brasileira

Escultura Meteoro, em frente ao Palácio Itamaraty, obra do artista Bruno Giorgi
Palácio do Itamaraty, sede do Ministério das Relações Exteriores. (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado.)

Em 2014, um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores de Israel criticou o Brasil com uma expressão que se tornou célebre: “anão diplomático”. Naquela ocasião, o governo brasileiro havia publicado nota desaprovando “energicamente” uma ação israelense na Faixa de Gaza, sem sequer mencionar os foguetes do Hamas lançados sobre cidades israelenses. As palavras escolhidas pelo porta-voz tinham um quê de exagero e um quê de verdade. Exagero porque, se o Brasil fosse realmente um “anão”, sua opinião seria tão irrelevante que nem mereceria resposta exaltada da chancelaria israelense. Mas o Brasil usou seu peso e sua importância de uma forma que o apequenou durante a passagem do PT pelo Planalto.

Por mais que o tema esteja se tornando um tabu eleitoral, graças à censura dos tribunais superiores, o petismo sempre tratou com muita camaradagem seus aliados ideológicos responsáveis por regimes ditatoriais ou ao menos ligeiramente autocráticos. E, estando no poder, facilitou ao máximo as coisas para eles. Em 2015, Lula admitiu ter dito ao recém-eleito Evo Morales, em 2006, que o Brasil não faria nada se a Bolívia tomasse à força as instalações da Petrobras no país andino, o que acabou acontecendo. No governo Dilma, o programa Mais Médicos foi desenhado como meio de enviar milhões de dólares à ditadura cubana com o pretexto de enviar médicos – submetidos a estrita vigilância e sem receber seu salário integral – a locais com carência desses profissionais.

O Brasil precisa seguir adiante com seus esforços de inserção no comércio internacional, e tem de continuar sendo uma voz forte em defesa da vida e da família

A amizade que une petistas e ditadores não se limitou à América Latina. A atuação da diplomacia brasileira sob o PT no Conselho de Segurança da ONU registra episódios lamentáveis, como abstenções durante a votação de resoluções importantes. Entre os beneficiados da omissão brasileira estavam os ditadores Bashar al-Assad, da Síria; Muamar Kadafi (que Lula um dia chamara de “meu amigo, meu irmão”), da Líbia; e Omar al-Bashir, do Sudão – este último caso talvez tenha sido o mais escandaloso, por envolver a crise humanitária de Darfur, que rendera a al-Bashir um mandado de prisão expedido pelo Tribunal Penal Internacional.

Ainda que a diplomacia brasileira pós-PT não tivesse feito absolutamente nada, já teria progredido muito apenas ao deixar para trás a camaradagem ideológica com ditaduras abjetas na América Latina, na África e no Oriente Médio, parar de hostilizar democracias sólidas e de se fechar ao comércio internacional. Mas o Brasil avançou; mesmo descontando alguns excessos do primeiro chanceler de Jair Bolsonaro, Ernesto Araújo, o país está colhendo resultados expressivos de uma nova orientação: ampliou sua inserção internacional, culminando com a assinatura do acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia; e está assumindo um papel de liderança mundial em temas como a liberdade religiosa e a defesa da vida e da família, especialmente depois do retorno dos democratas ao poder nos Estados Unidos.

Já podemos prever o que deve ocorrer à diplomacia brasileira em caso de retorno do petismo ao poder. Mas, em caso de reeleição do presidente Bolsonaro, também há pontos em que o Brasil precisa melhorar, a começar pelo fim do hábito de comprar brigas com nações que questionam a política ambiental brasileira. Em vez de admitir eventuais falhas ou de corrigir críticas infundadas recorrendo à demonstração serena da realidade, o governo – e isso não inclui apenas o Itamaraty; na verdade, os diplomatas costumam ter a menor parcela de culpa – costuma responder com agressividade; o caso mais recente foi o das críticas que o ministro Paulo Guedes fez à França depois dos comentários de um ministro francês sobre queimadas na Amazônia.

Além disso, para se consolidar como um dos líderes do mundo livre, o Brasil precisa se comprometer ainda mais com a democracia e as liberdades nos fóruns internacionais. Foi extremamente preocupante, por exemplo, a abstenção brasileira na votação de uma recente resolução do Conselho de Segurança da ONU que condenava a anexação ilegal, pela Rússia, de quatro regiões ucranianas. Por mais que o destino certo da resolução fosse a rejeição, graças ao poder de veto russo, a omissão colocou a diplomacia brasileira em posição desconfortável. Diante da agressão evidente cometida por Vladimir Putin, todas as democracias mundo afora têm o dever moral de se colocar ao lado dos ucranianos, o que o Brasil acabou não fazendo. Por mais que o fertilizante russo seja necessário ao Brasil – o que, aliás, revela uma dependência indesejada, que Putin não hesitará em usar novamente, como vem feito com a Europa em relação ao gás natural –, não há pragmatismo que justifique uma tomada de posição contrária aos valores democráticos brasileiros.

O Brasil precisa seguir adiante com seus esforços de inserção no comércio internacional, e tem de continuar sendo uma voz forte em defesa da vida e da família, inclusive colaborando com países mais fracos e que compartilham dos mesmos valores, mas são alvos da ofensiva da parte ideologizada do sistema internacional. Mas a diplomacia brasileira, cujo respeito mundial foi manchado pelo petismo, tem também a missão de recuperar a liderança do país nas questões ambientais e, especialmente, ganhar relevância como defensor incondicional das democracias, repudiando os imperialismos neste momento em que eles ganham força.

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