Em outubro, o brasileiro escolheu Jair Bolsonaro para a Presidência da República de olho em três grandes temas: a saúde financeira do país, que sai lentamente da maior recessão da história e não sabe como escapar de déficits monstruosos; o combate à corrupção e à criminalidade, em um país repleto de escândalos e com taxas de homicídios dignas de guerra civil, sem falar da explosão de outros crimes violentos, como assaltos e estupros; e a pauta moral, em que o brasileiro quer reagir à ideologização do ensino, a pressões pela liberação do aborto, à promoção de comportamentos degradantes. A última semana mostrou que, em dois desses campos, o jogo começou para valer.
Após semanas de planejamento, o ministro da Justiça, Sergio Moro, levou ao Congresso Nacional na terça-feira, dia 19, seu projeto de lei que pretende, entre outros objetivos, aprimorar o processo penal, evitando a impunidade, e apertar o cerco contra o crime organizado. No dia seguinte, foi a vez de o próprio presidente da República ir à sede do Legislativo federal tendo em mãos o aguardado projeto de reforma da Previdência.
Se aprovados, ambos os projetos podem entrar na categoria de legados
Não que as duas equipes estivessem apenas trabalhando nos bastidores até agora. Dias depois do anúncio do conteúdo do projeto anticrime, mas antes de o texto ir ao Congresso, o governo federal havia organizado a transferência de 22 chefões do PCC – incluindo Marcola, o líder máximo da organização criminosa – para três presídios federais diferentes, com o objetivo de dificultar a comunicação da cúpula da facção. No campo econômico, infelizmente a intenção de publicar medidas de desburocratização a cada dois dias, anunciada logo no início de janeiro, não foi adiante, mas o governo já anunciou privatizações e concessões na área de infraestrutura que devem ocorrer ainda em 2019.
Ainda assim, tais ações não chegam a ter a mesma relevância dos projetos anticrime e da Previdência para os campos da segurança pública e do ajuste fiscal. Se aprovados, ambos podem entrar na categoria de legados, ainda que tenham lacunas temporárias a serem preenchidas mais tarde. No caso do projeto de Moro, a criminalização do caixa 2 acabou saindo do projeto anticrime, e será enviada ao Congresso posteriormente. Decepção? Talvez, mas o ministro sabe muito bem com quem está lidando, e percebeu que as chances de aprovação do pacote completo cairiam com a inclusão do caixa 2. Isso não significa que Moro esteja – ao contrário do que se tem dito – reconhecendo que se trata de um crime de menor gravidade. Além disso, esta criminalização tem de ser feita de forma que desestimule os parlamentares a aprovarem uma anistia, como já tentaram fazer em um passado bem recente. Se o tempo adicional servir para a proposta contra o caixa 2 chegar ao Congresso sem margens para artimanhas parlamentares, terá valido a pena. Quanto à reforma da Previdência, ficaram de fora os militares, mas o governo já deu a garantia de que eles serão alvo de uma proposta independente, enviada ao Congresso em até 30 dias, e que os colocará em patamares semelhantes ao de outras categorias contempladas na PEC, como policiais civis.
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Os dois projetos, no entanto, por mais importantes que sejam, não compreendem a totalidade do trabalho que precisa ser feito. Reforma tributária, desburocratização, abertura comercial, privatizações, novas medidas contra a corrupção e o crime organizado, investimentos no sistema prisional, uso de inteligência e bancos de dados contra a criminalidade, combate mais firme ao tráfico de drogas são itens que estiveram nos discursos de posse dos ministros Guedes e Moro e também precisam se transformar em realidade.
O que o país espera, agora, do governo é empenho em aprovar a reforma da Previdência e o pacote anticrime de Sergio Moro. Os dois temas precisam assumir o protagonismo nas palavras e nas ações de Bolsonaro, e também é responsabilidade dele criar o clima para que ele possa se dedicar a eles – colocando freios, por exemplo, nos impulsos dos filhos. Ao Congresso, que votará os dois projetos, a nação pede responsabilidade, em vez de corporativismo, negociatas e oposição destrutiva. Divergências em relação aos textos precisam ser tratadas com honestidade, e não como meio de barganhar favores em troca de apoio, como se fazia na “velha política” que o brasileiro quis sepultar em outubro.
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