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Não poderia ser diferente o teor das alegações finais do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, pedindo formalmente a condenação de 36 envolvidos no chamado escândalo do mensalão. Em seu libelo, apresentado na última semana, Gurgel sustenta que o mensalão – o maior esquema de corrupção já visto na história política brasileira – foi tramado para fortalecer um projeto de poder de longo prazo do PT. Para tanto, os parlamentares, em especial os integrantes das cúpulas partidárias, seriam beneficiários de polpudas mesadas mensais em troca de apoio incondicional ao governo federal. Segundo ele, o grupo agiu de forma ininterrupta no período de janeiro de 2003 a junho de 2005 e era dividido em núcleos específicos, cada um colaborando com o todo criminoso.

Foi mais longe o procurador-geral, ao imputar o comando de tudo ao então chefe da Casa Civil, José Dirceu, que, graças ao conluio com agências de publicidade e pelo menos um banco, viabilizou a dinheirama toda para garantir o suborno. Pelos depoimentos e provas já coletadas, são cristalinas as evidências de um sem-número de crimes, que vão de lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, peculato, formação de quadrilha, gestão fraudulenta, evasão de divisas até falsidade ideológica. Enfim, um rosário de delitos praticados por uma verdadeira quadrilha que se instalou na cúpula do poder nacional. A partir de agora começa uma corrida contra o tempo para evitar que os envolvidos consigam sair ilesos das denúncias, diante do risco de alguns crimes, entre eles o de formação de quadrilha, vir a prescrever antes do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal. O relator do volumoso processo é o ministro Joaquim Barbosa, que já antecipou ter a necessidade de um prazo de pelo menos seis meses para preparar seu relatório e voto. Com isso, uma previsão otimista aponta para o julgamento apenas em 2012.

Enquanto a Justiça segue o seu trâmite, num ritmo mais lento do que seria o desejável para um caso de tamanha gravidade, os denunciados não é de hoje que se articulam para que tudo acabe numa típica pizza brasileira. Para tanto, algumas das mais conceituadas bancas advocatícias do país já estão a postos com seus arsenais de argumentações e remédios jurídicos para mostrar que o mensalão, na verdade, nunca existiu e procrastinar a decisão final. Além do batalhão de advogados contratados e já em ação, o escândalo vem desde seu início, ainda no primeiro governo Lula, sofrendo por trás dos panos um processo de esvaziamento que pode colaborar para que os implicados saiam ilesos das acusações. Recorde-se que o próprio Lula, beneficiário direto do esquema que lhe garantiria folgada maioria parlamentar no Congresso, declarou ao passar o governo para Dilma Rousseff que sua principal missão a partir de janeiro de 2011 seria mostrar que o mensalão não passou mesmo de "uma farsa". A declaração do ex-presidente nega todas as flagrantes evidências do episódio e vem sendo acompanhada por outras sintomáticas iniciativas partidárias, principalmente, de dentro do PT; estas no sentido da reabilitação de algumas cabeças coroadas do partido e diretamente envolvidas. Assim é que o ex-ministro e deputado José Dirceu, tido e havido como o chefão do esquema, voltou a circular com desenvoltura por Brasília e Delúbio Soares, tesoureiro do PT expulso depois das denúncias, já voltou ao ninho petista devidamente absolvido.

A hipótese de o escândalo do mensalão dar em nada, lamentavelmente, é plausível diante dos prazos prescricionais que podem beneficiar os réus. A se confirmar tal possibilidade, seria um duro golpe contra as instituições do país que foram solapadas pela quadrilha. Nesse caso, corre-se o risco de notórias figuras que representam o que de pior existe na vida pública, como Zé Dirceu, Delúbio, José Genoino, Valdemar Costa Neto, Roberto Jefferson e o publicitário Marcos Valério, para citar alguns, saírem impunes. Impunidade que, a bem da verdade, é um fato recorrente no Brasil quando afloram denúncias de desmandos envolvendo negociatas com o dinheiro público que acabam incentivando os crimes de colarinho- branco.

Ao apresentar a sua denúncia, o procurador-geral Roberto Gurgel frisou considerar o mensalão "a mais grave agressão aos valores democráticos do país que se possa conceber". Afirmação grave que não pode ficar sem uma resposta do Supremo, que terá a incumbência de dar a palavra final. Em suas alegações finais, o procurador-geral reiterou sua confiança na instância máxima do Judiciário, destacando que "de forma justa serão aplicadas as penas cabíveis aos acusados de envolvimento". Isso, em síntese, é o que todos os cidadãos brasileiros de bem esperam que ocorra.

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