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Editorial

O impacto global do coronavírus

coronavírus
Membro de equipe médica chinesa verifica a temperatura corporal de uma paciente que apresentou sintomas leves do coronavírus (Covid-19). (Foto: Divulgação/China/AFP)

Por mais que a Organização Mundial de Saúde (OMS) ainda não tenha classificado o avanço mundial do coronavírus como uma pandemia, limitando-se a elevar para “muito alto” o risco de impacto da nova doença, chamada Covid-19, não será absurdo se os órgãos internacionais revisarem essa avaliação mais adiante. Afinal, a própria OMS já alertou que o vírus está se propagando rapidamente e em breve todos os países do mundo devem apresentar casos da doença, quando não surtos – o conceito de “pandemia” descreve uma situação em que toda a população do planeta esteja exposta ao vírus, mas o diretor-geral da OMS afirmou ainda haver chance de conter o avanço do coronavírus.

Até o momento, embora 94% de todos os casos registrados no mundo estejam concentrados na China, há confirmações de pessoas doentes em todos os continentes (à exceção da Antártida) e mortes na Europa e no Oriente Médio. O impacto da doença sobre a população mundial continua a ser avaliado, levando-se em conta as características do vírus – se por um lado sua letalidade tem sido mais baixa que a de outras doenças que causaram preocupação recentemente, ele é altamente contagioso e se beneficia do fato de a população mundial ter uma mobilidade muito maior que até poucas décadas atrás, o que facilita a propagação do Covid-19. Mas, ainda que as previsões otimistas da OMS se concretizem e seja possível frear a expansão do coronavírus, o estrago na economia já está feito.

Mesmo antes de os surtos se espalharem pelo mundo, já havia apelos por estímulo econômico devido ao desempenho global abaixo do esperado

Diversas multinacionais cuja cadeia de produção passa pela China e por outros países asiáticos, como o Japão e a Coreia do Sul, já foram afetadas e tiveram de desacelerar suas atividades, com fechamento de fábricas. Os setores de transporte – especialmente aéreo –, turismo e eventos também estão sendo duramente atingidos. Empresas suspenderam voos para a China assim que o surto começou naquele país, parques temáticos foram fechados, grandes feiras comerciais foram canceladas na Ásia e na Europa, e competições esportivas ocorrem com portões fechados ou nem mesmo são realizadas. Um membro do Comitê Olímpico Internacional afirmou que, embora as preparações para os Jogos Olímpicos de Tóquio, no fim de julho, estejam correndo normalmente, não se pode descartar completamente um cancelamento, dependendo do ritmo da propagação do coronavírus nos próximos três meses.

O Fundo Monetário Internacional já reduziu a previsão de crescimento do PIB chinês neste ano, e aponta também para uma desaceleração global. Até agora, essa revisão consiste em décimos de ponto porcentual, mas se a curva de contágio não se reverter logo os efeitos serão mais intensos – a Sars, em 2003, tirou dois pontos porcentuais do crescimento chinês daquele ano. No Brasil, o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, já fez afirmação semelhante, e os efeitos no mercado financeiro se intensificaram logo após a confirmação do primeiro caso no país – um paciente que esteve na Itália –, com queda abrupta na bolsa de valores de São Paulo e novos solavancos no câmbio, que já vinha sendo afetado por outros fatores, como a redução na taxa de juros.

A prioridade, sem dúvida, é conter a espiral de transmissão da doença para evitar uma escalada nas contaminações e mortes. Quando o pior momento do Covid-19 tiver passado, o mundo terá uma noção melhor do estrago econômico deixado pelo coronavírus e do que será preciso fazer para recuperar a produção industrial, o fluxo de comércio e os demais setores prejudicados pela epidemia. Mesmo antes de os surtos se espalharem pelo mundo, já havia apelos por estímulo econômico devido ao desempenho global abaixo do esperado, mas, com muitos países praticando juros baixíssimos, pode haver pouca margem para ações mais enérgicas. No Brasil, o Copom já havia indicado que o ciclo de queda da Selic estava no fim, mas a última reunião ocorreu antes de a doença se espalhar internacionalmente. Como lembrou o colunista da Gazeta do Povo Guido Orgis, qualquer nova redução nos juros teria de ser cuidadosamente planejada para não disparar outros efeitos indesejáveis, e talvez a retomada mais forte do crescimento acabe ficando para 2021.

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